Autofiction é um dos discos mais musculados dos Suede, que soam agora tão urgentes como nos momentos áureos. Há aqui e ali ecos de Joy Division ou The Cult (!), as teclas e camadas eletrónicas dão lugar a uma segunda guitarra, mas tudo é relevante, bom e coeso, em mais uma etapa bem-sucedida no livro que o grupo tem escrito dedicado à arte de saber envelhecer.
Ao quarto disco de originais desta segunda vida, e nono no total, já nada têm os Suede a provar: o regresso tem sido feito de bons trabalhos e em palco a banda está melhor que nunca. Que o radar ‘mainstream’ de novidades não incorpore os Suede nos destaques não é problema para os fãs, que voltam a encontrar em Autofiction um belo disco.
Brett Anderson já havia anunciado o trabalho como o mais direto do grupo, e não mentiu: Autofiction é quase punk algumas vezes, é rock rasgadinho muitas vezes, é negro e quase não nos deixa respirar – a meio há uma exceção, “Drive Myself Home”, onde o piano de Neil Codling guia a voz de Anderson. É um grande momento.
A segunda metade do disco é impactante: “It’s Always The Quiet Ones”, “Turn Off Your Brain And Yell” e, especialmente, “What Am I Without You”, são clássicos imediatos, momentos de rock dançante que, de tão frescos e vivos que são, e ouvidos sem enquadramento e com uma voz menos identificável, poderiam pertencer a uma qualquer nova banda cheia de testosterona.
O começo de Autofiction é também um tratado de elegância de bom gosto. Há temas vertiginosos (“15 Again” ou “Shadow Self”), um ou outro mais contemplativo (“She Still Leads Me On” à cabeça), mas um todo que vence e convence.
Autofiction vê os Suede pegar no seu passado e a contextualizá-lo, num mundo cada vez mais nervoso, denso e incerto. Não há margem para os ‘la la las’ de meados dos 1990 – de “Coming Up” em concreto” – nem para o experimentalismo eletrónico de “Head Music” ou de outros momentos pontuais. Há rock em esteroides, energia, as influências mais aceleradas transpostas para primeiro plano em mais um triunfo total.
Os Suede de 2022 não soam bem aos Suede que conhecíamos: primeiro estranhamos a mudança, depois entranhamo-la.
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