VA - Beat It... Killertracks From The Roarin' 60's Vol. 1+2+3 [1991] (3 x CDs)
“Beat It… Killertracks From The Roarin' 60's” é um box fantástico lançado pela Underworld Records em 1992. Esta coletânea é uma mina de ouro para quem ama os sons vibrantes e ecléticos dos anos 1960. Abrangendo três CDs, cada um repleto de faixas que capturam a essência de uma era repleta de inovação musical e revolução cultural, esta coletânea é uma verdadeira joia.
Imagine ser transportado de volta à vibrante cena garage dos anos 60 a cada audição. As faixas são uma mistura deliciosa de batidas enérgicas, melodias comoventes e vibrações psicodélicas que encapsulam perfeitamente o espírito da época. Cada música é como uma miniaventura, oferecendo um vislumbre da paisagem musical diversificada que definiu a década.
A qualidade de produção deste box garante que cada faixa soe excelente, permitindo que você mergulhe totalmente na música. A seleção de faixas é criteriosa, apresentando uma ampla gama de estilos populares nos anos 60. Essa variedade mantém a experiência auditiva renovada e emocionante, com algo novo para descobrir a cada toque.
O que torna esta coletânea verdadeiramente especial é o seu apelo a novos ouvintes que talvez não tenham vivenciado os anos 60 em primeira mão. É uma mistura perfeita de sons familiares e preciosidades escondidas, tornando-se um item essencial na coleção de qualquer amante da música.
Em resumo, “Beat It… (Killertracks From The Roarin' 60's)” é um box maravilhoso que celebra a rica herança musical dos anos 1960. Sua diversificada lista de faixas, produção de alta qualidade e apelo nostálgico fazem dele um lançamento de destaque que certamente encantará tanto os fãs de longa data da época quanto os novatos. Não perca esta jornada musical por uma das décadas mais icônicas da história da música.
No início dos anos 2000, o rock alternativo britânico passava por um processo de revitalização após a "ressaca" da onda britpop, que nos anos 1990 fora capitaneada por Oasis e Blur. Uma nova geração de bandas britânicas, como Coldplay, Travis e Snow Patrol, começava a despontar, trazendo um novo sopro de vida ao britpop — ou ao que restou dele.
Foi por meio dessa geração que o Keane ganhou visibilidade, ainda como um trio. No entanto, a banda oferecia algo ligeiramente diferente: um som melódico e introspectivo, que se destacava pela ausência de guitarras elétricas, sendo guiado principalmente pelo piano e pelos sintetizadores. Esse diferencial foi fundamental para a identidade do Keane e para a receptividade positiva junto ao público e à crítica.
A história do Keane começou em 1995, quando os amigos de infância Tim Rice-Oxley (piano, teclados, baixo e vocais de apoio), Dominic Scott (guitarra) e Richard Hughes (bateria e vocais de apoio) formaram a banda The Lotus Eaters, em Battle, no East Sussex, na Inglaterra. As primeiras referências musicais do grupo incluíam Beatles, U2 e Oasis. Logo, já estavam se apresentando no circuito de pubs de Battle.
Em 1997, Tim Rice-Oxley reencontrou um velho amigo de infância, Tom Chaplin, e o convidou para ser o vocalista da banda. Tom não apenas aceitou o convite para o posto de vocalista, como também passou a tocar violão. Com a entrada de Tom, a banda mudou de nome: de The Lotus Eaters para Keane. O grupo estreou seu primeiro show como Keane em julho de 1998, no pub Hop & Anchor, em Londres. Durante um ano, a banda se apresentou em vários pubs londrinos.
Por meio do selo independente Zoomorphic, o Keane lançou, em 1999, seu primeiro single, que trouxe a canção “Call Me What You Like” e vendeu apenas 500 cópias. O segundo single foi lançado em junho de 2001, com “Wolf At The Door”, que não ultrapassou 50 cópias vendidas.
Enquanto isso, as divergências criativas entre Tim Rice-Oxley e Dominic Scott se acentuaram e culminaram na saída de Scott do Keane, em julho de 2001. Apesar dos desentendimentos, sua partida ocorreu de forma amigável.
