Noah Lennox é um caso curioso. Nos dias que correm, o músico de Baltimore parece interessado em despir as roupagens que fizeram com que se pudesse afirmar no mundo, não apenas a solo como também a bordo do projeto Animal CollectiveLess is more é a ideia que agora parece estar no centro dos seus meandros criativos. E nós, um pouco descrentes em cenários de justaposições de sons, ritmos e outros ingredientes afins por vezes a tender para a inocuidade, batemos palmas e sorrimos ao constatarmos que a criatividade pode trilhar outros caminhos. Por isso saudamos Buoys. Saudamos a vitória da simplicidade, do bom gosto, das melodias que conseguem colar-se aos ouvidos com enorme facilidade, de tão bonitas e apelativas. Talvez seja do sol de Lisboa e dos ares do Tejo. Sim, porque Buoys é um disco feito da luz do início do dia e de alguns salpicos de água.

Buoys tem um início fortíssimo. As cinco primeiras faixas são de enorme beleza, delicadeza, emotivas como poucas no já interessante legado de Panda Bear. Os efeitos de água que vão pontuando “Dolphin” (gotas que marcam uma cadência que não nos sai do ouvido com facilidade e que vão ajudando a conferir ao título a credibilidade pretendida) conseguem produzir uma certa dolência em que sabe bem permanecer. E porque o que é aquoso tende a fluir, entramos nas canções seguintes (pois desta vez, mais do que em qualquer outra ocasião, é de canções que falamos) em perfeita harmonia com as anteriores, sem súbitas alterações e sem ruturas. Parecem ter sido feitas para permanecerem ligadas umas à outras. São quase um único organismo, e as “pinceladas de modernidade” a que Noah Lennox há muito nos habituou, são aqui bastante esbatidas (pequenas porções aquosas, como dissemos, mas também cirúrgicos raios laser, por exemplo), dando-se, assim, mais espaço às melodias simples, não se sentindo o incómodo que as camadas de som empilhadas umas nas outras muitas vezes provocam, privilegiando-se agora sons de guitarras acústicas (mesmo que, eventualmente, computadorizados) e a voz sempre muito presente de Lennox. Buoys tem uma luminosidade muito própria, primordial, idêntica ao fulgor crescente do nascer do dia.

Se as novidades são algumas (a chilena Dj Lizz e o português Dino D’ Santiago participam no álbum), as manipulações da voz têm igualmente lugar nesse processo de renovação. Estão, as vozes, mais in your face do que alguma vez estiveram, tendo em conta a discografia do músico. Por isso não há como não nos maravilharmos com “Cranked”, “Token”, “I Know I Don’t Know” ou “Master”, por exemplo. São perfeitos exemplares de simplicidade melódica e rítmica. São virais, e por isso mesmo também bastante contagiantes.

Buoys é, como se perceberá logo numa primeira e menos atenta audição, um autêntico striptease. Noah Lennox decidiu ver-se livre dos seus estratagemas antigos, das roupagens sobrepostas, das generosas fatias de sons que inundavam os seus trabalhos anteriores. Uma vez experimentada esta nova direção no rumo que pretendeu dar à sua obra discográfica, não valerá a pena apostar no que poderá vir a fazer num futuro próximo. Lennox não gosta de se repetir, como ele próprio já confessou inúmeras vezes, mas o interessante é também perceber que a identidade sonora a que nos foi habituando ao longo dos anos, ainda se mantém completamente percetível. E assim, por tudo isto, Buoys é um dos mais refrescantes discos deste início de 2019.