Nos anos 1970, não havia nada na música pop e no rock que se comparasse ao Kraftwerk. Enquanto bandas como Yes ainda estavam no estágio "rococó" do rock progressivo, o Krafwerk parecia estar anos-luz de distância com o seu som essencialmente eletrônico futurista. A banda alemã de Düsseldorf se tornou uma espécie de elo de ligação entre o experimentalismo de pioneiros da música eletrônica como Karlheinz Stockhausen (1928-2007) com a música pop.
Quando lançou The Man Machine, em 19 de maio de 1978, o Kraftwerk gozava do prestígio conquistado com os três anteriores e elogiados álbuns, respectivamente Autobahn (1974), Radio-Activity (1975) e Trans-Europe Express (1977). Mas se em Autobahn e em Radio-Activity, o Kraftwerk se mostrava mais experimental e hermético, a partir de Trans-Europe Express a banda começa a apostar em batidas um pouco mais aceleradas chegando a flertar com a disco music ("Europe Endless"), ao pop ("Showroom Dummies") ou mesmo ao funk ("Trans-Europe Express"). Essa inclinação do Kraftwerk com o pop iniciada em Trans-Europe Express prosseguiu e até mesmo se ampliou com The Man Machine.
A capa icônica, em tons de vermelho, preto e branco trazendo os membros do Kraftwerk parados numa escada foi esteticamente inspirada da arte do artista plástico e designer gráfico russo, Lazar Markovich Lissitzky (1890-1941), mais conhecido como El Lissitzky, figura importante da arte de vanguarda da antiga União Soviética, discípulo do também russo Kazimir Malevich (1879-1935), artista plástico e criador do Suprematismo no começo dos anos 1910, movimento artístico que revolucionou as artes visuais russas naquele momento.
Lazar Markovich Lissitzky e sua arte: inspiração para a capa de The Man Machine. |
Conceitualmente, The Man Machine faz referência à relação entre o homem e a máquina num mundo cada vez mais tecnológico, como fica evidente na faixa que abre o álbum, "The Robots", na qual o Kraftwerk afirma através de uma voz robótica que os robôs estão a serviço dos seres humanos. A voz robótica é um efeito criado pelo vocoder, um equipamento eletrônico que transforma a voz humana numa voz sintética, criado na década de 1930 para ser usado nas telecomunicações. Na música popular, esse recurso passou a ser empregado a partir dos anos 1970, muito utilizado por bandas e cantores da música pop. Contudo, o Kraftwerk teria sido a primeira banda a usar o vocoder a partir de 1974 com o álbum Autobahn.
A instrumental "Spacelab" possui uma batida dançante e que se tornaria uma influência sobre as bandas inglesas de synthpop. Há quem afirme que a música foi composta em alusão a um laboratório espacial lançado ao espaço havia pouco tempo. Talvez seja uma referência a uma estação espacial lançada ao espaço em setembro de 1977 pela União Soviética, a Salyut 6, e que saiu de órbita em 1982.
Dando prosseguimento ao futurismo tecnológico, "Metropolis", faixa instrumental cujo título inevitavelmente faz lembrar o filme de mesmo nome produzido pelo cineasta austríaco Fritz Lang (1890-1976), em 1927, um clássico dos filmes de ficção científica. A música começa com um ritmo arrastado de sons eletrônicos e agudos, e possui um clima um tanto quanto sombrio.
Cena do filme do filme Metropolis, de Fritz Lang, de 1927: referência para a faixa "Metropolis". |
"The Model" satiriza a vida artificial e vazia de uma modelo famosa. A música destoa das outras faixas por causa do seu formato padrão radiofônico: pouco mais de três minutos e refrão. "Neon Lights" possui letra curtíssima e uma beleza melódica eletrônica romântica e ao mesmo tempo melancólica. Encerrando o álbum, "The Man Machine", que dá nome ao álbum e que faz relação entre o homem e a máquina. Os vocais robóticos repetem sucessivamente as palavras "man" e "machine" até as duas se fundirem.
The Man Machine não causou um grande impacto quando foi lançado. Seu reconhecimento só veio com o passar do tempo. Quando as primeiras bandas inglesas de synthpop começaram a despontar a partir do final dos anos 1970, e estas apontavam o Kraftwerk como uma de suas influências, passou-se a ter uma maior atenção ao trabalho da banda alemã. Até mesmo estrelas consagradas do rock como David Bowie e Brian Eno confessaram admiração no Kraftwerk.
Foi a partir da turnê de lançamento de The Man Machine que o Kraftwerk passou a fazer uso nas apresentações de manequins iguais aos integrantes da banda, simulando movimentos como se tocassem os instrumentos. Mais tarde, passou a usar robôs nos palcos.
Os músicos do Kraftwerk e as suas réplicas (à direita). |
A ascensão do synthpop inglês fez os dj's ingleses redescobrirem em 1981 "The Model", faixa de The Man Machine que passou a ser bastante executada nas pistas das boates e discotecas inglesas. Isso fez a EMI colocar "The Model" como lado B do single de "Computer World", faixa do álbum homônimo lançado naquele ano de 1981. "The Model" só veio a ser sucesso três anos após ser lançada no álbum The Man Machine, alcançando o posto de 1º lugar da parada inglesa.
O clima futurista, os vocais robóticos e as batidas hipnóticas e repetitivas de The Man Machine se tornaram referências para a primeira geração de artistas do synthpop inglês como Gary Numan, The Human League, Depeche Mode, New Order entre outros, e que ajudariam a moldar a sonoridade pop eletrônica dos anos 1980.
Faixas
Lado A
- "The Robots" (Ralf Hütter - Florian Scheneider)
- "Spacelab" (Florian Scheneider - Karl Bartos)
- "Metropolis" (Ralf Hütter - Florian Scheneider - Karl Bartos)
Lado B
- "The Model" (Ralf Hütter - Emil Schult - Karl Bartos)
- "Neon Lights" (Ralf Hütter - Florian Scheneider - Karl Bartos)
- "The Man-Machine" (Ralf Hütter - Karl Bartos)
Kraftwerk: Ralf Hütter (vocal, vocoder, sintetizador, teclado, sequenciador)
Florian Schneider (vocoder, sintetizador de voz, sintetizador) e Karl Bartos (percussão eletrônica), Wolfgang Flür (percussão eletrônica)
Vídeo clipe de "The Model"
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