segunda-feira, 17 de outubro de 2022

Crítica Musical

Ok Computer (1997)




Vulgarmente, nos dias que correm, ouvimos referências a Radiohead como sendo a «maior» banda da actualidade musical. A mais completa, a mais irreverente, a melhor. Tudo isto é muito subjectivo, mas a verdade é que a formação liderada por Thom Yorke já tem o seu lugar na história. Hoje são ídolos e influências, e muito se deve a OK Computer. 

Depois de um Pablo Honey de estreia, marcado pelo hino do rock radiofónico «Creep», The Bends mantivera a lógica de uma banda de rock britânica dita alternativa. Sem grandes complementos, o grupo começava a ganhar visibilidade e em 97 todos esses aspectos tornaram-se essenciais na mudança da sua sonoridade e naquilo que hoje reconhecemos como fantástico.

Um síndrome bem Kurt Cobain ( «Smells Like Teen Spirit») marcou a banda que parecia só ter um tema no curto mas já respeitoso reportório. «Creep» é hoje um momento raro de se ver, e da sua exaustão saiu uma mudança total do rock cru , dando lugar a algo mais progressivo e aventureiro. OK Computer é o ponto de viragem. Kid A, lançado em 2000, tornar-se-ia demasiado confuso para quem salta este incrível marco na musica dos últimos 20 anos.

Um quadro dinâmico, que muda a sua pintura de forma inconstante. Por vezes sente-se um auto-retrato na voz de Thom Yorke que se demonstra um letrista fora do comum. Por outras , entramos num abismo colossal de efeitos sonoros consideráveis.


«Airbag» é um dos temas que faz deste álbum, o meu favorito da banda. O riff esmagador que dá abertura a este longa-duração assemelha-se ao medonho som da gigantesca chaminé do Titanic em queda… É estrondoso sem assustar ninguém. A voz de Thom Yorke não o permite. O uso de samples ao nível da percussão, bateria e baixo, é algo subtilmente genial, melhor, só mesmo o registo vocal que se torna hipnótico. O cérebro flutua ao som deste tema.


A musica se segue é um daqueles momentos-chave em toda uma carreira. Um tema mais prolongado do que a banda nos tinha vindo a habituar, deixa para trás o brit-pop de todo e procura algo mais progressivo e de certa forma mais sentido. «Paranoid Android» é mais do que viciante. Será esta uma procura de algo épico, como por exemplo um «Bohemian Rhapsody» dos Queen aplicado ao final do milénio? Em 1997 certamente não imaginariam o estatuto que viriam a ter nem a forma como iriam abalar toda a indústria discográfica com o álbum In Rainbows (2007), uma década depois… Sem rodeios, épico ou não, é um tema fantástico. Uma salada de frutas perfeita onde se jogam todo o tipo de sentimentos, de emoções e de rasgos de completa inconsciência – de loucura pura e dura.


«Subterranean Homesick Alien» entra numa onda mais calma. Os efeitos de fundo demonstram-se essenciais aos novos temas, e a verdade é que os pormenores fazem a diferença.  Psicadélico ao ponto de nos transpor para um mundo em slow motion, onde as cores não são estáticas e onde o conceito de volume não existe. Quatro minutos e meio no País das Maravilhas atrás da bela Alice…

«Exit Music (For a Film)» prova que os álbuns que ficam para a história são aqueles que buscam toda uma variedade de reacções, de temas e de composições.
“Today we escape… we escape.” . Esta música em concreto consegue baixar o astral ganho com o rock orelhudo e o psicadelismo experimental dos temas anteriores. O dom da palavra de Thom Yorke é comprovado através de temas como este, que conseguem criar todo um ambiente de desconforto e de alguma nostalgia. No verso da medalha está o título já carimbado de depressivo… Um tema pleno de emoção. Um confessionário.

Desiludam-se se procuram neste terceiro álbum uma renovação de músicas como «High and Dry» ou até mesmo a rockeira «Anyone Can Play Guitar». «Let Down» prova uma produção muito acima da média, cada som é trabalhado ao pormenor, e se o ouvinte estiver num estado de espírito explorador , encontra camadas e camadas de pequenos pormenores que distinguem os que ficam e os que passam.

É a meio do álbum que encontramos o hino Radiohead. Aquele que se ouve em uníssono público-palco nos seus tão aclamados concertos. É aquele que nos faz crescer aquele arrepio. É aquele, que sem sabermos porquê, se demonstra um camaleão a cada audição. Que cria reacções distintas.«Karma Police» é uma prova da genialidade da banda em todos os aspectos. Não é um sucesso comercial indiscutível que comprova o que digo, é verdade. No entanto não desiludirei ninguém ao afirmar que este é o tema que marca o peso de uma nova era de rock alternativo, da maior vitória para a música indie. Toda uma nova geração foi criada. Antes de OK Computer e Depois de OK Computer são épocas distintas . A-OK / D-OK , nascia a religião Radiohead.

O projecto Easy Star All-Star viu neste registo toda uma nova referência para o Reggae que produzem, criando uma espécie de álbum de versões deste mesmo. Um registo agradável e divertidamente descomprometido.

O retorno dos samples assombrosos é registado na fantástica «Climbing Up the Walls», num falsete que deixa muita matéria para o Matt Bellamy (Muse) aprender. Possivelmente, sem Ok Computer não teriamos muitos dos temas que fazem sucesso no reportório crescente dos Muse. Se bem que em '99 aquando do lançamento de Showbiz, os próprios Muse não acharam muita piada àcomparação...

Relembrando sons que nos transmitem um cenário Homem vs Máquina, este tema na estrutura do álbum serve de exorcismo. Apesar de balada, esta música trás tudo menos conforto... é confusa e demasiado pessoal...

«No Suprises» é um renascer total após tamanho experimentalismo. Envolvente e dona de uma atmosféra única. Um hino de alienação moderna, que retrata a monotonia que marca a vida quotidiana do ser humano. O típico trabalhador das 9h às 18h e 30m. A infelicidade de viver de certezas e de rotinas.

 «Lucky» é um exemplo do inexplicável. Este tema merecia ser a bandeira de um álbum, e nem sequer foi apresentado como single. A única explicação que encontro é mesmo porque não se trata de um original do Ok Computer,  mas com dois anos antes, tendo saído numa compilação para uma campanha de solidariedade em 95... De qualquer forma, é um autêntico pecado para o seu fidedigno público não saber este tema de trás para a frente de tanto passar no leitor de Cds... Esta tenho a certeza que foi escrita para ser cantada por centenas de vozes. Não fará outro sentido senão esse...«Lucky» é encantadora.




A despedida torna-se complicada, e «The Tourist», talvez por esse encargo, é o tema que menos faço questão de ouvir... Jonny Greenwood, o multi-instrumentalista, é um compositor nato, e a muito se lhe deve os créditos da banda. A ele também se lhe deve esta capacidade em puxar pelos dotes do vocalista, num mundo de subtileza electrificante, onde a perceptibilidade e o easy-listening foram deixados para trás.

Radiohead é elitista. Não é para qualquer um: é para quem se atreve a ir mais longe.

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