terça-feira, 16 de agosto de 2022

POEMAS CANTADOS POR RUI VELOSO


Serpente no jardim

Rui Veloso

 

Custa ver-te assim dançar

Como ave sem bando

Sem ninguém a quem se dar

Que só de ver rodopiando

Quase faz doer o olhar


As rosas têm ciúme

Se tudo à volta se ergue

Em rendida salvação

Mas diz-me para que serve

Dançares só para ti essa canção


Venho acordar-te do sono de narciso debruçado

Sobre o lago surdo cego mudo e quedo

Olha para mim

Sou a serpente no jardim


Tens direitos de rainha

Não queres saber de nada

És poder em toda a linha

Mas beleza imaculada

Não toca em fibra minha


Vou picar em ti o meu ferrão

Com geleia de Cupido

Vais aterrar no chão

Provar o amor sabido

E morder o pó da paixão 


Sete partidas

Rui Veloso


Ouço uma voz que me canta velhas canções esquecidas

E embala o meu sonho num cais de sete partidas

Como água morrente no longe vai e vem o madrigal

Provença que soas ainda nas nopites de portugal


Viajantes de alexandria mostram laca e seda fina

Ouro pimenta e marfim porcelana e musselina

Falam do preste joão dizem do seu paradeiro

Aos altos da etiópia vou mandar um mensageiro


Acordo todas as manhãs com ecos dessa canção

Sete partidas cinco chagas vãs águas morrente e sião

Cantiga de amigo provença no coração

Embala o meu sonho e leva-me ao preste joão


Canção que trazes aromas de alóes e benjoim

Aponta na minha carta onde se cheiram coisas assim

Para lá da núbia doirada para lá dos dardanelos

Na pérsia na india encantada até aos rios amarelos


Vejo passar caravanas na língua dos mercadores

E as cidades italianas brilham em seus esplendores

Tenha eu a certeza do que me canta essa voz

E um dia génova e venza hão-de ouvir falar de nós


Acordo todas as manhãs com ecos dessa canção

Sete partidas cinco chagas vãs águas morrente e sião

Cantiga de amigo provença no coração

Embala o meu sonho e leva-me ao preste joão


Sexta-feira Nem Que Chova

Rui Veloso


São oito menos cinco

Já piquei o cartão


Para começar o dia

Entro na oficina

São oito menos cinco

De mais uma bela matina


Ao toque da sirene

Ponho as mãos no aço


Saltam as limalhas

Ficam no cachaço

Ao toque da sirene

Marco o meu compasso


A manhã vai lenta

Do meio-dia nem sinais


Tenho a boca amarga

Com o sabor dos metais

A manhã vai lenta

E as horas duram mais


Vou fumar um cigarro

Até ao w. c.


Sabe-me pela vida

E sempre dá alento

Vou fumar um cigarro

Aproveito e queimo o tempo


O que vale é sexta-feira

Depois é dia de alcova


Cuidado com a soneira

Cuidado com o escova

O que vale é sexta-feira


Sexta-feira nem que chova


Vou indo devagar

Não ligo a louvores


Não me vou esfolar

Também não sou um sorna

Mas para a obra acabar

Há tempo até à reforma


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