sexta-feira, 14 de abril de 2023

Future – DS2 (2015)

 

À terceira é de vez: DS2 é a obra-prima de Future. Trap sombrio encharcado em sedativos.

Os dois primeiros discos de Future foram uma desilusão: flácidos e melosos, mau putedo pop. A redenção só chega com DS2, um álbum honesto de trap, sem concessões de qualquer espécie. A verdade compensa: público e crítica rendem-se à sua melancólica perfeição.

DS2 é quase um disco conceptual, um ensaio sobre a cultura de drogas que grassa no hip-hop. Falamos principalmente do dirty sprite aludido no título, uma mistura de codeína com gasosa que relaxa e entorpece. Tudo em DS2 evoca essa letargia opiácea: as batidas lentas e arrastadas; as rimas dormentes e entarameladas; os baixos claustrofóbicos e teclados góticos (evocando a dor que se tenta em vão adormecer). O disco vive deste hedonismo sombrio: gajas, drogaria e bens de luxo como espelhos do vazio e da depressão. Os vomitórios romanos estão de volta. Reabriram os cabarets de Weimar…

Num milénio empobrecido pelo excesso de nostalgia, DS2 é intransigentemente contemporâneo. Foram inovações como o trap e o auto-tune (ambas definidoras deste disco) que salvaram a honra do convento. A própria forma como o auto-tune é aqui utilizado – em directo, ouvindo-se a manipulação digital no momento da gravação – acrescenta mais modernidade ao projecto: Future como homem-máquina, biológico e mecânico ao mesmo tempo. Nada exprime melhor o desencanto deste século do que a sua voz de computador magoado…


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