domingo, 31 de julho de 2022

POEMAS CANTADOS POR RUI VELOSO


 Lado Lunar

Rui Veloso


Não me mostres o teu lado feliz

A luz do teu rosto quando sorris

Faz-me crer que tudo em ti é risonho

Como se viesses do fundo de um sonho


Não me abras assim o teu mundo

O teu lado solar só dura um segundo

Não é por ele que te quero amar

Embora seja ele que me esteja a enganar


[Refrão]


Toda a alma tem uma face negra

Nem eu nem tu fugimos à regra

Tiremos à expressão todo o dramatismo

Por ser para ti eu uso um eufemismo

Chamemos-lhe apenas o lado lunar

Mostra-me o teu lado lunar


Desvenda-me o teu lado mausão

O túnel secreto a loja de horrores

A arca escondida debaixo do chão

Com poeira de sonhos e ruínas de amor


Eu hei-de te amar por esse lado escuro

Com lados felizes eu já não me iludo

Se resistir à treva é um amor seguro

à prova de bala à prova de tudo


[refrão]


Mostra-me o avesso da tua alma

Conhecê-lo e tudo o que eu preciso

Para poder gostar mais dessa luz falsa

Que ilumina as arcadas do teu sorriso


Não é por ela que te quero amar

Embora seja ela que me vai enganar

Se mostrares agora o teu lado lunar

Mesmo às escuras eu não vou reclamar


Limpa Corações

Rui Veloso


Sei quem tem a purpurina

Que dá lustro aos corações

E limpa as teias do medo

E semeia as ilusões


Eu sei quem conhece as manhas

Às serpentes e às maçãs

Sei quem dissolve a tristeza

Em solução de aguarrás


Sei quem canta no trabalho

E mexe no choro e no riso

Sei quem conhece um atalho

Para voltar ao paraíso


Há quem limpe chaminés

Há quem limpe corações


Dizem que só as crianças

Conhecem esse brinquedo

Mas o limpa-corações

É uma criança em segredo


Que ilumina um dia triste

Com as cores do grande bazar

Quem quiser nem é preciso

Sair para o ir buscar

Anda perdido no ar

Com o seu verso afiado

Ele dá lustro e areja

O pó dum coração fechado


Há quem limpe chaminés

Há quem limpe corações


Logo Que Passe A Monção
Rui Veloso

Num banco de névoas calmas quero ficar enterrado
Num casebre de bambú na minha esteira deitado
A fumar um narguilé até que passe a monção
Enquanto a chuva derrama a sua triste canção

Sei que tenho de partir logo que suba a maré
Mas até ela subir volto a encher o narguilé
Meu capitão já é hora de partir e levantar ferro
Não me quero ir embora diga que foi ao meu enterro

Deixem-me ficar deitado a ouvir a chuva a cair
Que ainda estou acordado só tenho a alma a dormir
Como a folha de bambú a deslizar na corrente
Apenas presa ao mundo por um fio de água morrente

Nos arrozais morre a chuva noutra água há-de nascer
Abatam-me ao efectivo também eu me vou sem morrer
Para quê ter de partir logo que passe a monção
Se encontrei toda a fortuna no lume deste morrão

Ópio bendito ópio minhas feridas mitiguei
Meu bálsamo para a dor de ser
Em ti me embalsamei
Ópio maldito ópio foi para isto que cheguei
Uma pausa no caminho
Numa névoa me tornei




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