Resenha
To The Far Away
Álbum de Dave Bainbridge
2021
CD/LP
Uma mistura rica de belas melodias e musicalidade que evoca sentimentos de separação, perda e saudade
Dave Bainbridge é um multi-instrumentista que certamente merecia um reconhecimento maior do que já tem. Começou a sua carreira como membro cofundador da banda de folk progressivo, Iona e hoje é membro de estúdio e turnê, por exemplo, das bandas Lifesigns e Strawbs, isso para falar apenas alguns dos seus projetos e colaborações mais conhecidos, mas seus trabalhos vão muito além. Inclusive, sua carreira solo, onde no ano de 2021 lançou um disco simplesmente sensacional. Antes de continuar, quero dizer que ele não esteve presente na minha lista de melhores do universo progressivo de 2021 aqui no 80 Minutos, simplesmente porque eu só fui ouvi-lo pela primeira vez em 2022. To The Far Away é um disco incrível do começo ao fim. De uma qualidade e charme inquestionável, esse progressivo de influência celta soa bastante dinâmico, musicalmente rico e por vezes muito dramático em um conjunto de músicas que realmente funcionam muito bem juntas. Todas as principais influências de Dave são extremamente bem agrupadas, tais como o folk, rock progressivo, celta e até mesmo a música clássica, porém, nunca deixando com que o disco perca a direção, seguindo assim, sempre coeso. “Sea Gazer” é uma peça que começa em uma crescente por meio de umas vocalizações coral. Então que a música entrega um solo de guitarra por algum tempo antes da entrada de um arranjo mais completo, continuando a evoluir a partir disso. Logo aqui, é possível perceber uma grande influência nas paisagens musicais de Mike Oldfield em seus primeiros discos. Quando finalmente a voz sublime de Sally Minnear (filha de Kerry Minnear do Gentle Giant) se une aos instrumentos, a melodia assume uma postura ainda mais elegante e profunda à medida que a música vai seguindo seu curso. De sonoridade melódica e matadora, unida a pinceladas celta, essa faixa de abertura leva o ouvinte em direção uma experiência musical bastante singular. “Girl And The Magical Sky”, começa dentro de um lado mais suave, em uma abordagem de balada. Diferentemente do que ocorreu na peça anterior, os vocais já se instalam desde o início. Conforme se desenvolve, a abordagem progressiva melódica vai ficando mais poderosa. Possui algumas voltas e reviravoltas e alguns solos de guitarra que soam bastante evocativos, além de ricos trabalhos de teclas, fazendo com que o resultado final seja de um mini épico muito bem construído. “Rain And Sun”, ao mesmo tempo em que é uma música intrincada, também é suave e vai crescendo cada vez mais e de maneira requintada. A guitarra que serve de base é delicada e complexa. Novamente é possível perceber algo de Mike Oldfiel, mais precisamente a música de Ommadawn. O solo de guitarra é de uma classe tremenda. Uma música instrumental encantadora e de momentos dramáticos. “Clear Skies” começa de forma serena e elegante, até que explode uma peça progressiva celta de sonoridade muito enérgica. Ao atingir o que podemos considerar o pico, a peça então cai para uma região mais intrincada de folk progressivo para a entrada dos vocais. De certa forma, nessa música é possível ver algum aceno ao Renaissance. A melhor parte, sem dúvida, é quando ela entrega uma jam progressiva, onde a interação instrumental é incrível. “Ghost Light”, com mais de 14 minutos é o grande épico do disco. Se trata de um rock progressivo melódico de primeira classe, com vocais que nos dão a sensação de um toque de Pink Floyd – mais precisamente em algo de Dark Side of the Moon -, bastante dinâmica em várias partes, com movimentos em que há um grande equilíbrio entre passagens mais suaves e outras mais agitadas. Um épico com todos os ingredientes necessário para soar marcante. “Cathedral Thinkers” começa por meio de um belíssimo piano. Então que a peça vai evoluindo com teclados e guitarra que a fazem atingir seu ápice, parecendo que vai chegar ao fim, porém, ainda temos a entrega de um solo de piano. “To Gain the Ocean” tem início com um vocal acompanhado estritamente por piano – a voz agora é de Iain Hornal -, então que após um tempo, juntam-se a eles um belo violão e uma instrumentação pomposa. “As Night Falls”, como pouco menos de 2 minutos é a menor peça do disco. Possui alguns elementos crescentes de guitarra e sinfônicos. Suave, também carrega uma boa sensação de drama e mistério. “Infinitude (Region Of The Stars)” possui uma paisagem sinfônica - que é a ordem dessa faixa - e vocais oníricos por parte de Sally. A faixa tem algumas vocalizações, mas tirando isso, é uma peça instrumental que soa evocativa e potente. “To The Far Away”, a faixa título também é um dos destaques, uma peça instrumental maravilhosa, com alguns toques celtas embutidos, além de ter uma musicalidade bastante rica e excelentes solos de guitarra. “Speed Your Journey” é outra peça mais acelerada do álbum, com vocais que funcionam muito bem, enquanto a banda entrega um rock progressivo de inspiração celta que é um verdadeiro deleite. “Fells Point” é mais uma peça instrumental, com pouco menos de 3 minutos é outra música mais curta do disco. Mais uma vez bastante envergada para a música celta e progressiva, também entrega um solo de guitarra muito interessante. “Something Astonishing” é a faixa que encerra o álbum. O seu começo poderia estar tranquilamente em algum disco do Steve Hackett. Novamente, apesar de ter algumas vocalizações, é toda instrumental, com destaque para mais um solo de guitarra bastante intenso. Considero esse final muito apropriado e no nível de tudo o que foi apresentado até aqui. Dave escreveu To The Far Away durante – segundo palavras dele mesmo - os "tempos terríveis" do bloqueio causado pela Covid e o desgosto da separação forçada de sua então noiva e agora esposa Sharon por quase 9 meses. Incrível que o ouvinte consegue sentir esse clima de separação em toda parte do álbum. Considero esse, um daqueles discos que recompensa o ouvinte cada vez mais em novas audições, pois sua música tende sempre a crescer e mostrar algo diferente que passou despercebido anteriormente.
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