sexta-feira, 9 de setembro de 2022

POEMAS CANTADOS POR SÉRGIO GODINHO

Chave de Vidro

Sérgio Godinho


Luar de Agosto

quem queimará

chave de vidro

em que porta partirá

luz de Setembro

quem cegará

comboio azul

em que estação parará


Longe da vista

longe do brinquedo

que o poeta chamou então

o coração


Pobre do coração

sempre aceso e sem sequer poder

carregar no botão

mudar de canal cortar o som

e olhar como quem quer olhar

enredos simples de paixão

tudo no seu lugar

e o coração, enfim, meu Deus

a bater e a descansar


Chuva de Inverno

quem banhará

chave de vidro

em que porta partirá

sol de Dezembro

quem secará

um de Janeiro

com que pé se entrará


Longe da vista ... etc.

Pobre do coração ... etc.


Luar de Agosto

quem lembrará

chave de vidro

em que porta partirá

praia deserta

quem esconderá

corpo dorido

que disfarce usará


Longe da vista ... etc.

Pobre do coração ... etc.


Chuvas de Cabo Verde

Sérgio Godinho


Há quantos meses não chove

parece que nove

parece que nove

se chover nos três que resta

parece que há festa

parece que há festa


Beleza de Cabo Verde

não se vê do avião

país que é novo tem sede

do que faz fazer o pão

este socalco foi milho

e aquelas pedras, feijão

ensinava a mãe ao filho

repete o filho ao irmão


Há quantos meses não chove...etc


Beleza de Cabo Verde

está na maneira de olhar

árvore que tinha sede

foi-se também emigrar

nela encostado, o emigrante

trinca do fruto da morna

não há nenhum que não cante

a vez em que à terra torna


Beleza de Cabo Verde

está na razão de cantar

música não mata a sede

mas se pudesse matar

com água por melodia

e por batuque irrigado


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