sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

Sonic Youth – Rather Ripped (2006)


 

Rather Ripped é um disco quase sempre esquecido. Dificilmente constará na lista dos melhores álbuns da banda. Esta indesmentível verdade esconde, por outro lado, uma outra certeza: a injustiça de ser olhado de forma algo sobranceira. Não iremos nesse sentido. Celebremos o resumo bem comportado dos Sonic Youth em Rather Ripped!

Se pensarmos apenas nos discos da banda norte americana lançados na primeira década do século XXI, então é certo e sabido que Rather Ripped só será mencionado depois de se pensar em Sonic Nurse (2004) ou Murray Street (2002). Talvez seja justo, talvez se entenda, estamos seguros de que ninguém dirá radicalmente o contrário do que afirmamos. No entanto, a voragem dos tempos em que vivemos é muitas vezes inimiga da apreciação ponderada e do olhar crítico distanciado. Talvez seja isso. Talvez sejam estas as causas do desmerecimento a que foi sempre votado Rather Ripped. Isso, ou algo até um pouco mais profundo: o álbum, num certo sentido, apresenta-se como uma síntese bem comportada de trabalhos anteriores, embora mais polido, com um som mais limpo, com uma melhor produção. Os instrumentos aparecem mais nítidos, mais soltos, cristalinos. Como sabemos, os fãs da banda sempre preferiram uma garagem escura e suja a uma sala de estar por onde passou uma mulher a dias eficiente.

Convém perceber que o disco em apreço tem, entre outras, belíssimas canções. “Incinerate” é, eventualmente, o caso mais notório. Aquelas guitarras iniciais são divinas. O ritmo também. O pecado talvez seja a excessiva clareza, a excessiva limpeza do tema. Por outro lado, a vertente mais distorcida e apocalíptica (se assim podemos afirmar), também por lá se encontra. Ouça-se “Sleepin´Around”, por exemplo, e o bom ruído de outros discos é bem audível nessa faixa. De “What a Waste” ou de “Rats” diremos exatamente o mesmo. Ou ainda, mais até do que todas as outras, a faixa “Helen Lundeberg”, que fecha com estilo rebelde o álbum mais delicado de Kim Gordon, Thurston Moore e companhia.

Outro aspeto eventualmente a ter em conta é o facto de Rather Ripped ser um disco de fecho de ciclo. Foi o álbum que colocou um ponto final de uma longa relação com a  Geffen Records, e isso talvez tenha pesado. Um adeus simpático, sem o peso experimental de alguns outros publicados nessa editora. Importa ainda referir que no disco de 2006, a figura de Jim O’Rourke não está presente, o que terá influenciado a busca de canções mais centradas, mais tradicionais, mesmo tratando-se de canções com a chancela Sonic Youth. Com O’Rourke, os temas eram tendencialmente menos acessíveis, mais esticados no tempo e mais complexos na forma. Sem ele na banda, alguma normalidade ganhou espaço e substância. Tanto quanto possível, com Rather Ripped os Sonic Youth piscaram o olho a um certo universo pop, mesmo que em modo alternativo. E assim, todos os predicados do disco acabaram por resvalar, sobretudo no entendimento dos seguidores mais fieis ao espírito noise da banda, para a esfera de pecados. Uma espécie de disco amaldiçoado pelo açúcar melódico e rítmico de alguns dos seus temas. E porque já aqui se falou de vários, uma última nota para o notável “The Neutral”, brilhante em todos os seus minutos e segundos. Uma pérola que sintetiza o universo Sonic Youth.

Resgatar Rather Ripped ao esquecimento a que foi exposto é um imperativo de consciência. É o que tentámos fazer nestas breves linhas deste Especial. O Altamont continua o seu caminho de serviço público, firme na convicção de que toda a surdez deverá ser castigada. Ouça Rather Ripped. Ouça-o bem. Talvez venha depois a partilhar connosco tudo aquilo que aqui deixámos registado.

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