Ommadawn é um dos mais delicados discos de Mike Oldfield, e também o seu terceiro longa duração. Traz a surpresa da voz do músico inglês, e mantém-se como um dos melhores momentos da sua extensa discografia.
Para as novas gerações, Mike Oldfield é um nome perdido no tempo, um músico sem qualquer significado, ou até um nome totalmente desconhecido. Mesmo correndo o risco normal de qualquer generalização deste tipo, a verdade é que a grandeza e circunstância que noutros tempos estava apensa ao músico inglês, hoje estará (quase) reduzida a uma nota de rodapé nas vidas de muitos melómanos recentes. É da natureza do tempo e da sua passagem e pouco haverá a fazer. Talvez por isso, a verdade é que nos ocorreu voltar a um dos seus primeiros álbuns, fugindo propositadamente ao estrondoso sucesso da sua estreia a solo, o mítico Tubular Bells (1973). A escolha acabou por recair em Ommadawn (1975), o terceiro longa duração de Mike Oldfield, que a 25 de outubro do ano indicado viu, finalmente, a luz do dia. Foi um parto difícil, uma vez que o disco acabou por estar bastante condicionado por uma série de circunstâncias infelizes, desde a morte da mãe do músico durante o período de estúdio, como ainda alguns problemas nas camadas de óxido das fitas de gravação, que começaram a desprender-se do acetato, o que levou Mike Oldfield a voltar ao início quando o álbum estava já em fase de conclusão. Este problema técnico, aliás, aconteceu ainda um segunda vez, sendo que só à terceira, e já em desespero, o músico conseguiu terminar o seu trabalho. Terá valido a pena todo o esforço e dedicação, uma vez que o disco é histórico, e a história da música terá registado, eventualmente, com este lançamento, um álbum que abriu caminho para o que se vulgarizou chamar-se world music. Pois é, ela talvez tenha nascido para a Europa com Ommadawn.
Este terceiro LP de Oldfield seguiu os preceitos dos anteriores Tubular Bells e Hergest Ridge (1974), álbuns compostos apenas por duas faixas, uma em cada lado da rodela negra de vinil. Musicalmente falando, Ommadawn é uma extensa sinfonia fatiada, onde prevalece, naturalmente, a instrumentação. Ao contrário do seu predecessor, mais pastoral e mais bucólico, aqui Mike Oldfield trilha outros caminhos sonoros, nem sempre bem decifráveis, na verdade, que no entanto poderão ir de mãos dadas com um certo imaginário celta (mas com gosto, não se aflija) e africano, por via dos momentos de percussão. Há, pelos entremeios de tudo isto, um ligeiro esgar prog que pontifica muito bem nos seus pouco mais de dezanove minutos de duração de todo o lado A. São momentos de sonho, ambientes de tranquilidade que parecem infinitos, mas também, a espaços, desafiantes e de alguma inquietação. O coro, por exemplo, ajuda a manter uma certa tensão, que vai surgindo e desaparecendo à medida que a agulha vai trilhando o seu caminho rumo ao fim. Há ainda alguma epicidade lá pelo último terço da faixa “Ommadawn Part 1”, sobretudo através do uso da guitarra elétrica de Mike Oldfield.
Em “Ommadawn Part 2” há algumas diferenças, embora se mantenha, na maior parte do tempo da sua duração, o tom nostálgico, delicado e singelo presente no lado A do disco. O órgão inicial é tremendo, e até por volta dos seis minutos tudo é uma autêntica maravilha, momentos de revigorante elevação. E assim vai crescendo a composição, como se ao sabor dos ventos rítmicos e melódicos gerados na cabeça de Mike Oldfield. A grande surpresa será, não temos dúvidas, o facto de pela primeira vez Oldfield emprestar a sua voz a um registo musical seu. Aparece no momento final do disco, e será, se assim quisermos entender, uma espécie de faixa extra, intitulada, quando saiu em single, como “On Horseback”. É um momento que funciona como homenagem ao tempo em que Oldfield e os seus amigos Murray e Penning (que participam do álbum) cavalgavam em Hergest Ridge, que é, como sabemos, nome de localidade e também do álbum anterior do músico inglês. Ela encaixa na perfeição no fim do lado B do álbum, e é uma bonita e comovente forma de Ommadawn nos dizer adeus.
A propósito de “adeus”, Mike Oldfield não se quis despedir tão cedo de Ommadawn, tanto que a sua intenção foi fazer de Amarok, o seu álbum de 1990, uma continuação do seu terceiro longa duração. No entanto, não ficou por aí, uma vez que em 2017 lançou Return To Ommadawn, a derradeira sequela do álbum de 1975.
Uma nota final para a fotografia da capa do álbum. Ela foi tirada por David Bailey, fotografo que não precisa de grandes apresentações, e cuja vida inspirou a criação da personagem principal do filme Blowup, de Antonioni. Na imagem, Mike Oldfield faz lembrar Jesus Cristo, o que não deixa de ser curioso. Para muitos, desde o início daquela década, Oldfield era claramente um deus da música.
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