No ano seguinte, em 2002, o Keane assinou contrato com a gravadora BMG. Contudo, aquele ano se revelou bastante confuso e turbulento para a banda. Desde a saída de Dominic Scott, o Keane permaneceu sem guitarrista, algo que acabou se tornando uma característica distintiva do grupo.
Por meio do selo independente Fierce Panda Records, o Keane lançou, em maio de 2003, o single “Everybody’s Changing” em sua primeira versão. O relacionamento do Keane com a BMG parecia não avançar, levando a banda a romper contrato com a gravadora e assinar com a Island Records.
Keane no começo da carreira: Richard Hughes, Dominic Scott, Tom Chaplin e Tim Rice-Oxley.
Com uma nova gravadora, o Keane iniciou, em setembro de 2003, as gravações de Hopes and Fears, seu primeiro álbum de estúdio, concluindo o trabalho no final daquele ano. O processo de gravação ocorreu no Helioscentric Studios, localizado na pequena cidade de Rye, no sul da Inglaterra. O álbum foi produzido por Andy Green, James Sanger e pela própria banda.
Boa parte das canções de Hopes and Fears já era tocada pelo Keane em seus shows, algumas, inclusive, ainda da época em que Dominic Scott fazia parte da banda, como "She Has No Time", "Bedshaped" e "This Is The Last Time". Lançada inicialmente como single por um selo independente, “Everybody’s Changing” foi regravada para o álbum Hopes and Fears. Por outro lado, algumas canções foram compostas às vésperas da gravação do álbum, como "On A Day Like Today" e "We Might As Well Be Strangers".
Em fevereiro de 2004, chegou às lojas o primeiro single do álbum Hopes and Fears, a canção "Somewhere Only We Know", que alcançou o 3º lugar na parada de singles do Reino Unido, enquanto, nos Estados Unidos, atingiu a 50ª posição no Billboard Hot 100. No Reino Unido, o single vendeu mais de 1,8 milhão de cópias, enquanto, nos Estados Unidos, ultrapassou a marca de 2 milhões de cópias vendidas.
"Somewhere Only We Know" estava em alta nas paradas quando, no início de maio, o Keane lançou mais um single, “Everybody’s Changing”. Contudo, não se tratava da mesma gravação previamente lançada pelo selo independente Fierce Panda Records. A canção foi regravada com os mesmos arranjos da versão original, mas desta vez, recebeu melhorias significativas.
Finalmente, em 10 de maio de 2004, o Keane lançou, por meio da Island Records, o tão aguardado Hopes and Fears, seu primeiro álbum de estúdio. O título do álbum foi inspirado em um verso da canção “Snowed Under”, lado B do single "Somewhere Only We Know", que, no entanto, não foi incluída no disco. O verso diz: “You've been looking everywhere / For someone to understand your hopes and fears”(“Você tem procurado por toda parte / Alguém que compreenda suas esperanças e medos”).
Capa do single de "Somewhere Only We Know", lançado em fevereiro de 2004.
Musicalmente, Hopes and Fears é caracterizado por uma fusão de rock alternativo, pós-britpop e pop rock, com o piano de Tim Rice-Oxley assumindo papel de destaque, conferindo à obra uma sonoridade única e introspectiva. As letras exploram temas de esperança e vulnerabilidade, ressoando com um público amplo e consolidando a identidade da banda na cena musical contemporânea.
Os vocais emotivos de Tom Chaplin transmitem, ao mesmo tempo, fragilidade e força, mesclando suavidade e potência vocal de maneira impecável. Sua interpretação etérea eleva as melodias nostálgicas de Hopes and Fears, criando uma atmosfera reflexiva que se entrelaça perfeitamente com a rica instrumentação do álbum.
Uma característica marcante de Hopes and Fears, que se tornou um traço distintivo do Keane nessa fase, é o fato de ser um álbum de rock sem guitarras elétricas. Desde a saída de Dominic Scott, a banda aprendeu a explorar a ausência da guitarra em sua música. Essa escolha criativa confere à sonoridade do álbum um caráter intimista e introspectivo, permitindo que o piano e os sintetizadores ocupem o protagonismo, criando um ambiente sonoro singular.
