Resenha
The Planets
Álbum de Isao Tomita
1976
CD/LP
Ouvi este álbum pela primeira vez no finzinho da minha infância, e meus ouvidos nunca foram mais os mesmos. Eu já era bem familiarizado com música popular, com rock (quem não?) e com música clássica (privilégio de ser o filho de um bom conhecedor de música). Mas quando coloquei para tocar o vinil de "The Planets" de Tomita, simplesmente não conseguia acreditar no que estava ouvindo. Não só os timbres eram completamente sintéticos, mas eram timbres bons, originais e interessantes, que frequentemente revelavam mais aspectos da música que os instrumentos tradicionais para os quais ela fora escrita (sim, depois fiquei comparando as versões). Os efeitos sonoros são perfeitamente adequados para o contexto, e a escolha da música fonte não podia ter sido mais feliz: junto com Debussy e Stravinsky, que Tomita já tinha coberto, essa suíte sinfônica do compositor inglês Gustav Holst é um dos grandes marcos da música orquestral do século 20, explodindo de virtuosidade e alternando sentimentos de alegria e tristeza, violência e amor, terror e paz, tudo isso com melodias geniais e únicas. Nenhum outro compositor pode se gabar de ter obtido sucesso com uma marcha militar super agressiva em ritmo 7/4 - 'Marte' - seguida pelo movimento mais suave e romântico imaginável - 'Vênus', entre outros triunfos. Cada um dos sete movimentos de 'Os Planetas' de Holst já se bastaria sozinho para entrar no repertório dos clássicos imortais. É uma suíte tão impressionante que o próprio Holst detestou a popularidade descontrolada que ela obteve logo depois de lançada, em 1919. Tomita cometeu apenas um erro neste disco. Ele alterou e suprimiu pedaços dos dois últimos movimentos, 'Urano' e 'Netuno', e encurtou 'Júpiter', tudo isso presumivelmente para fazer a gravação caber melhor no LP, ou talvez simplesmente porque achou que 'Urano", com sua complexidade extraordinária, não daria para interpretar bem com sintetizadores. O espólio de Gustav Holst fez a justiça britânica proibir a venda do disco de Tomita na terra do autor original da música, o que não o impediu de ser um sucesso no resto do mundo. O contraste entre os instrumentos que se aproximam do som natural da orquestra com os timbres mecânicos de máquinas e robôs adiciona drama e interesse ao arranjo. A recriação da complexa partitura original com sons sintetizados surpreendentes e inusitados é perfeita em equilíbrio e articulação. Tem coisa aqui de um tal nível de sutileza sonora que o ouvinte simplesmente vai ficar coçando a cabeça de pensar como Tomita conseguiu tocar usando um Moog modular e um painel cheio de botões. O tema original de Holst era astrológico, mas o de Tomita é cem por cento astronáutico. O disco inteiro é cheio de efeitos convincentes de uma espaçonave viajando, com direito à contagem regressiva e ao lançamento do foguete no início, além de sons robóticos de todo tipo ao longo do material, um dueto de cantoria entre o astronauta e o controle da missão na Terra (com vozes sintetizadas e não humanas), e um sinceramente aterrorizante trecho entre 'Júpiter' e 'Saturno' em que a nave atravessa uma versão sonora do portal das estrelas de '2001' de Kubrick. Em resumo, o álbum como um todo merece a nota máxima, mesmo com a ressalva das mencionadas alterações injustificadas no material original. Com este disco, Isao Tomita firmou-se como o primeiro sujeito a montar uma orquestra sinfônica completa e muito mais somente empregando sintetizadores analógicos, no já longínquo ano de 1976.
Sem comentários:
Enviar um comentário