terça-feira, 18 de março de 2025

Belle & Sebastian – If You’re Feeling Sinister (1996)

 

Ao segundo disco, os Belle & Sebastian trazem-nos a melancolia das letras envolta em doces canções pop. Um álbum para consumir se estivermos a sentir-nos sinistros, ou em qualquer outra circunstância.

Os Belle & Sebastian lançaram o seu segundo álbum em Novembro de 1996, uns escassos cinco meses depois de se terem estreado com Tigermilk. Desta vez com uma editora por trás, a banda demorou sete dias a gravar as 10 canções que compõem If You’re Feeling Sinister, depois dos cinco dias de estúdio do disco de estreia.

Este segundo álbum dos Belle & Sebastian tem no título uma espécie de posologia: If You’re Feeling Sinister, ouça estas 10 canções durante os cerca de 40 minutos em que elas se estendem. Repita as vezes que forem necessárias. É quase possível imaginar a amiga de Stuart Murdoch, retratada na capa pelo próprio, a pousar a sua cópia d’O Processo, de Kafka, e testar a eficácia do tratamento. Quero acreditar que funciona, e que ela guarda o disco e a ele volta de vez em quando, porque, se me permitem um acrescento à bula, If You’re Feeling Sinister é um álbum que serve para qualquer estado de espírito, hora do dia ou condição meteorológica. Fica sempre bem.

É uma coleção de doces canções pop, no melhor sentido do termo. Arranjos leves e sem grandes pretensões, que apelam a um bater de pé ou a um discreto abanar de anca, com nuances que conferem a cada faixa dimensão e uma textura deliciosas e nos deixam a certeza de que nada foi deixado ao acaso. É sobre este intrincado pano de fundo que Stuart Murdoch nos conta as suas histórias melancólicas, numa aparente contradição com a jovialidade das melodias. O letrista atormentado proporciona-nos, em cada um dos extensos poemas cantados, um olhar claro para o interior da mente das personagens com que nos vamos cruzando, algumas tão palpáveis que têm direito a nome próprio, numa experiência quase cinematográfica. Digo aparente contradição porque, vendo bem, rapidamente percebemos que a conjunção inesperada faz todo o sentido e que as suaves melodias que ficam no ouvido só acrescentam substância à ironia dos poemas de Murdoch, sendo “If You’re Feeling Sinister”, a canção que dá nome ao disco, um brilhante exemplo disto mesmo: Hillary contempla o suicídio porque não sabe nunca o que dizer, já que os seus interesses envolvem sadomasoquismo e estudos bíblicos e isso não é “everyone’s cup of tea”. Tudo isto ao som de crianças a brincar e uma melodia bem-disposta. No refrão entoa-se alegremente a solução (que se revela pouco útil): “but if you are feeling sinister, go off and see a minister, he’ll try in vain to take away the pain of being a hopeless unbeliever”.

É um álbum que merece ser ouvido de uma ponta à outra. Sem que nenhuma seja igual à anterior, há em todas as canções a dose adequada de ironia e crítica e, claro, refrões que fazem querer juntarmo-nos às bonitas harmonias. Vejam-se as óptimas “Seeing Other People” ou “Dylan in the Movies”em que é dito a Lisa para, se for seguida, não olhar para trás, como o Dylan no cinema. A meio do álbum surge “The Fox In The Snow”, e tudo fica mais cru, mais calmo, como se a banda parasse para respirar antes de continuar. “Get Me Away From Here, I’m Dying” não demora a trazer de volta a vontade de dançar. Segue-se “If You’re Feeling Sinister”, já referida e, para mim, a melhor do álbum, e ainda “Mayfly”, antes de uma segunda belíssima respiração em “The Boy Done Wrong Again”O disco termina sem fugir à norma, com “Judy and the Dream of Horses”, outra canção agridoce porque Judy (ou Stuart?) só se sente verdadeiramente bem quando dorme e sonha com cavalos, mas tudo fica melhor quando faz disso uma canção.

1996 foi já há mais de duas décadas, mas dir-se-ia que o tempo não passou por If You’re Feeling Sinister, que continua a soar a promessa de que tudo fica melhor. O tratamento recomenda-se, façamo-lo mais vezes. Termino com o verso de “The Boy Done Wrong Again” em que Stuart Murdoch tão bem resume este meu disco de estimação: “All that I wanted was to sing the saddest songs, and if you would sing along I will be happy now”. And sing along we do!


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