O álbum abre com a sensacional "Somewhere Only We Know", o primeiro e maior sucesso da carreira do Keane. Com tons melódicos e um forte apelo radiofônico, a faixa destaca a tradição do piano no rock. Tim Rice-Oxley estabelece uma base emotiva e grandiosa ao piano, enquanto a bateria de Richard Hughes mantém um ritmo sólido e constante. A voz de Tom Chaplin brilha com emoção, interpretando versos sobre um lugar especial e nostálgico para o eu lírico da canção.
"Bend and Break" aborda temas de superação pessoal, resiliência diante das adversidades e a esperança de um recomeço após momentos de crise. A canção apresenta uma sonoridade de pop rock, com uma bateria dinâmica e o piano criando camadas melódicas que enriquecem a composição. A performance vocal é intensa e repleta de vigor, transmitindo a energia da mensagem.
Em "We Might as Well Be Strangers", o Keane explora o tema do distanciamento entre pessoas que, apesar de terem compartilhado momentos de intimidade no passado, agora se veem como estranhas. Trata-se de uma balada lenta, melancólica e minimalista, que evoca no ouvinte uma sensação profunda de solidão e afastamento.
Tom Chaplin, Tim Rice-Oxley e o produtor Andy Green no estúdio na época das gravações do álbum Hopes and Fears.
Depois de "Somewhere Only We Know", "Everybody’s Changing" é a faixa mais significativa de Hopes and Fears. Com uma sonoridade que mescla pop rock alternativo e nuances de soft rock, "Everybody’s Changing" destaca-se por sua base instrumental atmosférica, onde o piano e os sintetizadores criam texturas envolventes, enquanto a bateria imprime um ritmo marcante. A letra aborda a perspectiva de alguém que tenta encontrar um propósito em meio a uma sensação de estagnação, enquanto observa a vida dos amigos progredindo. As dificuldades enfrentadas pela banda no início da carreira teriam servido de inspiração para compor a letra de "Everybody’s Changing".
"Your Eyes Open" é um pop rock melódico, onde o piano ocupa posição de destaque, acompanhado por sintetizadores que ajudam a criar uma atmosfera introspectiva e levemente otimista. Na canção, o eu lírico percebe o distanciamento da pessoa amada: "E você não quer mais saber de mim / Faz um bom tempo desde que o seu coração endureceu".
A faixa seguinte, "She Has No Time", é uma balada calma, romântica e minimalista. O tom da canção é profundamente emotivo e melancólico. A letra explora a rejeição e a dor de um amor não correspondido, enfatizando a frustração emocional com sensibilidade.
"Can’t Stop Now" reflete os conflitos internos de alguém que luta entre atender às expectativas alheias e priorizar a própria saúde emocional, destacando a necessidade de seguir em frente para sobreviver emocionalmente. A faixa é um pop rock agradável, com um piano dinâmico, bateria vibrante e vocais expressivos que impulsionam a música. Os sintetizadores criam uma ambientação etérea, enquanto o piano permanece como base sólida.
"This Is The Last Time" aborda o rompimento de um ciclo emocional desgastante, explorando desilusões, despedidas e o fim de uma relação marcada por mentiras e desculpas repetitivas.
“On A Day Like Today" é uma balada que começa com batidas eletrônicas suaves e vocais delicados, quase sussurrados. Com o avanço da música, a canção ganha mais robustez com a entrada dos demais instrumentos. A letra aborda a frustração e o arrependimento de alguém que não conseguiu expressar seus sentimentos à pessoa amada.
O Keane explora uma levada rítmica interessante em "Untitled 1", proporcionada pela bateria. Já os teclados criam efeitos e um clima musical etéreo, servindo como pano de fundo para Tom Chaplin cantar sobre perda, desilusão e distância emocional. A canção evoca imagens de separação, frieza interior e a esperança de um reencontro.
Hopes and Fears termina em grande estilo com a balada "Bedshaped". O piano melódico e poderoso é um elemento marcante na canção, acompanhando vocais carregados de emoção que expressam versos sobre nostalgia, perda e reconexão. A música transmite vulnerabilidade diante de mudanças e esperança em reatar laços quebrados. O final cresce com camadas instrumentais grandiosas, encerrando o álbum de forma memorável.
Keane em 2004: Tim Rice-Oxlwy, Richard Hughes e Tom Chaplin.
