quarta-feira, 6 de setembro de 2023

Nap Eyes – Snapshot of a Beginner (2020)


 

Os Nap Eyes são uma das grandes bandas da atualidade. No entanto, são também uma banda desconhecida para muitos. Este paradoxo não se explica facilmente, e isso pouco interessa agora. Importante é ouvir Snapshot of a Beginner e perceber que é muito bom.

Nem sempre se consegue fazer o que a banda de Nigel Chapman fez até ao momento: quatro discos imaculados, certeiros, cheios de grandes canções a um passo de serem canções para uma vida inteira. Esse quase que permanece prometedor, mas que nunca se concretiza no imediato (faz lembrar o “golpe de asa” de que se queixava Mário de Sá-Carneiro), não nos parece ser um problema. Antes pelo contrário, é um trunfo. Sobretudo porque todas elas, as canções dos Nap Eyes, trazem um manancial de esperança futura (passe a expressão) que um dia destes, quando as conseguirmos digerir corretamente, afinal abrir-se-ão totalmente para a eternidade do nosso contentamento. É dar-lhes tempo, que elas lá chegarão.

Posto isto, e dando ouvidos ao recente álbum da banda canadiana, as surpresas não são muitas, o que neste caso particular é também uma coisa boa. A razão prende-se com o facto deste Snapshot of a Beginner parecer ser a continuidade lógica dos anteriores, embora com um sentido melódico e rítmico mais apurados, mais refogados na receita sonora dos onze temas que dele fazem parte. É dolente quando tem de ser, acorda e dispara forte e feio quando lhe apetece, volta a sossegar, e assim se passam três quartos de hora em grande companhia e estilo. Este indie-pop-rock não engana e nele voltamos a sentir matrizes que dificilmente desiludem: Yo La Tengo, Lou Reed, Velvet Underground, Sebadoh ou Pavement, apenas para ficarmos pelos mais evidentes.

É certo que neste álbum não há nenhuma canção com a força de “No Fear of Hellfire”, do seminal Whine of The Mystic. Mas também, convenhamos, não é todos os dias que se fazem temas do outro mundo. Mas há um lote tremendo de canções que podem medir forças, cada uma com as suas distintivas particularidades, com esse inaugural momento de inspiração. Atiremos apenas meia-dúzia para cima da mesa. À confiança! Podem pegar nelas sem receios de maior, que nenhuma vos dececionará: “So Tired”, “Primordial Soup”, “Mark Zuckerberg”, “If You Were In Prison”, “Real Thoughts” e “Though I Wish I Could”. E, depois das referidas, uma “sétima que é cada vez mais a primeira”: “Mystery Calling”. Lembram-se ainda do que dizíamos no primeiro parágrafo deste texto? Pois aí está. Com a sua toada repetitiva, com o riff que se insinua constantemente, “Mystery Calling” é a prova de que o “mistério das quase perfeitas canções” pode muito bem ser apenas uma questão de tempo e nada mais. A tranquilidade e a inquietação que se podem escutar na quinta canção do disco, poderão muito bem conjugar-se para que “Mystery Calling” venha a ser a cereja no topo deste bolo sonoro. No entanto, é bom não esquecer que o tempo pode muito bem ser o fermento necessário para que cresça até se tornar (quase) gigante. E tempo é o que não nos tem faltado nos dias que correm…

Recapitulando: é tempo de se fazer justiça aos Nap Eyes. É tempo de acordar da sesta (perceberam o trocadilho, certo?) e perceber que é (quase) criminoso deixar de lado quem pode ser muito mais do que uma excelente companhia. O recentíssimo Snapshot of a Beginner é um ótimo álbum, um dos melhores desta primeira metade do ano que estacionou as nossas vidas. Peguemos nele e arranquemos sem precauções de maior. Desconfinar com os Nap Eyes não exige máscaras, nem luvas, nem distanciamento social. Basta ter bom gosto e verão que “vai ficar tudo bem”.



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