Resenha
Canvas Three
Álbum de Inner Prospekt
2023
CD/LP
Nos últimos dois anos, Alessandro di Benedetti, por meio do seu do seu apelido Inner Prospekt, lançou dois discos que estiveram como destaques do ano – inclusive, Canvas Two esteve na minha lista de melhores do universo progressivo de 2021 aqui no site. Agora, ele está de volta com seu mais novo disco, Canvas Three, mais um trabalho de pura delicadeza e forte influência em Genesis – principalmente por conta dos teclados muito bem-acabados de Alessandro. Outra influência que permeia a música em Canvas Three é a do rock progressivo italiano, tanto clássico quanto o contemporâneo, deixando claro o valor que Alessandro dá ao gênero produzido em seu país. Originalmente, todas as músicas do disco foram compostas para as bandas Samurai of Prog e The Guildmaster – mas com o músico sempre colocando a sua própria e brilhante visão sobre todas elas. Além de Alessandro di Benedetti, que fica a cargo de todos os vocais, teclados, baterias e composições do álbum, Canvas Three também conta com a participação do multi-instrumentista, Rafael Pacha (guitarra, guitarra de 12 cordas, violão clássico, viola, viola da gamba piccolo, baixo e bandolim), Federico Tetti (guitarra nas faixas 4 e 6) e Carmine Capasso (guitarra nas faixas 1 e 7). “Scratches” é a peça que inicia o álbum. Mais do que citar a influência de Genesis como um todo, a forma como Alessandro desenvolve o trabalho de teclas é nitidamente uma espécie incrível de ode a Tony Banks, em uma impetuosa e poderosa performance do começo ao fim da música - incluindo um solo cheio de groove. Há também algumas infusões jazzísticas e acenos ao The Flower Kings. Porém, seria um pecado ignorar o trabalho de guitarra que é feito aqui, sempre muito cristalino. A seção rítmica também possui um excelente acabamento e se mantem continuamente bem conectada à belíssima harmonia da peça. Um lindíssimo começo de disco. “The Island of Despair” começa por meio de alguns sons sinfônicos muito intensos e cativantes, então a peça ganha um novo direcionamento bastante influenciado em Genesis, inclusive, até a interpretação vocal de Alessandro remete à Peter Gabriel. Do ponto de vista de um marinheiro, as letras falam sobre um naufrágio. Toda a agonia, aflição e até mesmo a descrença em um final feliz, é extremamente tomado por um trabalho musical sentimental e cheio de paixão, principalmente em seu núcleo, quando um piano solo aos poucos vai ganhando a companhia de alguns trabalhos de cordas que aumentam ainda mais uma sensação de dor e aflição, seguido por uma seção de flauta e guitarra solo que mais uma vez soa brilhante e simples ao mesmo tempo. Quanto ao marinheiro, não tem como saber se ele morreu afogado ou conseguiu ser salvo. De qualquer forma, é uma peça incrível. “A Wordless Fable” é uma faixa instrumental de beleza incrível. Começa por meio de um violão clássico brilhante e rico de melodia que vai aos poucos avocando o ouvinte para um translado musical aliciante. Algumas teclas vão dando aos poucos um corpo sinfônico à peça. Algo que eu adoro no rock progressivo, são suas músicas que muitas vezes tem a capacidade de entregar uma gama enorme de sentimentos e mudanças em apenas uma peça, sendo este um grande exemplo disso e ainda se mantendo coesa, o que também é muito importante. Teclas, guitarra e violão são sublime, além da seção rítmica que mais uma vez é bastante sólida e precisa. Uma verdadeira viagem ora pastoral, ora em tons inquietantes e até linhas que despertam no ouvinte a alegria em viver. Tudo é tão rico, que às vezes fica difícil de acreditar que foi tocada por apenas dois músicos. “The Showdown”, apesar de três músicas que passam dos 11 minutos, certamente é aqui que encontramos o grande épico do disco com os seus mais de 20 minutos. Começa por meio de uma progressão de acordes de piano de atmosfera taciturna, se mantendo assim por cerca de 2 minutos, então os demais instrumentos entram na peça e torna tudo sonoramente mais esperançoso, com os sintetizadores liderando o caminho através de um solo cheio de otimismo, então os vocais transitam pela peça pela primeira vez. Se por um lado, os vocais desfilam dentro de um caráter harmonioso pouco ou até mesmo nada variável, o mesmo não se pode dizer em relação aos seus hiatos instrumentais, pois Alessandro e Federico Tetti dão uma verdadeira aula de como desenvolver uma peça absorta, deslumbrante e arrebatadora através de instrumentos que parecem planar uns sobre os outros em uma viagem onírica simplesmente de tirar o fôlego. Há um belo solo de guitarra e próximo do fim, o piano do início regressa à peça, então os últimos vocais – na verdade apenas umas vocalizações femininas - acompanham a faixa, um solo de sintetizador bastante influenciado pelos progressivo 70’s antecipa um coro feito no Mellotron a deixando bastante pomposa, para depois ir ficando mais amena até encerrar com o som de um tiro, provavelmente matando o protagonista da música. Por último, vale mencionar, que há uma versão bônus dessa música no Bandcamp cantada em italiano com o nome de “La Resa dei Conti”, que vem da tradução para o inglês The Big Gundown, um filme de Sergio Sollima “spaghetti western” de 1967 estrelado por Lee Van Cleef. “Young Me, Old You” começa por meio de um violão clássico belíssimo. Quando entram os vocais para acompanhá-lo, há uma entrega que me lembra David Crosby e a sua jeito introspectiva de interpretar suas músicas. A sensação nostálgica de um avô, que relembra para o seu neto, sua soledade de quando durante a guerra buscou refúgio em uma caverna, é passada com muita delicadeza na peça mais emocionalmente forte do disco. Guitarra, violão, piano, cordas e seção rítmica, tudo é brilhante e extremamente cativante. É uma música, que de certa forma, poderia conter um excesso de sentimentalismo que desagradaria o ouvinte, mas não, tudo é simplesmente emocionante na medida certa. Em sua versão física, o álbum ainda traz uma faixa bônus, “The Lizard Tale”, mas essa resenha foi feita com base na versão encontrada nos serviços de streaming. Sobre a qualidade de Canvas Three, é fato que mais uma vez Alessandro di Benedetti mostra que está em sua melhor fase como compositor, entregando mais um disco que certamente estará entre os melhores de rock progressivo de 2023. Uma grande experiência para quem gosta de sonoridades comoventes e bucólicas com toques clássicos do prog italiano e aceno à era clássica do Genesis.
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