quinta-feira, 2 de março de 2023

Resenha Tour De France Soundtracks Álbum de Kraftwerk 2003

 

Resenha

Tour De France Soundtracks

Álbum de Kraftwerk

2003

CD/LP

O Kraftwerk gastou a década inteira de 1990 fazendo o que já vinha fazendo nos anos 1980: reformando o estúdio constantemente com novas tecnologias e praticamente não compondo música nenhuma, somente atualizando o catálogo existente. Então, de forma repentina, saiu no final de 1999 a música "Expo 2000", um jingle comercial para promover a feira mundial realizada em Hanover. A canção, que na sua versão original tem um clima futurista-retrô ao ponto da autocaricatura e emprega uma batida suave e relaxada, foi sensação na mídia: o gigante finalmente acordou! Que outras boas notícias viriam de Düsseldorf dali em diante?

A resposta foi este álbum, até agora o último de composições originais da banda alemã, lançado em 2003. Para variar, saiu atrasado em relação à competição ciclística que lhe dera o nome. A música "Tour de France" original, de 1983, também tinha sido lançada atrasada em relação ao evento daquele ano. Para compensar, uma versão regravada dela foi incluída como faixa de encerramento do álbum, e a capa do antigo single foi reutilizada neste LP.

O material novo, porém, não "conversa" muito com a famosa música original. Conceitual e estilisticamente, ele tem mais a ver com "Trans Europe Express" do que com o restante do repertório do grupo. Para não sair do costume, há uma longa suíte que descreve em formato aural uma corrida de bicicleta de longa distância, com um resultado bem convincente para os meus ouvidos de ciclista. Impressiona bem a maneira como o arranjo é esparso, econômico e minimalista, com muito "respiro" e uma batida bem descomplicada, no ritmo perfeito para pedalar ou correr. A letra, inteiramente em francês, não é a mais genial da biografia da banda, mas contém todas as palavras-chave relacionadas à competição.

Tenho que confessar que, dentre as músicas novas, meu entusiasmo com a suíte só é partilhada pela brilhante "Aero Dynamik / Titanium", que aliás saiu como single com várias versões remixadas em estilo club techno, uma mais interessante que a outra. É talvez a última obra-prima indiscutível da carreira da banda. As demais músicas, "Vitamin", "Elektro Kardiogramm", "La Forme" e "Régéneration", são todas bem compostas (somente um ciclista de verdade poderia escrever tais versos!) e bem realizadas, mas parecem se arrastar muito, cansam meus ouvidos e pedem pelo fast-forward. É uma pena para uma banda que produz tão pouco.

Voltemos, então, a "Aéro Dynamik". Assim como o título, a letra inteira é formada por uma palavra em francês e outra em alemão, e cada verso descreve um aspecto crucial da prova ciclística: é um poema de considerável mérito por conta própria. Melhor ainda, a música, construída com somente dois acordes penetrantes e um baixo borbulhante, soa como algo nada que ninguém mais no planeta seria capaz de criar, o que no contexto contemporâneo de música pop inteiramente feita com auxílio de máquinas, é um grande elogio. O Kraftwerk não precisava ter passado tanto medo na década anterior de ser confundido com um milhão de grupos pop com arranjos semelhantes.

Florian Schneider aposentou-se da banda em 2008 e acabou falecendo em 2020, o que deixa o outro membro fundador, Ralf Hütter, como compositor único do grupo, já que os outros três que completam o line-up possuem apenas funções auxiliares. Se for para esperarmos um álbum (final?) de música original do Kraftwerk para algum momento, a bola está unicamente com Ralf, e ele não demonstra ter nenhuma pressa.

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