sexta-feira, 21 de abril de 2023

CRONICA - NINA SIMONE | Nina At Newport (1960)

Vinte anos atrás, a cantora e pianista de jazz Nina Simone faleceu aos 70 anos. Oportunidade de evocar o disco que me fez descobrir este artista rebelde e empenhado.

Neste belo sorriso que observamos na ilustração esconde-se uma grande dor. Nina Simone, nascida Eunice Kathleen Waymon, sonhava em se tornar a primeira concertista clássica negra da América. Mas sua cor de pele em uma América que se recusa a acabar com a segregação racial decidiu o contrário. Ela, que sabia tocar Bach do início ao fim, que tinha a música clássica no sangue, foi impedida de entrar no prestigiado Curtis Institute, na Filadélfia. Essa imensa decepção, essa injustiça misturada com sua paixão pela música clássica e suas raízes irão moldar toda a sua obra. Mas também seu compromisso com os direitos civis.

É o que podemos sentir nesta Nina At Newport impressa em agosto de 1960 na etiqueta Colpix. A década de 1950 acaba de terminar e a cantora/pianista afro-americana já tem 3 álbuns em seu currículo. Ela é convidada para a 7ª edição do New Jazz Festival apresentando Ray Charles, Dizzy Gillespie, Muddy Waters, John Lee Hooker, Louis Armstrong, Gerry Mulligan, para citar apenas alguns. A nativa de Tryon, NC, se apresenta em 30 de junho, onde ela é acompanhada pelo baterista Bobby Hamilton, o baixista Chris White e o guitarrista Al Schackman.

Entre o setlist podemos desfrutar de música gospel como o rhythm & blues em ritmo médio “Trouble in Mind” na abertura, a melancólica “Porgy” mas especialmente a encantatória “Li'l Liza Jane” com aromas de bluegrass e ragtime. Sua voz quente e profunda fascina e encanta. Difícil não ficar indiferente.

Oferece-nos uma sinfonia jazzística, "You'd Be So Nice to Come Home To", dramática e desesperada onde um piano inebriante se harmoniza com uma guitarra delicada. Sem esquecer este instrumental, “Nina's Blues” que, como o próprio nome sugere, é um blues de ritmo acelerado onde Nina Simone mostra a sua grande destreza ao piano atravessada por um suingante solo de guitarra.

Mas o músico tem gosto pela vanguarda. Porque tem essa faixa perturbadora que começa o lado B, "Flo Me La". Jazz tribal com um toque latino, onde Nina Simone toca um padrão hipnótico e dark no piano em loop, acompanhando uma cativante canção que se repete (na verdade o título da peça). Por sua vez, a bateria é convulsiva e o contrabaixo, discreto como é, tem um sulco inflado com hélio. Nina Simone está em tal transe que deixa o assunto para Bobby Hamilton transformado em percussionista por um tempo antes de voltar a dançar. Em suma, 7 minutos insanos para enviar ao planeta Marte, mas acima de tudo precursores de muitas coisas.

Este Lp ao vivo termina com a tradicional "In the Evening by the Moonlight" no registro gospel boogie, uma canção datada de 1880 evocando a escravidão e a miséria do povo afro-americano.

Meu disco favorito da Nina Simone até hoje.

Títulos:
1. Trouble In Mind
2. Blues For Porgy
3. Little Liza Jane
4. You’d Be So Nice To Come Home To
5. Flo Me La
6. Nina’s Blues
7. In The Evening By The Moonlight

Músicos:
Nina Simone: Piano, Vocais
Al Schackman: Guitarra, Coro
Chris White: Contrabaixo, Coro
Bobby Hamilton: Bateria


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