A Rota do Indíviduo
Caetano Veloso
Mera luz que invade
A tarde cinzenta
E algumas folhas
Deitam sobre a estrada
O frio é o agasalho
Que esquenta
O coração gelado
Quando venta
Movendo
A água abandonada
Restos de sonhos
Sobre um novo dia
Amores nos vagões
Vagões nos trilhos
Parece que quem parte
É a ferrovia
Que mesmo não te vendo
Te vigia
Como mãe, como mãe
Que dorme
Olhando os filhos
Com os olhos na estrada
E no mistério solitário
Da penugem
Vê-se a vida correndo
Parada
Como se não
Existisse chegada
na tarde distante
Ferrugem ou nada
A Terceira Margem do Rio
Caetano Veloso
Oco de pau que diz:
Eu sou madeira, beira
Boa, dá vau, triztriz
Risca certeira
Meio a meio o rio ri
Silencioso, sério
Nosso pai não diz, diz:
Risca terceira
Água da palavra
Água calada, pura
Água da palavra
Água de rosa dura
Proa da palavra
Duro silêncio, nosso pai
Margem da palavra
Entre as escuras duas
Margens da palavra
Clareira, luz madura
Rosa da palavra
Puro silêncio, nosso pai
Meio a meio o rio ri
Por entre as árvores da vida
O rio riu, ri
Por sob a risca da canoa
O rio viu, vi
O que ninguém jamais olvida
Ouvi, ouvi, ouvi
A voz das águas
Asa da palavra
Asa parada agora
Casa da palavra
Onde o silêncio mora
Brasa da palavra
A hora clara, nosso pai
Hora da palavra
Quando não se diz nada
Fora da palavra
Quando mais dentro aflora
Tora da palavra
Rio, pau enorme, nosso pai
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