segunda-feira, 22 de dezembro de 2025

Divididos (2025) – El regreso que necesitábamos, incluso antes de saberlo

 

Quinze anos de silêncio é um oceano para qualquer banda. Ainda mais para Divididos , um trio cuja marca no rock argentino é uma combinação quase irrepetível de potência, virtuosismo e sensibilidade. Desde Amapola del '66 (2010), os fãs aguardavam um novo capítulo na história do chamado "Trator do Rock", um grupo que nunca precisou de artifícios elaborados para soar ao mesmo tempo devastador e profundamente musical. Em 2025, essa espera finalmente chegou ao fim. E o resultado vale cada dia.

O novo álbum, intitulado simplesmente Divididos , não é apenas um retorno: é uma declaração de identidade, um exercício de maturidade artística e uma exploração emocional que surpreende até mesmo aqueles que já conhecem a capacidade criativa do trio formado por Ricardo Mollo, Diego Arnedo e Catriel Ciavarella. O que poderia ter sido um álbum complacente — um retorno ao som que os tornou famosos, um gesto para agradar os fãs — transforma-se, em vez disso, em uma obra ambiciosa, meticulosamente elaborada e profundamente expressiva.

Uma cicatriz como símbolo

A capa do álbum já indica o tom geral. Dois pedaços de tecido, um azul claro e outro branco, são unidos por uma costura visível que os mantém juntos apesar da ferida. É uma imagem simples, mas carregada de significado. Mollo explicou que representa um desejo: que essa ferida um dia cicatrize. Não é preciso muito para entender que a banda está falando tanto sobre o país quanto sobre a intimidade humana, sobre a história coletiva e também sobre a história pessoal.

Essa sutura, essa cicatriz, funciona como uma metáfora para o próprio álbum: uma obra que une materiais muito diversos — canções compostas entre 2019 e 2025, momentos de explosão rock e espaços de introspecção, texturas clássicas e novas explorações instrumentais — com a esperança de formar algo mais completo, mais luminoso.

Um álbum que respira o tempo.

A primeira coisa que se nota ao ouvir Divididos é que não foi criado às pressas. Muitas de suas músicas foram lançadas como singles nos últimos anos: Mundo Ganado em 2019, Insomnio e Cabalgata Deportiva em 2020, San Saltarín em 2023. Todas elas reaparecem aqui, mas recontextualizadas, revitalizadas pela presença do restante do repertório.

O fato de o álbum ter levado tanto tempo para ser desenvolvido é fundamental para entender sua diversidade. Algumas músicas parecem emergir da energia pré-pandemia, outras do confinamento e da introspecção, e outras ainda respiram uma certa luz renovada. O extraordinário é que, apesar dessa variedade temporal, o álbum soa coeso, como se cada peça estivesse esperando o momento certo para se integrar a um todo.

Identidade intacta, mas em movimento.

Divididos sempre foi uma banda difícil de categorizar. Ao longo de sua história, eles combinaram a energia bruta do rock com raízes folk, ritmos ancestrais, experimentação tímbrica e jogos de palavras poéticos que oscilam entre o metafórico e o humorístico. Neste álbum, sua identidade permanece, mas não se congela.

Em faixas como “Revienta en Mi mayor” e “Cabalgata deportiva”, a banda libera seu inconfundível pulso rock: guitarras que explodem como rajadas de vento, um baixo que sustenta e explora, e uma bateria precisa, poderosa e magnética. Ciavarella demonstra mais uma vez por que sua chegada revitalizou o som do Divididos: uma pegada firme, sensibilidade dinâmica e uma versatilidade notável.

No entanto, seria injusto pensar que o álbum é só força bruta. Há espaço para delicadeza, para reflexão, para um som que pausa e olha para dentro. "Insomnio", por exemplo, é uma joia onde a vulnerabilidade é acompanhada por uma instrumentação minimalista, porém profundamente emotiva. Em "El Faro", a banda brinca com uma atmosfera quase cinematográfica, criando uma paisagem sonora que mescla nostalgia, contemplação e esperança.

