quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

Por que os Iron Maiden não gravam mais covers?

 

É unânime! Quando se fala dos singles lançados pelo Iron Maiden, principalmente nos anos 80, os covers de seus lados B são sempre lembrados com muito carinho. Na época os singles eram muito mais importantes para as bandas porque tinham o objetivo de promover um álbum novo. O single servia sempre como um aperitivo do disco completo e muita gente os comprava para se decidir se iriam adquirir o álbum ou não. Desde aquela época também eram itens muito procurados pelos colecionadores, principalmente os discos do Maiden com as tão famosas capas com o Eddie.

Contracapa de The Trooper

Não será necessário para esse texto descrever um a um os covers que foram lançados naquela época, esse não é o objetivo, até porque sei que eu acabaria escrevendo mais do que o necessário, mas é impossível não se lembrar de alguns para ilustrar melhor do que estamos falando. Quem nunca ouviu, ou até mesmo falou, que conheceu o Jethro Tull por conta da regravação de “Cross Eyed Mary”, lado B para o single de “The Trooper”? Esse é, ao meu ver o cover, mais conhecido, mas tivemos muitas outras bandas como o Thin Lizzy, Nektar, Led Zeppelin, Golden Earring, Free e as mais desconhecidas Beckett e FM, que acabaram também “contribuindo” com esse repertório. Para quem ainda não sabe sobre o que estou falando sugiro ouvir a coletânea Best of the B’Sides, que saiu na caixa Eddie’s Archives em 2002.

O primeiro cover apareceu no lançamento de 12” do single de “Sanctuary”. Enquanto a edição em 7” tinha apenas “Drifter” ao vivo, no de 12” vinha, também em uma versão ao vivo, “I’ve Got the Fire” da banda Montrose tirada de seu álbum Paper Money de 1974. A mesma música saiu no single de “Flight of Icarus”, dessa vez em uma versão de estúdio e já com Bruce Dickinson nos vocais. E o Montrose teve uma segunda música regravada, “Space Station #5”, que saiu no single de “Be Quick Or Be Dead”. Também temos que lembrar que um cover, no caso “Women in Uniform”, música de um obscuro grupo australiano chamado Skyhooks, já foi música principal de um single do Iron Maiden, sendo até clipe. A curiosidade fica pelo fato de Steve Harris ter concordado gravar a música bastante contrariado, mas acabou aceitando a sugestão de um membro da gravadora. O resultado foi tão insatisfatório, pelos critérios de Steve Harris, que no fim das contas a pessoa que sugeriu essa música acabou sendo demitida.

Alguns dos lados B também serviram para dar publicidade a algumas músicas que foram feitas mais por diversão e não caberiam em um álbum. A banda sempre tratou seus lançamentos com muita seriedade e uma brincadeira como em “Sherrif of Huddersfield”, que tem até um arroto em seu início, não seria adequada. Para quem não conhece trata-se de uma espécie de paródia com a faixa “Life In The City” do Urchin, ex-banda de Adrian Smith, tratando da maneira que Rod Smallwood, o famoso empresário deles, conduzia os destinos da banda. Outras como essa podem ser citadas como “Black Bart Blues” e “Roll Over Vic Vella”, também uma paródia de uma música do Chuck Berry – “Roll Over Beethoven”, mas agora brincando com um motorista que trabalhava há anos para eles. E só para registrar tivemos alguns lados B com faixa que eles decidiram que não entrariam nos discos por questão de espaço, ou algum outro motivo, como “Burning Ambition”, lado B de “Running Free” e Total Eclipse, lado B de “Run to the Hills”.

Capa de Women in Uniform

Já com o Blaze Bayley “My Generation” do The Who e “Doctor Doctor” do UFO saíram juntos em um mesmo single, no caso na primeira parte do single para “Virus”. Depois disso a última vez que tivemos um cover foi no single de “Different World” em que entrou uma versão divertida de “Hocus Pocus” do Focus. A faixa é instrumental mas tem a voz de Nicko McBrain fazendo as marcações. Desde a volta de Bruce Dickinson no máximo versões ao vivo de alguma música do próprio Iron Maiden passaram a ser usadas.

Mas até agora eu não entrei no mérito para tentar responder a pergunta que fiz logo no título do texto: “Por que o Iron Maiden não grava mais covers?”. Em um primeiro momento lembremos que nenhum cover nunca entrou em um disco oficial. Em seguida deve-se lembrar que praticamente também não há mais singles. O último lançado em um formato característico de single foi o já citado “Different World”. Quando The Final Frontier saiu em 2010 “El Dorado” veio como um single digital, ou seja, não existia um lado B. Existem, porém, cópias de “El Dorado” circulando por aí sendo tratadas como single, até mesmo por colecionadores, mas são promos e não singles. Aliás para esse disco tem promos também para a faixa título e “Coming Home” todas elas com apenas uma faixa no CD.

