Clannad foi uma banda irlandesa formada em 1970, no povoado Gaoth Dobhair (Gweedore, em inglês), Condado de Donegal (o mesmo de onde também surgiu Rory Gallagher), na República da Irlanda (antigo Eire, que ocupa a maior parte da ilha da Irlanda e cuja capital é Dublin, mesma origem do U2 - lembrando que a ilha ainda abriga a Irlanda do Norte, de soberania do Reino Unido, cuja capital é Belfast). Começaram como um grupo Folk acústico tocando principalmente canções tradicionais irlandesas (cantadas em irlandês), mas expandiram seu som com canções originais em inglês, harmonias vocais, teclados eletrônicos e elementos de Rock, Celta, New Age, Smooth Jazz e canto gregoriano, tendo ganhado vários prêmios ao longo da carreira. Vamos contar o início dessa história hoje. O Clannad foi formado pelos irmãos Ciarán, Pól e Moya Ui Bhraonáin (em inglês, Brennan) e seus tios gêmeos Noel e Pádraig Ó Dúgáin (em inglês, Duggan). Eles cresceram em Dore, uma vila próxima do já pequeno povoado de Gweedore, no noroeste da Irlanda (parte da ilha mais voltada para a Islandia). Ali, região bem remota, o irlandês sempre foi a língua mais falada. Foram criados numa família católica de músicos. A mãe dos Brennans era professora de música, o pai tocava sax e acordeon (também membro de uma banda).
Em 1968, eles compraram, restauraram e passaram a administrar um bar chamado "Leo's Tavern", onde os filhos acabaram desenvolvendo uma banda da casa com Ciarán no baixo / violão / piano / vocais, Pól na flauta / bongôs / violão / vocais, Pádraig e Noel nos violões / bandolim / vocais e Moya (Máire, em inglês) na harpa / vocais principais. Autodenominaram-se "Clann as Dobhar" ("Family from Dore", em inglês), nome que usariam até 73 quando o encurtariam para apenas "Clannad". Eram um grupo Folk acústico, que coletava material de antigos cantores e contadores de histórias de Donegal, que construía repertório centrado em canções tradicionais irlandesas, rearranjadas num estilo contemporâneo para uma banda completa. Essa abordagem atraiu rejeições a princípio, porque a língua irlandesa era muito associada à pobreza, mas eles insistiram. Também escreveram material original e acrescentaram covers de canções dos Beatles, Rolling Stones e Joni Mitchell. Em 1973, os cinco jovens músicos tentaram uma competição local (em Letterkenny, a maior cidade do condado) num festival de música da juventude. Eles ganharam a competição. Além de dinheiro e troféu, conquistaram um contrato de gravação com a Polydor Records (embora fossem jovens demais para assiná-lo).
O álbum de estreia foi gravado no Eamonn Andrews Studios, em Dublin. Enquanto a contraparte das ilhas britânicas para o Folk-Rock americano surgiu (pense Fairport Convention, Pentangle etc.) cantando em alguma variante do inglês (novo ou antigo), o Clannad saído deste remoto condado de Donegal, num esquema totalmente familiar, absorveu atentamente esses sons, porém gestou o seu próprio. Esse estilo idiossincrático era baseado, em grande parte, no uso do gaélico nativo, na maior parte do repertório. A gravadora ficou perplexa com a preponderância de letras não inglesas. Isso atrasou o lançamento do álbum. "Clannad" era um álbum incomum, soando como um cânone musical de uma raça. Notáveis as incursões ao Jazz Folk, as estruturas Folk celtas, a ausência total de violinos (um aspecto a distanciá-los da maioria de bandas de Folk tradicional) com a flauta e a harpa conduzindo as melodias e a preferência por tempos lentos ostentando motivos delicados com pausas (tudo muito elegante e doce, ao contrário do lugar-comum dos tradicionais jigs & reels tocados em velocidades alucinantes para impressionar). Ao longo dos anos, este álbum foi adquirindo um grande prestígio (em seu lançamento, em 73, a música celta ainda não havia alcançado popularidade mundial). Claro, não se tratou de um trabalho de Rock Progressivo. Basicamente, era música Folk irlandesa celta (cantado inteiramente em irlandês) com algumas modernizações elétricas. Um dos melhores álbuns do grupo, que retrata como a banda soava no início, com toda autenticidade e colocando todo coração/alma na música. Logo, eles se viram mais populares fora da própria Irlanda, particularmente na Alemanha. Em 75, surgiu o segundo álbum, "Clannad 2", com ótima produção, execução divina, harmonias vocais assombrosas, mantendo as melodias requintadas (amplamente distantes da coisa estereotipada / soporífera dos instrumentais a violinos e baladas melodramáticas). Foi um novo marco para a música celta a nível de mundo. A música continuava essencialmente acústica, mas agora eles agregavam músicos adicionais (vocais, guitarras, teclados, bateria etc.). A maioria dos vocais ainda era em gaélico e a música ainda era folclore irlandês / celta puro, impregnada de tradições, apenas com certas modernizações Folk-Rock.
