quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Crítica Beirut: “Hadsel”

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Crítica

Beirut

 : "Hadsel"

Ano: 2023

Selo: Pompeii

Gênero: Indie Pop, Pop de Câmara

Para quem gosta de: Fleet Foxes e Devendra Banhart

Ouça: So Many Plans e Arctic Forest

Em meados de 2019, enquanto excursionava para divulgar o álbum Gallipoli, Zach Condon foi acometido por uma laringite severa e teve de cancelar o restante da turnê que estava marcada. Como forma de se tratar, o cantor e compositor norte-americano se isolou na região de Hadsel, na Noruega, onde alugou um chalé e foi autorizado a ter acesso ao órgão da igreja local. Vem justamente desse período de isolamento o estímulo para o repertório do sexto e mais recente trabalho de estúdio do Beirut, obra que leva o título da cidade onde foi composto e mostra uma nova abordagem no tipo de som produzido pelo instrumentista.

Como indicado logo na imagem de capa do trabalho, com uma ilustração minimalista da igreja onde o músico compôs parte das canções, Hadsel (2023, Pompeii) é uma obra marcada pelo reducionismo dos elementos. Tendo no órgão o principal instrumento de criação, Condon deixa de lado ao direcionamento grandioso dos primeiros registros da banda, caso de Gulag Orkestar (2006) e The Flying Club Cup (2008). Em geral, são composições que avançam em uma medida própria de tempo, destacando a sobreposição das teclas em uma abordagem lenta, porém, nunca desinteressante, evidenciando o refinamento do artista.

É como um regresso aos temas incorporados pelo músico em obras como The Rip Tide (2011) e No No No (2015), quando Condon passou a incorporar os sintetizadores em primeiro plano e não mais como um componente de base. A diferença está na forma como o compositor deixa de lado o caráter festivo de outrora para investir em um trabalho de essência contemplativa, como uma representação do período de isolamento na Noruega. Exemplo disso fica mais do que evidente na melancolia fina e sutileza que ganha forma na já conhecida The Tern, composição que se revela aos poucos, sem pressa, cercando o ouvinte.

Se por um lado esse direcionamento contido favorece a construção dos versos e sentimentos expressos por Condon ao longo do trabalho, por outro, prejudica o andamento rítmico dado ao disco. São canções que partem sempre de uma base estrutural bastante similar, causando a sensação de um material que custa a avançar ou que se estende para além do necessário. O próprio encontro entre composições puramente instrumentais e faixas que seguem em ritmo lento parece contribuir para essa forte morosidade. Perfeita representação desse resultado pode ser percebida na sequência formada por Melbu e Stokmarknes.

Não por acaso, sobrevive nos momentos de maior euforia e fuga desse ambiente comum o estímulo para algumas das principais composições do disco. É o caso de Arctic Forest, música que preserva o caráter atmosférico do registro, porém, estabelece na construção das batidas, reforço das vozes e percussão a passagem para um novo território criativo. Surgem ainda preciosidades como So Many Plans, faixa que mais se aproxima dos antigos trabalhos do artista, vide o destaque dado aos arranjos acústicos e metais que surgem de forma complementar, como um indicativo do meticuloso processo de criação de Condon.

Toda essa combinação de elementos resulta na entrega de uma obra que preserva a identidade criativa do músico norte-americano, porém, longe de esbarrar nas mesmas repetições estilísticas que marcam os dois registros que o antecedem. Com exceção do ritmo lento que soa como um bloqueio na porção central do trabalho, Hadsel se projeta como o álbum mais complexo e musicalmente atrativo de Condon nos últimos dez anos. Um exercício poético e instrumental que parte de um período de melancolia para estimular o nascimento de composições que mais uma vez destacam a riqueza do repertório produzido por Beirut.



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