Contribuições que se encaixam perfeitamente

A participação de músicos convidados acrescenta cor sem comprometer a identidade do trio. Santiago Molina traz sua gaita de foles para "San Saltarín", conferindo-lhe um caráter festivo, lúdico e quase ritualístico. Enquanto isso, a contribuição das cordas, sob a regência de Nicolás Sorín, em "Grillo" introduz uma dimensão orquestral inesperada e elegante que se integra perfeitamente ao espírito do álbum, sem se tornar excessiva.

Esses detalhes demonstram algo importante: Divididos não soa como uma banda que está voltando a repetir fórmulas. Eles soam como um grupo que permanece inquieto, curioso e alerta.

Doze canções, uma jornada

O álbum é composto por 12 faixas que percorrem um amplo espectro emocional. Da introspecção de "Monte de olvidos" aos gestos mais épicos de "Aliosos en un viaje", o disco funciona como uma narrativa musical que convida o ouvinte a explorar diferentes estados de espírito.

Não há faixas de enchimento. Não há músicas "de compromisso". Cada uma tem seu lugar e propósito, algo que é especialmente apreciado em tempos em que muitos álbuns parecem feitos para o algoritmo e não para uma audição atenta.

Uma poética madura, mas não solene.

Ricardo Mollo mantém sua habilidade de dizer muito sem dizer demais. Suas letras continuam a explorar a fronteira onde a metáfora se mistura com o cotidiano, onde um pequeno gesto pode se tornar universal. Neste álbum, Mollo escreve a partir de uma introspecção madura: há mais contemplação, mais reflexão sobre feridas do passado, mas também mais luz.

A poética não perde seu humor ocasional — uma marca registrada da banda — nem aquela maneira de nomear o mundo com imagens que parecem nascer tanto da intuição quanto da habilidade.

O evento que acompanhou o lançamento: um sinal dos tempos

O álbum foi lançado com um evento especial que incluiu uma sessão de audição completa, um documentário sobre o processo criativo (Sounds, Clay and Skin) e uma conversa com o filósofo Darío Sztajnszrajber. Essa decisão — de combinar música, introspecção, reflexão e cinema — não é acidental: ela reflete o atual momento artístico e pessoal da banda.

Divididos parece estar dizendo que este álbum não é apenas uma coleção de canções, mas uma experiência, uma obra concebida a partir do corpo, da emoção e da reflexão.

Vale a pena ouvir? Sim. E mais de uma vez.

Divididos (2025) não é um álbum para se ouvir de imediato. Não foi concebido para causar impacto no primeiro minuto ou para se tornar um sucesso passageiro. É um álbum que cresce a cada audição, revelando novas camadas à medida que você se aprofunda nele. Essa qualidade o torna especial em um cenário musical dominado pela imediatidade e pela velocidade.

A banda alcançou algo que poucas bandas com décadas de história conseguem: criar um álbum que respeita seu legado sem se repetir, que soa contemporâneo sem obedecer a tendências e que transmite enorme honestidade artística.

É um álbum para quem ama música tocada com amor e precisão, para quem gosta de ouvir como um trio pode construir universos inteiros, para quem valoriza a poesia que se revela através de guitarras afiadas e melodias repletas de emoção.

Divididos é um álbum que merece recomendação sem reservas. Não apenas por sua qualidade musical, mas porque é um testemunho vivo do que significa criar com coerência, dedicação e respeito pelo próprio caminho. É um retorno que emociona, comove e confirma que Divididos continua sendo uma das bandas mais relevantes, criativas e queridas do rock argentino.

Se este álbum fosse uma cicatriz, seria uma que você carregaria com orgulho: uma marca do que você viveu, do que foi curado, do que te impulsiona para frente. Um convite para se juntar à banda em uma jornada que, mais uma vez, vale muito a pena.



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