O álbum seguinte, "Dúlamán" (tradução: alga marinha), de 1976, gravado no Rockfield Studios, no País de Gales, primeiro sob produção de Nicky Ryan (que se tornaria empresário deles junto com a esposa), capitalizou sobre a crescente popularidade na Europa e os levou a um estrelato inédito. À beira de embarcar numa carreira musical profissional, este terceiro álbum do Clannad combinou os melhores aspectos dos trabalhos anteriores borbulhando uma alquimia de arranjos de canções folclóricas como nunca vista antes ou depois. Aspectos jazzísticos da estreia reaparecem, porém muito mais integrados ao todo. Ao longo da audição, o ouvinte era recompensado com faixas impressionantes (e certos efeitos elétricos modernos, com engenharia e produção refinadas), numa espécie de ápice não só da carreira inicial do Clannad, mas de todo o movimento Folk irlandês até ali (entenda: a música aqui dificilmente pode ser classificada como Prog Folk, afinal é essencialmente Folk irlandês). Canções tradicionais somadas a outras autorais, cada uma trabalhada com amor e um cuidado que tornaram o som do Clannad tão inebriante. A canção título (cantada em gaélico) era baseada numa famosa canção tradicional irlandesa sobre as pessoas que costumavam coletar algas marinhas para evitar a fome. Vocais à cappella, instrumentos folclóricos, envolvimento e crescendos, flauta, percussão. "Cumha Eoghain Rua Uí Neeill" era uma faixa instrumental (com bastante flauta e bandolim) lenta que homenageava um grande líder militar da rebelião irlandesa da década de 1640. "Two Sisters" era outra que vinha de uma antiga canção folclórica inglesa tratando do ciúmes de um homem. Começa só com os vocais e vai ganhando instrumentos e ritmo. "Éirigh Suas A Stóirín" era sobre o amor em vão (tema comum na música tradicional irlandesa). Um pretendente apaixonado tentava conquistar os pais de uma garota, mas era recusado e a letra lidava com o sentimento dele. Vocais, violão acústico, baixo. "The Galtee Hunt" era uma canção de dança irlandesa, toda instrumental com a harpa e a flauta fazendo um dueto. Guitarra e baixo entravam depois para dar mais força. "Éirigh Is Cuir Ort Do Chuid Éadaigh" era outra faixa baseada numa canção antiga folclórica com adaptações. Outra história de amor não correspondido, desta vez contada do ponto de vista feminino. "Siúil A Rún" era um lamento que vinha dos tempos da "Brigada Irlandesa", composta por jovens que deixavam o país para servir o exército francês, cantado do ponto de vista de uma jovem que sentia falta de seu amante. Vocais e violões. "Mo Mháire" era mais animada, com toque familiar, com ritmo acentuado. "DTigeas A Damhsa" era uma canção da dança infantil bem curta e "Cucanandy/The Jug Of Brown Ale" combinava dois instrumentais irlandeses entrelaçados por uma curta frase em gaélico. Aqui, tínhamos o Clannad ainda totalmente Folk e fiel ao som irlandês de raiz.
"Dúlamán" foi o álbum perfeito, sincero em relação ao verdadeiro Folk. Foi antes da adição de elementos Pop que tornaria a banda muito mais bem-sucedida, às vezes em benefício da música, em outras em seu detrimento. A banda se profissionalizou e fez turnês pela Europa/América do Norte. Em 1980, o Clannad se tornou um sexteto quando Nicky Ryan convidou uma irmã mais nova de Brennan, Enya (Eithne Pádraigín Ní Bhraonáin), para se juntar como cantora e tecladista, a fim de expandir o som do grupo. "Crann Ull" (tradução: macieira) trouxe as primeiras gravações de Enya com a banda. "Fuaim" (de 82) expandiu experimentos com instrumentos eletrônicos e Enya tornou-se destaque nos vocais.
Entretanto, apesar das tentativas de Nicky Ryan de orientar o Clannad para uma direção mais em camadas, com eletrônica e forte produção, ele sentiu que a banda mantinha a tendência de retornar ao seu estilo original Folk. Após discussões, os Ryans renunciaram ao cargo de empresários do grupo e Enya, sentindo-se restrita, partiu com eles para seguir uma carreira solo (na qual se tornaria a artista solo irlandesa de maiores vendas na história e a segunda em vendas, se você considerar a banda de Rock U2). Até "Crann Ull", a música do Clannad foi principalmente Folk tradicional cantado em gaélico. Entre "Magical Ring" (83) e "Anam" (90), o som passou a ser descrito como "ambient" e/ou "New Age" pelo destaque ao lado eletrônico, embora ainda seguindo a tradição celta (mas os vocais são em inglês e os arranjos são mais Proggy do que Folky). De "Banba" (93) para frente, há o declínio. "Dúlamán" é, sem dúvida, o melhor álbum deles da era Folk, a quintessência da arte Folk certa tradicional do Clannad. Sua influência em vários outros artistas/grupos do Rock Progressivo foi relevante.








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