Impulsionado pelo sucesso de faixas como "Somewhere Only We Know", "Everybody's Changing" e "Bedshaped", Hopes and Fears alcançou o 1º lugar na parada de álbuns do Reino Unido, onde vendeu 2,8 milhões de cópias. O álbum foi o segundo mais vendido no Reino Unido em 2004, ficando atrás apenas do disco de estreia, autointitulado, do Scissor Sisters.
Enquanto isso, na Bélgica e na França, o álbum de estreia do Keane alcançou o 5º lugar nas paradas. Em toda a Europa, Hopes and Fears vendeu mais de 4 milhões de cópias. Nos Estados Unidos, a posição de Hopes and Fears na parada Billboard 200 foi um modesto 45º lugar, mas as vendas foram positivas: cerca de 1 milhão de cópias. Estima-se que, em todo o mundo, Hopes and Fears tenha vendido mais de 6 milhões de cópias.
Os singles "Somewhere Only We Know" e "Everybody's Changing" também tiveram um ótimo desempenho. Na parada de singles do Reino Unido, "Somewhere Only We Know" alcançou o 3º lugar e ultrapassou a marca de 1,8 milhão de cópias vendidas. Nos Estados Unidos, o single de "Somewhere Only We Know" vendeu mais de 2 milhões de cópias.
Na parada de singles do Reino Unido, "Everybody's Changing" alcançou a 4ª posição, com mais de 600 mil cópias vendidas. Já nas paradas de singles da Itália e da Bélgica, a faixa teve um desempenho ainda melhor, chegando ao 2º lugar.
O ótimo desempenho comercial e a receptividade positiva por parte do público e da crítica levaram Hopes and Fears a conquistar prêmios no Brit Awards de 2005, incluindo o de “Melhor Álbum Britânico”. Além disso, o Keane foi reconhecido na mesma premiação como “Artista Revelação”.
Em 2013, "Somewhere Only We Know" foi regravada por Lily Allen para um anúncio de Natal da loja de departamentos britânica John Lewis & Partners. A versão de Allen alcançou o 1º lugar na parada de singles do Reino Unido.
Marcado por canções sinceras, guiadas pelo som melódico do piano e desprovidas de guitarra elétrica, Hopes and Fears capturou a essência do desejo e da introspecção, tornando-se identificável para muitos ouvintes. Por meio dele, o som do Keane abriu caminho para muitas bandas indie que surgiram posteriormente. Sua combinação de elementos de rock e pop inspirou uma geração de músicos a explorar estilos semelhantes. Hopes and Fears deixou uma marca duradoura no mundo da música, e seu legado ainda é sentido hoje. Seja você um fã de longa data ou alguém que está apenas descobrindo o Keane, este álbum é indispensável!
Faixas
Todas as faixas por Tim Rice-Oxley, Tom Chaplin e Richard Hughes, exceto as indicadas.
"Somewhere Only We Know"
"Bend and Break"
"We Might As Well Be Strangers"
"Everybody's Changing"
"Your Eyes Open"
"She Has No Time" (Rice-Oxley, Chaplin, Hughes, James Sanger)
"Can't Stop Now"
"Sunshine" (Rice-Oxley, Chaplin, Hughes, Sanger)
"This Is the Last Time" (Rice-Oxley, Chaplin, Hughes, Sanger)
"On a Day Like Today"
"Untitled 1"
"Bedshaped" (Rice-Oxley, Chaplin, Hughes, Sanger)
Keane:
Tom Chaplin (vocal principal)
Tim Rice-Oxley (piano, teclado, baixo, backing vocals, co-vocais principais em "Sunshine")
"No final dos anos 60 não era socialmente conveniente andar por aí com o cabelo comprido até o cóccix."