Contracapa de From Here to Eternity

Sabemos que o dia a dia de uma banda tão grande quanto o Iron Maiden não é mais aquele ambiente de amizade que normalmente existe em bandas menores ou em inícios de carreiras. A convivência praticamente intermitente dessas pessoas proporciona uma maior interação. Há muitos anos a convivência entre os integrantes do Iron Maiden se resume aos vôos entre um show e outro, o turismo que alguns fazem em conjunto, nunca todos ao mesmo tempo, o tempo de ensaio antes das turnês e, claro, o tempo que passam no palco. Mesmos os ensaios, ao meu ver, são praticamente protocolares e servem muito mais para definir o roteiro dos shows da próxima turnê do que para acertar alguma música. Isso também explica o fato de pouco se mudar os repertórios dos shows de uma turnê para outra. Vocês acham mesmo que eles vão ficar horas e horas juntos lembrando de todas as passagens e se entrosando para tocar a tão pedida “Alexander the Great”? Inclusive quando procurei uma foto deles em estúdio para ilustrar esse texto foi difícil achar uma que aparecia a banda toda. Com tão pouco tempo juntos dificilmente sairia uma proposta para tirar esse ou aquele outro clássico de alguma banda preferida, imagina então de uma banda obscura. E lembrem-se, nem mesmo em uma mesma cidade ou mesmo país eles moram atualmente. Algum leitor pode falar que eles ficam juntos quando estão gravando os álbuns. Será mesmo? Hoje há diversas maneiras de se gravar um disco a distância, mesmo que no caso do Iron Maiden isso não aconteça. Tudo é gravado dentro de um mesmo estúdio, mas não necessariamente com todos os integrantes ao mesmo tempo. As músicas são compostas no privado ou no máximo em parceria de dois dos músicos e distribuídos para todos. Quando eles chegam no estúdio já sabem o que tem de fazer em cada uma delas.

Outro fator, e talvez o mais importante, é a questão econômica. Quando disse que os singles praticamente nem existem mais na discografia da banda não comentei, mas eles não entendem mais que os singles sejam necessários. Os singles teriam perdido a função prática de sua existência. Com os downloads ninguém mais espera um single para ter uma ideia do que vai encontrar em um novo álbum. Em poucas horas após o lançamento de um novo registro todas as músicas estão disponíveis na internet. Assim não haveria motivo para oficializar um single.

Material promocional de Speed of Light

Já falei sobre os promos do álbum The Final Frontier, e no caso de The Book of Souls dois outros lançamentos acompanharam o disco: “Speed of Light” e “Empire of the Clouds”. O primeiro saiu por conta de uma parceria com a rede americana de lojas Best Buy. O CD saiu dentro de uma caixa, apenas com a música em questão, que era acompanhada de uma camiseta. Nem mesmo uma capa ou imagem especial foi criada para essa caixa, sendo este um dos motivos para eu não o considerar como um single. Já para a mais longa faixa da banda em sua história, o LP de “Empire of Clouds” foi a única participação do Iron Maiden na já famosa Record Store Day que acontece anualmente nos EUA. E no lado B não tínhamos nenhuma outra música, mas apenas o áudio do Bruce Dickinson contando de onde tirou a inspiração para compor a música. Ou seja, ambos os lançamentos serviram mais como uma campanha promocional do que a função normal de um single.

Daí alguém pode comentar: “mas todos os lançamentos do Iron Maiden, mesmo esses últimos singles, são disputados a tapa pelos colecionadores”. Daí temos que ponderar que apesar de existirem muitos colecionadores de Iron Maiden, esse número de pessoas não é suficiente para justificar um lançamento do tipo. É preferível um item limitado como esses últimos citados. Lembre-se também que para um colecionador é interessante que um item que ele busca não seja lançado com muitas e muitas cópias. O fator exclusividade também é importante.

Capa de Empire of the Clouds

Por fim, um argumento que me serviu de ponto de partida para escrever todo esse texto. Quando uma banda regrava uma música de outro artista, independente se a lança em seu próprio álbum ou em single, como é o caso que estamos tratando aqui, o compositor original tem o direito de receber royalties sobre as vendas daquele produto. Afinal, o produto tem a intenção de gerar lucro e esse lucro tem que ser dividido pelas pessoas que tem direito sobre a obra. Levando em consideração que os singles já não são mais tão importantes e que quando lançados, mesmo com faixa única, como material promocional ou de algum outro tipo de campanha há a venda certa para os colecionadores, não haveria sentido em distribuir os eventuais lucros relativos à esses lançamentos com outros artistas. Esse é também o motivo para que faixas ao vivo fossem a regra para os lados B de 2000 para cá. Os eventuais royalties ficaram sempre “em casa”. As bandas não ganham mais tanto dinheiro com a comercialização de discos. Desse modo porque repartir o pouco que têm com outras pessoas?

Sei que tudo isso acaba tirando um pouco do romantismo que temos quando tratamos de nossos artistas preferidos, mas são questões práticas que não devemos esquecer e nem ignorar. As bandas, mesmo as menores, devem ser tratadas como uma empresa e o planejamento estratégico acabam afetando todas as ações. Muito provavelmente nunca mais ouviremos o Iron Maiden tocando alguma música de outro artista. O certo é se conformar com as gravações que já existem. Daí também fica a pergunta: esse material faz mesmo falta hoje em dia, ou é apenas coisa de fã mal acostumado? Espero a resposta de vocês nos comentários junto da opinião de cada um sobre seu cover favorito.

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