Serpentine Prison é um belo exercício solo que prova que Berninger pode aguentar uma carreira sem os seus cúmplices.
Com os anos, ganhei um hábito que pode muito bem ser entendido como um vício que não consigo largar: quando escrevo, ouço uma canção uma e outra vez, e outra vez novamente, durante o tempo que me leva a completar a tarefa. Ora, isto não seria problemático se eu escolhesse músicas e autores ao acaso antes de carregar no play, mas a verdade é que descobri que funciono melhor se reduzir drasticamente as opções a duas ou três bandas ou cantautores – e a uma canção por ano.
Os The National são uma dessas bandas: assim que a música arranca, encaixo no ritmo e o processo descomplica-se ao som da bateria metronómica de Bryan Devendorf e da voz hipnótica de Matt Berninger. Experimentem, vão gostar.
Bom, à falta de novidades dos The National, remediei-me em 2021 com o que havia: um álbum a solo do seu vocalista chamado Serpentine Prison lançado em outubro do ano passado. A primeira impressão não foi espectacular, pois Berninger soou-me estranho sem a carga épica e dramática da banda norte-americana, autora de vários hinos irresistíveis do indie rock.
Só que, aos bocadinhos, Serpentine Prison transformou-se num bom álbum em tom intimista. Sim, é verdade, o som dos The National paira sobre várias canções, e sim, é verdade, Berninger também não parece fazer muita questão em distanciar-se desse ambiente sonoro nem temático – a ansiedade, a depressão e a solidão estão sempre presentes.
Serpentine Prison é um bonito e charmoso exercício solo, prova de que Berninger consegue aguentar uma carreira sem os seus cúmplices, sustentando-se no seu carisma anti-herói e num timbre inimitável. O álbum tem dois três temas extraordinários dos quais escolho apenas um para não vos maçar. É “One More Second”, e é obviamente a canção que mais escutei em 2021.
A história da canção é a de sempre (Matt a pedir desculpas por alguma coisa que fez) e a forma como esta é trabalhada é vintage The National (acrescentam-se pozinhos, aumentando a tensão até ao clímax); o que difere é uma linha de órgão hammond simples, elegante e inesperada que nos obriga a levantar e dançar no escuro de uma sala.
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