Doug Ingle,
vocalista e tecladista
Ao começar a ouvir o disco, você até reconhecerá inevitavelemente algumas qualidades, logo de cara. Reconhecerá por certo toques profundos de psicodelismo, um rastro de folk, sombras de blues e os caminhos para o metal. Poderá até pegar-se tamborilando com os dedos na mesa enquanto ouve a boa "Most Anything You Want", batendo com o pézinho ao som de "Are You Happy?" com seu psicodélico prenúncio de peso, e até ensaiar um air guitar na embalada "Termination"; mas a faixa-título, um épico monumental quilométrico que, sobremaneira, impressiona e justifica um lugar de destaque para "In-A-Gadda-Da-Vidda" , do Iron Butterfly, no olimpo dos grandes. Ao longo de seus dezessete minutos a música "In-A-Gadda-Da-Vida", que no formato original em LP era a única faixa do lado B, desfila uma infinidade de variações, ritmos, influências e sonoridades. Uma loucura psicodélica total com guitarras pesadas, uma percussão viajante, órgãos completamente alucinados e um vocal rouco-grave-chapado. Detonante! Cáustico! Espetacular! Um dos primeiros pilares do hard rock e do metal! Outro daqueles discos em que um erro, equívoco, um mal-entendido acabou gerando e consagrando o nome da obra: consta que o compositor, cantor e tecladista Doug Ingle anunciou ao baterista ter feito uma nova música, mas bêbado demais para falar corretamente o nome pretendido que seria "In The Garden of Eden", pronunciou "In-A-Gadda-Da-Vida" que foi o que o parceiro entendeu e anotou, só que sem saber escreveu 'errado' também na história do rock.
******************* Embora o grande barato de um disco desses seja tê-lo em LP por causa desta configuração com uma música apenas perfazendo um lado inteiro, não deixa de ser interessante ter a edição remasterizada em CD que traz três versões do clássico "In-A-Gadda-Da-Vida", a original, uma ao vivo e a do single, bem menor, editada especialmente para tocar nas rádios. ***********************
FAIXAS:
Lado A "Most Anything You Want" – 3:44 "Flowers and Beads" - 3:09 "My Mirage" – 4:55 "Termination" (Erik Brann, Lee Dorman) – 2:53 "Are You Happy" – 4:31
“O Edgard senta na mesa e diz assim: ‘Olha, não é nada disso, não tem nada dessa história de rebeldia juvenil. Realmente é um preconceito contra a invasão de nordestinos, era o que eu estava pensando na época e foi isso o que eu quis dizer mesmo, eu não agüentava essa coisa de música baiana, de Caetano, de Gil'. Na hora, esse foi mais um dos insights que eu tive. Puta que o pariu, defendi durante anos essa letra, carreguei essa cruz. Agora, naquele dia, eu saí de lá falando assim ‘eu nunca mais canto essa música.’ ”
Nasi, à Revista Trip em 2008
sobre a música “Pobre Paulista”
Um dos melhores discos do rock nacional.
Mais um daquela safra brilhante da metade da década de 80 que inclui o "Dois" do Legião, o "Cabeça Dinossauro" dos Titãs, o "Selvagem?" dos Paralamas, o Capital Inicial com seu disco de mesmo nome, entre outros bons que apareceram por ali.
“Vivendo e não Aprendendo” do Ira! era a afirmação de uma banda que havia aparecido bem no seu primeiro trabalho, “Mudança de Comportamento” de 1985, mas que então ganhava o respeito definitivo de público e crítica. Mais do que isso, era a afirmação Edgar Scandurra como o melhor guitarrista brasileiro dos últimos tempos e com certeza o melhor daquela geração. Músico capaz de riffs agressivos como o da espetacular “Dias de Luta”, melodias ternas como a da melancólica “Quinze Anos”, ou referenciais como em “Envelheço na Cidade”.
Nas composições de Scandurra pela voz de Marcos Valadão, conhecido como Nasi, o Ira! proporcionava com “Vivendo e não Aprendendo”, retratos urbanos recheados de imagens, sentimento coletivo e realidade cotidiana. A confusão da cidade, a violência, as multidões, as paixões e os desencontros na ótima "Vitrine Viva" com sua linha de baixo forte e matadora; a alienação, o dinheiro, a indignação na punkzinha “Nas Ruas”; o preconceito pueril de Edgar Scandurra em “Pobre Paulista (“não quero ver mais essa gente feia / não quero ver mais os ignorantes / só quero ver gente da minha terra / eu quero ver gente do meu sangue”); e o grito coletivo de desemprego, fome poluição de “Gritos na Multidão” são exemplos perfeitos desse desenho musical social proposto pelo Ira!.
No entanto, o grande sucesso do disco, muito devido ao fato de fazer parte da trilha de uma novela, foi “Flores em Você”, canção de letra curta, que nas mãos do produtor Liminha ganhou um belíssimo arranjo de cordas que lhe conferiram toda uma grandiosidade e graça.
