terça-feira, 30 de dezembro de 2025

CRONICA - THE PETS | The Pets (1968)

 

No final da década de 1960, a Venezuela vivenciava uma explosão cultural. Caracas, impulsionada pela riqueza do petróleo, viu surgir prédios, clubes, festivais estudantis e lojas de discos que importavam compactos dos Beatles, dos Rolling Stones, dos Yardbirds e da música soul americana. A juventude urbana, conectada ao mundo através das ondas de rádio e das capas de álbuns multicoloridas vindas dos Estados Unidos, desenvolveu um apetite voraz por tudo que tivesse som distorcido, crepitante e com ruídos.

Nesse clima de modernização acelerada, relativa liberdade e imitação criativa, grupos de adolescentes com cabelos compridos, amplificadores mal ajustados e sonhos importados de Londres ou Los Angeles estão se multiplicando.

Foi em meio a essa cena vibrante que surgiu The Pets, um grupo tão anônimo quanto efêmero, cuja história permanece envolta em mistério até hoje. Diz-se que inicialmente se chamavam The Playboys e que eram originários de Los Teques, a cerca de trinta quilômetros ao sul de Caracas.

Eram cinco? Eram quatro? As fontes divergem. Sabe-se que o grupo incluía pelo menos dois cantores, Giacomo e Victor Jimenez. Tocavam instrumentos? Nada é certo. Trino Jiménez também é mencionado, embora ninguém possa afirmar com certeza qual instrumento ele tocava.

Em 1968, os Pet Shop Boys gravaram um único álbum homônimo para a gravadora Discomoda. A capa, de uma franqueza revigorante, reflete perfeitamente a banda: crua, direta e profundamente enraizada em sua época. Ela retrata uma jovem de jeans, sentada em um colchão no chão, sem fumar cigarros Gitanes, com o olhar perdido em pensamentos perto de um pôster hindu que retrata a busca pelo karma. Uma estética quintessencial de 1968, uma mistura de boemia, psicodelia e libertação sexual.

Musicalmente, porém, este álbum exala ingenuidade, inocência e um abandono despreocupado, bem distante de experiências psicodélicas. Cada riff, cada ritmo, cada refrão soa como uma explosão de energia juvenil: às vezes desajeitada, frequentemente eufórica, mas sempre transbordando entusiasmo ingênuo. Ouvimos uma banda que não busca sofisticação, mas a pura alegria de tocar. O álbum se torna, assim, um testemunho vivo de uma era em que o rock ainda era um parque de diversões, quando amplificadores distorcidos não eram ferramentas de produção, mas instrumentos de liberdade e expressão pura.

Paradoxalmente, 1967 marcou um ponto de virada para o pop sul-americano. Até então, os grupos latino-americanos simplesmente copiavam sucessos ingleses, dos Beatles aos Rolling Stones, muitas vezes traduzidos para o espanhol. Mas o continente começava a encontrar sua própria voz, a forjar um som próprio. Nesse contexto, os Pet Shop Boys, em 1968, foram uma exceção à regra. Embora certamente fizessem covers de sucessos ingleses e americanos da época, eles os adaptavam com seu próprio estilo, em espanhol, misturando energia juvenil com uma atitude tipicamente caribenha e despreocupada.

No entanto, The Pets fazem um esforço notável ao apresentar quatro composições originais. Duas foram escritas pela própria banda, abrindo e fechando o álbum, enquanto as outras duas foram cedidas por compositores venezuelanos. Essa escolha demonstra que, além das versões cover e da espontaneidade juvenil, o grupo também buscava afirmar sua própria identidade musical, deixar sua marca em meio a essa enxurrada de standards importados.

O LP abre com “No Lo Hagas Tan Difícil”, uma canção pop vibrante e cheia de energia. Apresenta uma mistura eufórica de folk com guitarras generosas e rhythm & blues psicodélico, entrelaçando melodias dos Beatles e harmonias vocais dos Beach Boys. A faixa transborda vitalidade juvenil, transportando o ouvinte para uma atmosfera que é ao mesmo tempo familiar e profundamente enraizada no local. A canção é pontuada por uma breve sequência bucólica, onde a banda, sem querer, remete aos primórdios do rock progressivo, adicionando um toque inesperado e quase visionário a essa abertura febril e cintilante.

No centro, encontramos “Una Como Ella”, uma balada estranha e onírica, como se suspensa numa leve névoa psicodélica. Mas acima de tudo, está “El Entierro De Un Hombre Rico Que Murió De Hambre”, lançada como single, uma faixa de rhythm and blues envolvente, revigorante e irresistivelmente cativante. O órgão hipnótico cria uma base perturbadora e sombria, enquanto uma guitarra fuzz esquizofrênica libera sua fúria sobre um vocal furioso, conferindo à música uma intensidade quase visceral.

O álbum termina com “En El Verano”, uma faixa sobre uma festa no centro de Caracas. Uma verdadeira avalanche de instrumentos de sopro irrompe em frenesi, oscilando entre o soul vibrante e o ritmo mariachi, para um final festivo e extravagante.

O restante do álbum consiste inteiramente em covers, que certamente não pretendem igualar as versões originais, mas se mostram incrivelmente envolventes graças a uma potente distorção garageira e uma seção rítmica imparável. No meio, um órgão caleidoscópico cria a atmosfera, enquanto vocais cativantes infundem cada faixa com uma vitalidade elétrica e contagiante.

Assim, "Este Es El Fin" ("Jumpin' Jack Flash") dos Rolling Stones impacta desde o início. "Hello, I Love You" dos Doors é vibrante e animada, como se tivesse sido inflada com hélio. "Algo Que Es Amor", de Paul Kaufman, encanta com sua delicadeza, enquanto "Si Tú Quisieras", de Tim Hardin, é carregada de emoção. "Revolución", dos Beatles, assume uma pegada mais rock and roll, "Toma La Guitarra", de Roger Cook, flerta com o som dos Byrds, e "La Pobreza", de Renato Barros, oscila entre a elegância da bossa nova e o jazz lânguido. Já "Si Te Hablaran De Mí", de Charlie Chaplin e Giorgio Calabrese, é uma balada de um cantor latino desesperado, perfeita para conquistar as garotas no baile de sábado à noite.

Um álbum que não é revolucionário, mas que permanece um testemunho precioso de uma época em que tudo mudou.

Títulos:
1. No Lo Hagas Tan Dificil  
2. Si Te Hablaran De Mi      
3. Este Es El Fin        
4. El Entierro De Un Hombre Rico Que Murio De Hambre
5. Algo Que Es Amor
6. Hello I Love You  
7. Si Tu Quisieras     
8. Una Como Ella     
9. Revolución
10. Toma La Guitarra
11. La Pobreza          
12. En El Verano

Músicos:
Giacomo Tunzi: Vocais,?
Víctor Jiménez: Vocais, ?
Trino Jiménez: ?
? : Bateria, Baixo, Órgão, Guitarra

Produção: Os Bichos de Estimação




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