A década não podia fechar sem mais uma pérola de Bradford Cox e companhia, que continua a envolver-nos no seu novelo de sonoridades único.

O que dizer mais sobre os Deerhunter, que teimam em lançar álbuns inquietantes, densos, cheios de recantos luminosos? O que dizer de uma banda que consegue com sucesso mesclar influências tão distintas como música ambiente, punk, lo-fi, garage rock, noise e música pop? As palavras tornam-se, de facto, escassas.

E assim como assim, são já oito os álbuns lançados pela banda de Atlanta, todos com a sua especificidade, o seu encanto próprio. Halcyon Digest (2010) foi e continuará a ser o ponto mais alto, mas os restantes orbitam à sua volta como planetas de um qualquer sistema solar distante. Tendo isto em mente, este será mais uma pérola a incorporar uma obra riquíssima, patente de estar na montra do que melhor se fez na década em que vivemos, aqui no terceiro calhau a contar do sol.

Bradford pinta um cenário triste do ponto civilizacional em que nos encontramos. Não estamos a tratar bem a natureza, não estamos a tratar bem as pessoas que por aqui habitam. Os sinais de decadência estão à nossa frente e ainda assim há quem teime em não querer olhar, não querer ver. Enquanto em “Element” aborda-se o primeiro tema, a questão da vida dos Homo Sapiens é mais escarafunchada. Logo na faixa que abre o disco, “Death in Midsummer” há esta passagem que não precisa de esclarecimentos adicionais:

They were in hills
They were in factories
They are in graves now
They were in debt to themselves
And what? Is it paid off now?

Mais à frente, em “What Happens to People?”, o desaparecimento gradual dos sentimentos humanos é o tema que vem à baila:

What happens to people?
They quit holding on
What happens to people?
Their dreams turn to dark

Será puro pessimismo ou apenas uma forma de ver a realidade mais depressiva, mais focada no que está mal? No fundo, não deve ser fácil viver num país como os EUA neste momento e conseguir ter esperança num futuro melhor. O discurso violento e as suas consequências também são retratadas em “No One’s Sleeping”, música que evoca a morte de Jo Cox, membro do Parlamento Britânico, alvo de um ataque brutal em 2016. Em “Futurism” a frase chave é “Your cage is what you make it”.

Como todos os discos dos Deerhunter, não se espere que este conquiste à primeira audição. O mais provável é mesmo que seja visto como nada de novo e se passe ao próximo disco de um outro qualquer artista. Só podemos pedir que seja dado mais tempo e sobretudo atenção – a mesma será, garantidamente recompensada.