O Ira! nunca mais conseguiu produzir um álbum como este. Fez uma coisa boa aqui, outra ali, os integrantes principais, Nasi e Edgar envolveram-se em projetos paralelos interessantes mas o grupo nunca mais foi o mesmo. A obra excessivamente diversificada, atirando em todas as direções, fez com que nunca tivessem conseguido manter uma unidade de estilo ou de intenção e não conquistassem um grande público de fãs como foram os casos de Legião, Titãs, Capital. Talvez se tivessem se fixado um pouco mais em determinada linha, ou principalmente, se tivessem feito coisas próximas a este “Vivendo e Não Aprendendo”, tivessem se consolidado posteriormente e tivessem mantido o interesse do público por seu trabalho. Mas isso não é tudo e o Ira!, por mais que tenha sumido da grande mídia, sempre teve seu público fiel. O que importa é que certamente tratou-se de uma das grandes bandas do cenário nacional e que foi fundamental no alavancamento do rock brasileiro naquela metade de anos 80. Se teve seus erros, teve, mas teve seus acertos também, e que foram muitos.
Enfim... a vida é assim, é vivendo e aprendendo.
*****************************************
FAIXAS:
01.Envelheço Na Cidade 3:17 02. Casa De Papel 3:36 03. Dias De Luta 4:26 04. Tanto Quanto Eu 2:50 05. Vitrine Viva 2:20 06. Flores Em Você 1:54 07. Quinze Anos (Vivendo E Não Aprendendo) 2:40 08. Nas Ruas 4:17 09. Gritos Na Multidão 3:08 10. Pobre Paulista 4:57
com o disco “The Idiot” de Iggy Pop ainda rodando no toca-discos.
Depois de ter produzido o último álbum dos pré-punk, The Stooges, David Bowie já renomaado e prestigiado adotava o vocalista da banda, Iggy Pop, como pupilo e produzia seu álbum solo de estréia. Neste disco, “The Idiot”, de 1977, o Camaleão limpava o som ruidoso e retumbante dos Stooges, conferindo toda uma sofisticação e classe, acrescentava alguns toques tecnológicos e eletrônicos, dosando os elementos, sem contudo violentar a característica agressiva e selvagem do cantor. Provas disso são “China Girl”, que viria a ser gravada por Bowie anos depois em um álbum próprio, exemplo claro de punk moderado, com todos os elementos ali, ritmo, força, distorção, voz rasgada, porém amenizados por um tema romântico e por um teclado agudo tipicamente oriental; ou “Funtime” cuja agressividade sonora fica contida pelos ecos e efeitos dando lhe inclusive um certo ar futurista.
“Sister Midnight”, a faixa que abre o disco e uma das grandes músicas dele, é notável com sua estrutura totalmente quebrada e pela versatilidade dos vocais de Iggy dentro da mesma canção; “Dum Dum Boys” mesmo na voz de Iggy é aquele tipo de balada tipicamente bowieana; o charmosíssimo pop de cabaré “Nightclubbing”, que mais tarde veio a ter uma versão igualmente admirável de Grace Jones, tem Iggy numa interpretação notável simulando uma certa embriaguez na voz; e o disco fecha com a lenta, minimalista e arrastada “Mass Production”, e seu apito de navio anunciando o fim do disco.
Um dos mais importantes e primeiros representantes da chamada fase berlinense de David Bowie que ainda traria seus excelentes "Low", “Lodger” e Heroes”, além de outra espetacular parceria com Iggy Pop, produzindo seu ótimo “Lust for Life”,
"Trabalhar com David Bowie é um prazer, mas uma tortura também. Ele é um músico incrível e um grande produtor, tem ideias excelentes, mas os álbuns acabam soando 50% Bowie e 50% Iggy. Eu queria um disco apenas com ideias minhas."
Iggy Pop
"Esta canção tem a melhor letra que já ouvi."
