quinta-feira, 27 de março de 2025

Zaho de Sagazan “La Symphonie das Éclairs”

 Revelada na edição de 2022 dos Trens Musicales de Rennes, a jovem autora e cantora francesa apresenta em “La Symphonie das Éclairs” um disco de canções pop que fogem ao apelo da moda e traduzem um corpo de vivências que cruzam outros tempos. 

A coisa aqui começa nos genes. O pai é artista plástico, com trabalho também feito na área da performance. A mãe é professora. A prima escreve e é também ecenadora. E a jovem Zaho de Sagazan, nascida há 23 anos em Saint Nazare, na região atlântica do Loire (França), mesmo tendo estudado gestão e encontrado primeiro emprego num lar de idosos, inevitavelmente acabou a encontrar uma forma de expressão. No seu caso, a música. Como tantos outros começou por apresentar versões. Editou um single em parceria com a dupla Vagabond em 2021, estreou-se a solo num outro single (igualmente digital) em 2022, e nesse mesmo ano deu por si a cativar atenções em dezembro do mesmo ano numa residência de cinco dias durante o Trans Musicales de Rennes (que pelos vistos continua a ser uma porta para revelações de peso),  rota que a conduziu ao lançamento de um álbum de estreia, “La Symphonie das Éclairs” que agora a confirma como um nome de proa na atual cena pop francesa.

O disco é uma agradável surpresa e tem na copa um perfeito ‘teaser’ face aos sons que depois em si encerra. Tal como outras grandes figuras femininas da história da música eletrónica, de uma Delia Derbyshire a uma Wendy Carlos, Zaho apresenta-se em frente a um arsenal de sintetizadores analógicos. Os botões e osciladores sugerem desde logo que há electrónicas em jogo, o que de facto acontece, desenhando uma pop que tanto é herdeira da elegância das electrónicas made in França das últimas décadas como, mais ainda, de um clima mais arrumado e sombrio de alma electro que aponta azimutes de referências a Berlim. Porém, ao escutar a música sentimos que esta pop eletrónica, que em nada mostra vontade em seguir os sabores populares do momento, está marcada por vivências pessoais de descoberta feiras entre clássicos da chanson em língua francesa, sobretudo um Brel e uma Barbara (a cantora preferida da sua mãe).

Ao invés dos caminhos mais luminosos (muitas vezes berrantes) de muita da pop atual – sobretudo nos caminhos mais descaracterizados do mais-do-mesmo – a música de Zaho de Sagazan, tal como a do belga Stromae, traduz ecos de um sentido de melancolia e um gosto em usar o texto com um peso maior na construção de canções que têm coisas para nos dizer. Seja ao refletir sobre género (como em “Les Garçons”), a pensar sobre o que é o amor em “Les Dormantes”, discorrer sobre a própria linguagem em “Langage” ou criar jogos de palavras (em “Aspiration”), Zaho de Sagazan transporta para a pop eletrónica que nos dá a ouvir em “La Symphonie das Éclairs” um sentido de relação de peso entre a palavra e a música como a chanson há muito inscreveu no âmago da melhor música popular francesa. Herdeira de todas estas linhas, mas filha do tempo presente, uma nova voz entra em cena e pede que a escutemos. Para já, a melhor surpresa que a pop revelou em 2023. 

“La Symphonie das Éclairs”, de Zaho de Sagazan, está disponível em LP, CD e nas plataformas numa edição da Virgin Records/Universall.





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