Na hora de decidir se este é o “melhor” projeto de Lianne La Havas, o subjetivismo impera. No entanto, sem retirar o valor intrínseco às outras experiências da artista londrina, Lianne La Havas parece ser o trabalho mais bem conseguido da autora.
Lianne La Havas é uma daquela artistas que tem melhor prestações live do que em estúdio. Com a frase anterior, não pretendo insinuar que a britânica tem mais dificuldades em demonstrar a sua arte no interior de quatro paredes acústicas do que em espaços abertos, porque isso está longe de ser verdade.
Lianne La Havas é uma personificação de música, da sua música. É essa a ideia com que ficamos, por exemplo, quando assistimos ao seu A Take Away Show, de 2011, da produtora francesa La Blogothèque. Nesse vídeo, um utilizador do Youtube comentou “God, she’s like a walking poem. Beautiful.”, e todos sentimos isso. É um regalo assistir às live performances de La Havas um pouco por toda a internet; melhor ainda será vê-la, em carne e osso, em cima de um palco, a cantar com as suas mãos leves, mas poderosas, a segurar uma guitarra.
2020. Ao longo dos últimos meses, Lianne tem surgido em muitos home concerts, nos quais tem apresentado algumas das canções que formam o seu mais recente álbum, o homónimo Lianne La Havas. Numa altura em que a realização de concertos e tours é limitada por “aquilo que sabemos”, os artistas têm optado por realizar espetáculos gravados no interior das suas casas, e foi nesse contexto que, numa primeira fase, o novo trabalho de Lianne chegou às suas “plateias”.
Lianne La Havas é o terceiro registo deste poema andante britânico. É o sucessor de Blood, lançado em 2015, e de Is Your Love Big Enough, de 2012. Esteticamente, Lianne La Havas é o trabalho mais forte da artista londrina. A capa do LP, uma fotografia da própria a preto e branco, tem contornos icónicos. Acaba por ser interessante o facto de Lianne La Havas ser um álbum que se foca num breakup doloroso e apresentar uma capa tão feliz e cheia de esperança – um sorriso.
Ao todo, Lianne ofereceu-nos 52 minutos de rock, que se mistura com pop, que se mistura com R&B, que se mistura com jazz. Dessa mistura resulta um álbum equilibrado e harmonioso, em que os momentos mais calmos e dóceis (“Paper Thin”) fazem braço de ferro com faixas mais poderosas e intensas (“Weird Fishes”… sim, dos Radiohead).
No interior destas 12 canções, vive muita música, mas isso, lá está, não pode ser novidade. No entanto, o que surpreende neste feito musical de Lianne é a sua capacidade de controlo vocal e instrumental. A referência à cover de Radiohead que a artista fez não foi em vão, visto que este é, provavelmente, o melhor momento do álbum; pelo menos, o mais poderoso. “Weird Fishes”, na ordem das faixas, sucede ao calmo e pacífico interlúdio “Out Of Your Mind” (onde ficamos com a sensação de que estamos a sonhar acordados), e, aquecendo os nossos sentimentos, faz com que eles, depois, explodam. Em “Weird Fishes” tudo é forte e bruto, e, ao mesmo tempo, límpido: a bateria inicial, o baixo que segue todos os momentos da canção, e a voz, aqui rouca, de Lianne, que, perto do fim da faixa, arranja forças para formar uma montanha vocal perfeitamente harmoniosa.
Em Lianne La Havas, os nomes das faixas são escolhidos a dedo. Os títulos fazem-nos sorrir, confortam-nos, pois são fiéis àquilo que a música, na experiência auditiva, oferece. “Can’t Fight” (lembra a pop do início dos 2000, talvez… a melhor pop?), “Courage” e a derradeira “Sour Flower” exemplificam essa sensação.
Estamos perante um trabalho com muita qualidade. Na hora de decidir se este é o “melhor” projeto de La Havas, o subjetivismo impera. No entanto, sem retirar o valor intrínseco às outras experiências da artista londrina, Lianne La Havas parece ser o trabalho mais bem conseguido da autora. É moderno e distinto (de certa forma) daquilo que é produzido no atual panorama da música pop. Corresponde a um trabalho sincero, sendo que é essa sinceridade que os nossos sentidos captam no processo de audição, que, quando termina, dá-nos uma imensa sensação de calma e tranquilidade.
Lianne La Havas faz-nos sentir e sorrir, sem que nós nos apercebamos disso. Realmente, é assim que o trabalho acaba: com um riso longínquo, mas próximo, de Lianne… “That’s it! It’s done!”. Por alguma razão, Lianne La Havas é um dos melhores álbuns do ano.
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