No último disco dos Sereias há um estilo que se aguenta homogéneo, mas há uma evolução. Um instrumental talvez mais limpo, ao mesmo tempo mais pesado, ao mesmo tempo mais jazz, definitivamente mais krautrock, menos caos, menos destruição, a mesma desolação na poesia e voz de António Pedro Ribeiro.
É indesmentível que no artigo sobre O País a Arder, o primeiro álbum dos Sereias, divaguei um pouco, então combinei com os astros que agora não iria divagar de todo, ou talvez apenas divagar pouco, ou melhor, menos, ou pelo menos iria escrever pouco, ou ser mais concreto, directo ao ponto, falar menos de mim e mais da banda, mas como falar sobre música sem que falar de como ela me atinge, ela me fere, ela me…?, merda, já estou a divagar de novo.
Já sobre o segundo álbum da banda, Sereias, que há a dizer? Que há um estilo que se aguenta homogéneo, mas há uma evolução. Um instrumental talvez mais limpo, ao mesmo tempo mais pesado, ao mesmo tempo mais jazz, definitivamente mais krautrock, ritmos mais cadenciados, isso, cadências mais tribais (?), menos caos, menos destruição. A isto junta-se a poesia atormentada e a voz psicótica de António Pedro Ribeiro.
Segundo o texto de Adolfo Luxúria Canibal que acompanha o álbum, uma voz “ora gritada ora murmurada ora declamada, ora colérica ora depressiva, e a sua poesia bruta, de poeta de café em invectivas contra o mundo ou em lamentações existenciais. Mas contrariamente a O País A Arder, o disco de estreia, há aqui menos palavras de ordem sonantes (…) e um maior desespero face ao mundo, com as ambiências musicais a ganharem um protagonismo e um espaço inesperado (…) e as ladainhas recitadas a serem repetidas uma e outra vez, a sublinhar a sensação de perda e o tom melancólico e angustiado que percorre todo o disco.” Não poderia escrevê-lo melhor. António Pedro Ribeiro não é um vocalista normal, não é um frontman normal, e ainda bem. Mas talvez quisesse ser uma pessoa normal, e tão-pouco o é. É alguém que sofre e que não tem vergonha em dizê-lo, é alguém que não se coíbe em admitir “Ela vem, volta sempre, a depressão”. É também por isso que é angustiante ouvir este álbum,
de tão cru e tormentoso que é. Há quem diga que a música não deve ser apenas para abanar o rabo.
Ao vivo tudo é mais especial. Os músicos improvisam sobre uma base mais ou menos definida e o António vai declamando a sua raiva e as suas lamúrias sem uma ordem estabelecida, fazendo de cada concerto uma experiência única. Eles estarão no festival OUTFEST no dia 7 de Outubro, um festival que não é uma Disneylândia patrocinada por uma operadora de telecomunicações ou a marca de uma cerveja, o que hoje em dia é raro, sim estou a falar com vocês.
Entre mãos O copo A bebida Palavra batida Ritmos moldam O gesto O corpo A imagem Tua voz Tua presença Miragem Entre dedos O cigarro O pranto Procuro talento O teu encanto Teu nome Minha fome Tua ausência Minha demência Tanto tempo À procura Tanto tempo Loucura Teus lábios Vinho sangue desejo Tanto tempo Quem és hoje Tanto tempo Quem és hoje Maria Tanto tempo Quem és hoje Sofia Tanto tempo Quem és hoje Maria
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