Em King Ruiner, :papercutz está (estão?) melhor que nunca. O disco vai-se revelando aos poucos e leva-nos por um constante processo de descoberta de camadas sonoras.
O projecto liderado por Bruno Miguel parece mais confortável com os ambientes electrónicos, onde o droning dos pads faz a cama aos salpicos coloridos de tonalidades refrescantes. Uma eventual timidez e receio de arriscar nos discos anteriores transparece neste trabalho, onde os ambientes extremamente bem construídos nos assaltam os ouvidos sem piedade. King Ruiner abraça um lado mais dançável que Lylac (2008) e The Blur Between Us (2012) e as vozes de Catarina Miranda (Emmy Curl), Ferri e Lia Bilinski são depois a cereja no topo do bolo neste novo álbum, ainda que seja difícil distinguir quem canta quais.
Nestes últimos oito anos, Bruno tem estado ocupado com concertos, digressões e sucessivas descobertas por esse mundo fora por parte de várias pessoas e entidades de bom gosto. Isto poderia até não interessar nada, porque em oito anos muito se passa, mas neste caso é relevante. Porque King Ruiner transpira novidade e inspiração, actualidade e sensibilidade.
O álbum arranca de mansinho, com “Choral”, “Halfway There” e “Your Beliefs”, três faixas separadas que casam perfeitamente neste processo de revelação gradual de um universo sonoro. Na última das três podemos até notar as influências que :papercutz tem da cultura japonesa, com sintetizadores que podiam muito ser levantadas de uma canção tradicional na sua progressão. Tendo em conta a aproximação de :papercutz ao Japão, com edições especiais nesse país, digressões e até uma canção neste álbum cantada por uma artista japonesa e intitulada em katakana, “?????? (Loose Ends)”, acaba por ser uma evolução natural.
“Lowlands” e “Indifference” apresentam uns toques a uma FKA Twigs, com vozes quebradas e dissonantes em amplas salas onde se propagam os sons. É um verdadeiro assalto sonoro onde somos atacados e embalados ao mesmo tempo. “Exit Places” constrói sobre essas bases e lança-nos numa atmosfera mais dançável que só é superada mais adiante por “Halcyon”, quase a terminar o disco, onde as luzes estroboscópicas e a cerveja a 5€ estão implícitas.
Antes disso passamos pela instrumental “On Euphoria & Despair”, onde vem aquilo que eu quero chamar a parte dos pássaros por causa dos sons chilreantes no fundo. Como uma marcação de capítulo, a música seguinte, “Become Nothing” começa mais lenta e abre numa atmosfera florestal. “Choral” depois de “All Of The Ways”, fecha esta sequência com um bom exemplo de droning vocal.
O maior problema deste disco é efectivamente chegar ao fim. Mas até isso faz em grande, com “Year New”, uma canção de 7m33 que consegue o feito de nunca soar cansativa.
Sem comentários:
Enviar um comentário