Grito de raiva, alerta silencioso, disco assombroso. A estreia dos Bloc Party pega no melhor do rock de guitarras e acrescenta-lhe densidade atmosférica, temperada por letras de dor e solidão.
Com a explosão do rock independente causada por Is This It uns anos anos, os Bloc Party aproveitaram essa boleia mas não se deixaram mergulhar completamente. O álbum de estreia é um magnífico disco de rock, com todos os condimentos do rock e apenas alguns desse tal indie.
Muitos dos protagonistas desta nova vaga da música de guitarras vão fazendo canções mais hedonistas, pueris aqui, sobre noites de copos ali. Enquanto isso, os Bloc Party cantam desolação, existencialismo, saúde mental, tristeza, deriva, desajustamento, frustração sexual.
Mas como algumas canções surgem num rock saltitante (veja-se a maldição de “Banquet”, usada num anúncio da Vodafone), os Bloc Party foram logo colocados na prateleira do indie rock e ali ficaram. Só que esse lado festivo fica-se apenas pela primeira camada de guitarras, que nos encostam logo à parede e de certa forma disfarçam a crueza cortante que nos é cantada.
Porque este disco é um grito de raiva (não o são todos os grandes álbuns de rock?), é uma colecção de poemas/hinos para uma geração de miúdos que não sabe o que é pertencer, que tem tristezas passadas e medos futuros, que viu sonhos serem esmagados ou que não tem um rumo para seguir. Se à primeira escuta parece só um disco de rock-pop-guitarrado, é na verdade um disco com grande densidade atmosférica e lírica que faz deste álbum uma obra fundamental e intemporal.
A começar pelo título, Silent Alarm é logo um disco assombrado. Depois a capa – uma fotografia tirada em Copenhaga onde o álbum foi gravado – ajuda a reforçar esse cariz frio, gélido até, mas que é cantado com tal verdade e emoção que facilmente nos coloca na pele do sujeito das canções. A primeira música, “Like Eating Glass“, é exemplo disso e num instante somos transportados para essa casa vazia e fria e sentimos aquela solidão.
“This Modern Love“, que começa com uma cama suave de guitarra dedilhada e um xilofone gentil, é a bela mas devastadora história de alguém que tem de pagar para ter intimidade, mais que lasciva, emocional («you told me you wanted to eat up my sadness»). A própria “Banquet”, que é sucesso garantido em pistas de dança e proporciona sempre momentos de canto em coro abraçado, pode ser vista como a luta interior de alguém em busca de definição sexual.
É certo que a força motriz das músicas é a secção rítmica, bateria e baixo sempre a todo o gás – “Price of Gasoline”, “Luno” – enquanto uma parede de guitarras velocíssimas anda para a trás e para a frente, para cima e para baixo, criando um efeito de profundidade, de estarmos constantemente rodeados por guitarras – “Helicopter“, “She’s Hearing Voices”. Há ainda espaço para momentos mais contemplativos – “Blue Light”, “So Here We Are“, “Compliments” – sem perder a tensão e energia rock.
E esta mistura ajuda a dar corpo a uma sensação de claustrofobia, latente durante toda a escuta do disco, causada pelas letras angustiantes de Kele Okereke, vocalista reconhecido mas letrista e poeta subvalorizado.
Este disco tem ainda outros méritos, como a faixa escondida (coisa tão deliciosamente CD) ou a produção de Paul Epworth (que na altura também ajudou a criar os discos de estreia dos Maximo Park, Futureheads e The Rakes).
Depois de Silent Alarm, os Bloc Party ainda conseguiram manter os padrões em A Weekend in the City, de 2007, mas já aí começaram a divergir ocasionalmente, seja para uma pop mais orelhuda ou para uma electrónica (olá, Klaxons). O terceiro disco, de 2008, também consegue manter frescos alguns dos preceitos do álbum de estreia, mas depois disso os Bloc Party prosseguiram a exploração de territórios, perdendo também preponderância.
Mas este álbum, Silent Alarm, é uma pérola que soa tão bem hoje como em 2005 e que ajudou o Reino Unido a dar uma abada à América na ‘batalha’ do indie rock do início de milénio.
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