Criação de uma criança: o flash efêmero do hard rock do Texas
No início da década de 1970, o Texas fervilhava com uma cena de rock efervescente que absorvia a crueza do blues e a energia do hard rock emergente. Entre as muitas bandas que surgiram daquele viveiro sonoro, Corpus se destacou como uma joia passageira: uma banda com apenas um álbum, mas com um som poderoso o suficiente para deixar uma marca no circuito underground. Originário de Corpus Christi, Texas, esse grupo orgulhosamente carregava o nome de sua cidade natal e mergulhou no movimento psicodélico e hard rock que dominou a época. Embora sua existência tenha sido breve, eles conseguiram capturar a essência da transição entre o rugido dos anos sessenta e a força iminente dos anos setenta em seu único LP: Creation a Child (1971).
Psicodelia, blues e poder em doses exatas
Lançado em 1971 pelo selo Acorn, Creation a Child é uma prova sonora da liberdade criativa da época. Com um pé na psicodelia e o outro no hard rock, o álbum exibe uma instrumentação vibrante onde as guitarras rugem com fuzz e wah-wah, o baixo desenha linhas melódicas ousadas e a bateria bate com força e groove. As influências são claras: ecos de Cream, Blue Cheer e Grand Funk Railroad, mas com uma identidade única marcada pela voz rouca e apaixonada de Gilbert Peña e pelos riffs ardentes de Richard De Leon. Da explosiva faixa de abertura Cruising à introspectiva Joy, o álbum explora diferentes facetas da cena do rock da época sem perder coerência ou intensidade. O álbum passou despercebido na época, limitado pela distribuição de sua pequena gravadora, mas ao longo dos anos adquiriu status cult entre colecionadores e entusiastas do rock vintage. Sua raridade e qualidade inegável fizeram dela uma dessas joias escondidas que somente os exploradores musicais mais dedicados descobrem em sua jornada. Corpus pode ter sido apenas um fenômeno passageiro na história do rock do Texas, mas Creation a Child ainda brilha como uma cápsula sonora de uma era em que o rock estava se expandindo sem medo ou limites.
Impressões pessoais: o eco de uma descoberta indelével
A poeira dançava no ar, capturada pelos raios de luz que penetravam pelas frestas daquela velha tenda-pira. Não foi a primeira vez que me vi ali, imerso no ritual de vasculhar CDs e fitas cassete empoeirados, esperando pelo momento em que uma capa desconhecida me encararia e sussurraria algo que só eu pudesse ouvir. Assim surgiu Creation a Child , envolto em tons psicodélicos, com um ar enigmático que prometia eflúvios lisérgicos e guitarras ardentes.
Lembro-me de segurar o disco por alguns momentos, pesando-o como alguém avaliando o peso de uma decisão. Eu não tinha referências anteriores, nenhum nome chique para sustentar isso, apenas instinto e aquela estranha sensação de que aquele álbum pertencia a mim antes mesmo de eu ouvi-lo. Levei-o comigo sem hesitar. E eu não estava errado. O disco começou a girar imediatamente no prato e eu sabia que aquele som ficaria comigo para sempre. Cruising abriu a sessão com uma energia vibrante, um convite para viajar, mas o que veio depois me pegou de surpresa. Não era só psicodelia pesada que estava escondida naqueles "grooves"; Havia algo mais, uma espécie de doçura inesperada, um flerte com o bucólico, com o folk tingido de um rosa pastel que contrastava com os rugidos da guitarra. Not Mine começou e de repente fui transportado de volta no tempo, para dias de compras frenéticas, psicodelia flutuando no ar e fumaça azul em cada canto.
Há álbuns que nos impactam pelo seu virtuosismo, pela sua produção extraordinária ou pela história que os cerca. Mas há outras, mais furtivas, que ficam na nossa memória por razões que vão além da música . A Criação de uma Criança é uma delas. Não é o álbum mais pesado de sua época, nem o mais inovador, mas tem algo que poucos conseguem: soul. Cada audição é um portal para aqueles dias de exploração sonora, quando qualquer descoberta poderia ser o início de uma nova obsessão. A nostalgia aqui supera a performance do álbum em si, e a cada acorde de We Can Make It, Luv , sou atingido pela certeza de que este disco sempre será um refúgio. É um pastiche de emoções, um vai e vem entre o poder do hard rock e o calor do folk açucarado. Pode não ser um gigante do gênero, mas nunca afirmou ser. É o que é: um testemunho honesto de seu tempo, uma pequena e despretensiosa joia, com a quantidade certa de eletricidade e cor. O álbum abre com um estrondo e termina com um sussurro, como se no final da jornada restasse apenas o eco de sua própria existência. E quando a agulha sobe e o silêncio retorna, a sensação é clara: não importa quantas vezes você ouça, Creation a Child ainda soará como a primeira vez. Até mais.
03. Marriage
04. Creation A Child
05. Just A Man
06. We Can Make It, Luv
07. Not Mine
08. Where Is She?
09. Mythical Dream
CODIGO: @

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