Butt-Head, da série Beavis & Butt-Head, sobre “Butt Town”
O camaleão é um réptil capaz de fazer com que sua pele mude de aspecto. Não à toa, este era o apelido de David Bowie pela incrível capacidade que este teve de se transformar com total desenvoltura em diversos personagens, como Ziggy Stardust, Major Tom e Alladin Sane. Porém, outra espécie também é mestre em camuflagem e disfarces: a iguana. Muito próximo de Bowie desde os anos 70, Iggy Pop merece, com certeza, esta alcunha. Não somente pela derivação nominal, afinal, quem surfou pela garage band, pelo punk, hard rock, industrial, pós-punk, new wave, heavy metal e por aí vai, só pode mesmo ser considerado um ser de várias aparências. O eterno líder da Stooges e dono de uma obra que perpassa tudo o que foi produzido no rock desde os anos 60 tem estofo para isso. Em 1990, após pouco mais de 20 anos de carreira, o junkie provocativo tornava-se um homem maduro (humm... talvez, nem tanto) e realiza o disco que melhor resume a sua extensa e variante trajetória: “Brick by Brick”, que completa 30 anos de lançamento em 2020.
No entanto, dúvidas quanto ao talento de Iggy Pop pairavam àquela época. Ele vinha de um novo sucesso em anos após alguns de ostracismo com “Blah Blah Blah”, de 1986, coescrito e produzido por Bowie. Sua gravadora de então, A&M, queria repetir a fórmula, mas o que o rebelde Iggy fez, ao lado do “sex pistol” Steve Jones, foi, sim, um álbum que pode ser classificado como “Cold Metal”, o representativo título da faixa inicial de “Instintic”, de 1988. O preço por seguir os próprios instintos custou caro a Iggy, que foi dispensado do selo. Foi então que o veterano roqueiro olhou para si e percebeu que algo estava errado. No espelho, James Osterberg viu, na verdade, um artista prestes a completar duas décadas de carreira sem ter, de fato, uma obra inteiramente sua com respeito de crítica e público. Iggy deu-se conta que todos os seus êxitos até então haviam sido divididos com outros: na Stooges, com o restante do grupo; nos discos de Berlim dos anos 70 e em “Blah...”, com Bowie; em “Kill City”, de 1977, com James Williamson, fora outros exemplos. Por incrível que parecesse, o cara inventou o punk, que liderou uma das bandas mais revolucionárias do rock, que colaborou para o engendro da música pop dos anos 80 era ainda olhado de soslaio. Foi com este ímpeto, então, que, desejoso de virar uma importante página, ele assina com a Virgin para realizar um trabalho essencialmente seu.
Produzido pelo experiente Don Was (Bob Dylan, Rolling Stones, George Clinton e outros papas da música pop), “Brick...” é rock ‘n’ roll em sua melhor acepção: jovem, pulsante e melodioso. A começar, tem na sua sonoridade forte e impactante, a exemplo de grandes discos do rock como “Album” da PIL e os clássicos da Led Zeppelin, um de seus trunfos. Igualmente, parte da banda que acompanha o cantor é formada por Slash, na guitarra, de Duffy McKagan, no baixo, nada mais, nada menos do que a “cozinha” da então mais celebrada banda da época, a Guns n’ Roses, além de outros ótimos músicos como o baterista Kenny Aronoff, o guitarrista Waddy Wachtel e o tecladista Jamie Muhoberac. Isso, aliado ao apuro da mesa de som, potencializava a intensidade do que se ouvia. Garantida a parte técnica, vinha, então, o principal: a qualidade das criações. Nunca Iggy Pop compusera tão bem, nunca estivera tão afiado em suas melodias e no canto, capaz de variar da mais rascante vociferação ao elegante barítono.
Com o parceiro de várias jornadas Bowie: Iggy busca a emancipação artística
Se em discos anteriores Iggy às vezes se ressentia de coesão na obra, como os bons mas inconstantes “Party” (1981) e “New Values” (1979), em “Brick...” ele mantém o alto nível do início ao fim. E olha que se trata de um disco extenso! Mas Mr. Osterberg estava realmente em grande fase e imbuído de pretensões maiores, o que prova na canção de abertura: a clássica “Home”. Rock puro: riff simples e inteligente; refrão que gruda no ouvido; pegada de hard rock de acompanhar o ritmo batendo a cabeça; vocal matador; guitarras enérgicas; bateria pesada. Não poderia começar melhor. Já na virada da primeira faixa para a segunda, a grandiosa balada “Main Street Eyes” – das melhores não só do disco como do cancioneiro de Iggy –, percebe-se outra sacada da produção: interligadas – tal os álbuns de Stevie Wonder ou o mitológico “Sgt. Peppers”, dos Beatles –, as músicas se colam umas às outras, dando ainda mais inteireza à obra.
