A música, tal como a comida, também se “come” pelos olhos, neste caso específico, também se “vende” pelos olhos. E a música portuguesa que o diga! Se até à década de 50 não existiam capas de discos especificas para ilustrar os temas culinários (o cantor Manoel Monteiro gravou em 1933 “Salada Portuguesa”, num disco de 78rpm de capa genérica) já Élio Miranda em 1976 ilustrava muito bem a “História do Chouriço”, como se comprova pela imagem incluída na primeira tira.
Mas, nem sempre tudo jogava em conformidade, o que sabemos ao certo é que muitos ingredientes culinários foram gravados ao longos dos anos por músicos portugueses, alguns com bastante sucesso, outros nem por isso, mas que não deixam de ser aqui lembrados. Nem sempre têm também capas a condizer, em boa verdade muitas capas de comida existem apenas para prender a atenção. Também acontece que há capas com termos e ingredientes culinários, mas não passam daí. E, para “ilustrar” melhor este artigo optou-se também por sugestivas capas elaboradas não só em Portugal como além-fronteiras e nas mais variadas opções artísticas.
Mas voltando ao chouriço, um ingrediente culinário tipicamente português e malicioso q.b. na maior parte das cantigas, não vamos deixar passar em claro algumas dessas “ementas”, a começar pelo José Cid com “Favas com Chouriço”, pelo Carlos Vidal “A Cantiga do Chouriço”, pelo Conjunto António Mafra com “Vi-te Picar no Chouriço”, pelo Quim Barreiros “Queres é Levar com o Chouriço”, pelo Conjunto Típico Os Peles Vermelhas com o “Chouriço”, pelo Quim Gouveia com “Rap do Chouriço”, pelo Duo Ele e Ela com “O Chouriço do Preto”, e, pronto, já chega de chouriços…
Fadistas foram também muitos os que contribuíram com temas de teor culinário e os mais lembrados não deixam de ser José Freire com o “Fado das Iscas”, Rodrigo com “Coentros e Rabanetes”, Hermínia Silva com “Ás Gingas com Elas”, Carlos do Carmo com “O Homem das Castanhas (Quentes e Boas)”, Amália Rodrigues com a “Caldeirada”, Carlos Ramos com o “Café das Camareiras”, Fernando Farinha com “Tia Ana da Fava Rica”, António Mourão com “Trigo do Alentejo”, e, mais recentemente Ana Moura com os “Búzios”.
Tanto “Fado das Iscas” como “Ás Gingas Com Elas” foram temas com várias interpretações e não devemos deixar de referir outras composições que se distinguiram pelos artistas que a gravaram. “A Moda da Amora Negra” uma belíssima composição de Resende Dias cantada por Florência, Maria Dilar, Adélia Pedrosa, Conjunto Beira Mar e Aurélio Perry entre outros. Também “Grão de Arroz”, um tema clássico composto por Belo Marques, teve notáveis interpretações por Maria José da Guia, Amália Rodrigues, Shegundo Galarza e Maria Lourdes Resende entre outros e outras.
Mas também existem ingredientes que foram recordistas pelas vezes que foram utilizados nas letras das composições, e, um dos campeões é o alho! Quem não se lembra desse megassucesso popular do pequeno Saúl “O Bacalhau Quer Alho”?... E a Tonicha com “Sericotalho, Bacalhau, Azeite e Alho”, o Conjunto Roda Viva com “Olha o Alho”, o Conjunto Pai e Filhos com “Dá-lhe com o Alho”, o Conjunto António Mafra com “Pancadinhas do meu Alho” e o Conjunto Típico Os Filhas da Noite com “A Fonte dos Alhos” ?...
Não devemos, no entanto, deixar de mencionar outros ingredientes como o limão no tema “A Rosinha dos Limões” nas vozes Artur Ribeiro, Manuel Fernandes, Fernando Tordo/ Carlos Mendes e de Max. Há também “O Limão” na voz da Gina Maria e “Quem Quer Limões” por Aurélio Perry. Já agora, também recordista como o alho é o arroz e o clássico “O Arroz está Cru”, cantado por Júlia Babo, Maria Rosa Rodrigues e o Conjunto de Jorge Machado. E, para não deixar no esquecimento, o “Meu Pratinho de Arroz Doce” pela cantora Ana Faria.
Seguem outros ingredientes para a lista: “Amêndoa Amarga” por Hélder Reis, “Loureiro” por Júlia Babo, “Piri-Piri” por João Maria Tudella, “Hortelã Mourisca” por Arlindo de Carvalho, “Mel, Mel, Mel” pelo Conjunto de Mário Simões e “Olha o Feijão” pelo Conjunto Bártolo Valença.
Infelizmente recentemente falecida, Maria Amélia Canossa iniciou a sua carreira na década de 50 com um êxito bem popular, o “Doce da Teixeira”. Também recentemente desparecido José Mário Branco deixou registado no seu último trabalho de originais o tema “Pão-Pão”. Já que falamos neste triste facto existencial da vida, não devemos de referir uma das bandas da passado que mais se coaduna com este artigo, os Salada de Fruta. Para mais com um álbum editado em 1980 rotulado como “Sem Açúcar”, que, embora induzisse em erro, não era só direccionado para os ouvintes diabéticos mas para todos os famintos da boa música portuguesa!
Outros inesquecíveis artistas (ou não) para a nossa ementa, useiros (uns + que outros) nos termos culinários:
- Quim Barreiros c/ “A Fruta”, “O Peixe”, “Bacalhau à Portuguesa”.
- António Claro c/ “Milho Rei”, “O Gato foi às Filhoses”, “As Uvas”.
- Corina c/ “Trigo Novo”, “Rosmaninho”, “Três Castanhas e um Feijão”.
- Fernando Tordo c/ “Fado das Rabanadas”, “Os Docinhos”, “O Café”
- Duo Ouro Negro c/ “Marmelada”, “Muamba, Banana e Cola”, “Rita Flor de Canela”.
- Fernando Lopes Graça c/ “Aproveitai a Azeitona”, “Gabriela, Cravo e Canela”, “Milho Verde, Milho Verde”.
Neste menu, à pois ingredientes e canções para todos os gostos. Das mais refinadas às mais tolerantes opções como “Como o Macaco Gosta de Banana” de José Cid ou “Eu Descasco-lhe a Banana” da Rosita, às simples “Batatinhas” da Tonicha até às “Cerejas Frescas” de Filipe Duarte e uma apetecível “Salada de Alface” de Fernanda Baptista para não falar da incomensurável “Joana Come a Papa” de José Barata Moura.
Está-se a ver que Portugal não foi só um país de valentes marinheiros mas também de inusitados cozinheiros que espalharam a nossa língua e gastronomia pelos quatro cantos do mundo. Que o diga a grande Amália Rodrigues com “O Fado é bom p’ra Xú Xú”, Carmen Miranda com “Canjiquinha Quente”, Jackson do Pandeiro com “Cajueiro”, Carmélia Alves com “O Balancé tem Açúcar”, Ruy Mingas com “Pé de Maracujá”, Erasmo Carlos com “Coqueiro Verde”, Irene Coelho com “Sardinha Assada”, Horácio Reynaldo “Trinca na Pera e Borato de Soda” e o Conjunto Roger Sarbib com “A Menina Piri-Piri”.
Provem pois os pratos que puderem, e, se assim o fizerem, estão no bom caminho das 5 estrelas concedidas para um master chief musical!... Ainda não há?… Pois não… Mas o mundo dá muitas voltas!…
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