domingo, 2 de julho de 2023

Rufus Wainwright – Unfollow the Rules (2020)

 

Depois de homenagear Judy Garland, de gravar óperas, musicar textos de Shakespeare e de um disco a lembrar a soul e o gospel dos anos 1970, Rufus Wainwright volta a jogar em casa: Unfollow the Rules, o novo trabalho, vê o canadiano regressar às canções pop escritas para guitarra e piano, ainda que aqui e ali com mais músculo. É um belo disco e já tínhamos saudades deste Rufus.

Out of the Game, de 2012, estava longe de ser um mau disco, e foi o registo que marcou o encanto de Rufus pela Broadway e por ambientes mais gospel; o negro All Days Are Nights: Songs for Lulu, editado um par de anos antes, feito de piano, voz e dor, era também um bom álbum, embora de difícil digestão; assumindo que as óperas recentes e as músicas para sonetos de Shakespeare são todo um campeonato à parte, é de 2007 o último grande compêndio de cantigas pop do canadiano – Release the Stars foi então o quinto de originais e já trazia em cima a responsabilidade de não defraudar os muitos fãs do canadiano.

Eis-nos em 2020 e Rufus volta a jogar em casa.  A sequência inicial é perto de perfeita: “Trouble in Paradise”, “Damsel in Distress” e o tema-título são quase a comida da mãe, o regresso ao restaurante de família, à praia da infância – é Rufus em ponto de rebuçado, perto dos 50 anos de idade mas a recuperar elementos cançonetistas dos primeiros anos de carreira.

A voz, ainda e sempre a voz. Rufus canta a sua vida, sem receios, mostra-nos como é um dia junto do seu marido (“Peaceful Afternoon”), fala da filha “(“My Little You”) e continua a jogar na imprevisibilidade rítmica: há canções que vão acima, depois são atiradas cá para baixo, e pelo meio dão mais um par de voltas até chegarem ao inevitável clímax quase sempre potenciado pela voz única de Wainwright.

Rufus Wainwright
Rufus tem uma escrita muito própria, uma voz singular, uma carreira invejável, ampla e elegante.

Não há muitas surpresas, é certo. “This One’s for the Ladies (That Lunge)” é talvez a canção mais inesperada, com alguma eletrónica ao barulho mas ainda assim pertinente no contexto. O resto é quase tudo mais do mesmo (elogio!), como se o tempo tivesse parado em 2007, antes de algumas opções de carreira mais discutíveis do músico.

Rufus tem uma escrita muito própria, uma voz singular, uma carreira invejável, ampla e elegante. Com mais de dez discos editados, a sua obra-prima continua a ser Poses, de 2001, o segundo de originais. Unfollow the Rules é uma digníssima coleção de canções que não devem dar para o Panteão, é certo, mas que só trarão alegrias aos fãs. A pergunta do milhão de dólares é se voltará Rufus a gravar um disco tão impactante e imaculado como Poses – a resposta é incerta. Mas, a avaliar pelas novas canções, tal já esteve mais longe de acontecer.



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