Assim é com I Won't Crap Out”, na sequência (noutra ótima performance dele e da banda), e aquele que é certamente o maior hit da carreira de Iggy Pop: “Candy”. Dividindo os vocais com Kate Pearson (B52’s), a música estourou à época com seu videoclipe (28ª posição na Billboard e quinta na parada de rock) e ajudou o disco a vender de 500 mil de cópias. Como classifica o jornalista Fábio Massari, trata-se de um “perfect pop”. Tudo no lugar: melodia envolvente, refrão perfeito, conjugação de voz masculina e feminina e construção harmônica irretocável. Um clássico do rock, reconhecível até por quem não sabe quem é Iggy Pop e que, ao chamar Kate para contrapor a voz, “deu a morta” para a R.E.M. um ano depois fazer o mesmo na divertida e de semelhante sucesso “Shiny Happy People”.
Unindo a experiência de um já dinossauro do rock com um poder de sintetizar suas melhores referências, Iggy revela joias, como as pesadas "Butt Town", com sua letra desbocada e crítica, e "Neon Forest", onde faz as vezes de Neil Young. Também, as melodiosas "Moonlight Lady" e a faixa-título, puxadas no violão e na sua bela voz grave, bem como a animada “Stary Night”. Don Was, que manja da coisa, intercala-as, dando à evolução do disco equilíbrio e garantindo que o ouvinte experimente todas as sensações: da intensidade à leveza, da agressividade à doçura. Por falar em intensidade, o que dizer, então, do heavy “Pussy Power”, em que, resgatando o peso do seu disco imediatamente anterior, faz uma provocativa ovação ao “poder da buceta”. Iggy Pop sendo Iggy Pop.
Mas não é apenas isso que Iggy tinha para rechaçar de vez a desconfiança dos críticos. O Iguana revela outras facetas, sempre pautado no melhor rock que poucos como ele são capazes de fazer. Novas aulas de como compor um bom rock ‘n’ roll: "The Undefeated" – daquelas que viram clássicos instantâneos, emocionante no coro final entoando: “Nós somos os invictos/ Sempre invictos/ Agora!” –; "Something Wild" e a parceria com Slash "My Baby Wants To Rock And Roll". Não precisa dizer que esta última saiu um exemplar à altura de dois músicos que escreveram hinos rockers como “No Fun” e “Sweet Child O’Mine”.
O disco termina com outra balada, "Livin' On The Edge Of The Night", do premiado músico Jay Rifkin, que figura na trilha de “Chuva Negra”, filme de sucesso de Ridley Scott e estrelado por Michael Douglas e Andy Garcia, das poucas que não têm autoria do próprio Iggy entre as 14 faixas de um disco irreparável. Iggy Pop, finalmente, consegue ser ele mesmo sendo os vários Iggy Pop que há dentro de sua alma versátil e liberta. E se havia alguma dúvida de que tinha competência de produzir uma obra autoral sem a ajuda dos parceiros, “Brick...” é a prova cabal. Literalmente, não deixa “pedra sobre pedra” e nem muito menos “tijolo por tijolo”.
**********
Clipe de"Candy" - Iggy Pop e Kate Pierson
**********
FAIXAS: 1. "Home" – 4:00 2. "Main Street Eyes" – 3:41 3. "I Won't Crap Out" – 4:02 4. "Candy"(partic.: Kate Pierson) – 4:13 5. "Butt Town" – 3:34 6. "The Undefeated" – 5:05 7. "Moonlight Lady" – 3:30 8. "Something Wild" (John Hiatt) – 4:01 9. "Neon Forest" – 7:05 10. "Starry Night" – 4:05 11. "Pussy Power" – 2:47 12. "My Baby Wants To Rock And Roll" (Iggy Pop/Slash) – 4:46 13. "Brick By Brick" – 3:30 14. "Livin' On The Edge Of The Night" (Jay Rifkin) – 3:07
Todas as músicas de autoria de Iggy Pop, exceto indicadas