sexta-feira, 17 de novembro de 2023

Crítica Jane Remover: “Census Designated”

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Crítica

Jane Remover

 : "Census Designated"

Ano: 2023

Selo: DeadAir

Gênero: Rock

Para quem gosta de: Ethel Cain e Alex G

Ouça: Lips, Census Designated e Video

Census Designated (2023, DeadAir) é uma obra densa, talvez difícil de ser absorvida em uma primeira audição, porém, maior e mais interessante a cada novo regresso. Segundo e mais recente trabalho de estúdio de Jane Remover, artista anteriormente conhecida pela identidade de dltzk, o registro de dez faixas estabelece no lento desvendar das informações o estímulo para a construção de um repertório que se aprofunda nas experiências sentimentais da cantora e compositora estadunidense. São relacionamentos fracassados, medos e momentos de maior melancolia que evidenciam a entrega emocional da musicista.

Mastigue-me, cuspa-me antes que você possa engolir / Eu abro meus olhos, todo mundo sabe, ninguém se importa“, canta logo nos primeiros minutos do trabalho, na introdutória Cage Girl / Camgirl, canção que evidencia o tom dramático do material e apresenta parte da formatação que rege o disco. Em geral, são movimentos contidos de guitarras, por vezes atmosféricos, mas que antecedem momentos de turbulenta exaltação, resultando na entrega de canções essencialmente catárticas. A própria faixa-título, com seu fechamento ruidoso, funciona como uma boa representação desse resultado incorporado pela artista.

É como se Remover partisse das mesmas temáticas e estruturas exploradas por Ethel Cain em Preacher’s Daughter (2022), porém, utilizando de um acabamento eletrônico. A própria artista disse em entrevista ao Stereogum o quanto o trabalho de Cain foi fundamental para a realização de Census Designated. E isso fica bastante evidente quando mergulhamos em canções como Video. São pouco menos de nove minutos em que a musicista parte de um desejo doentio para estimular a construção dos versos. “Garoto, estou tão cansada de tentar fazer você mudar de ideia / Tudo que eu quero que você faça é me perseguir“, canta.

São criações essencialmente longas, como se Remover seguisse em uma medida própria de tempo. Se por um lado esse direcionamento garante ao público uma obra imersiva, por outro, torna a experiência do ouvinte exaustiva. Composições como Backseat Girl e Idling Somewhere que custam a avançar, efeito direto da bateria econômica que, vez ou outra, desaparece por completo. Falta ao trabalho a mesma fluidez e andamento rítmico do registro anterior, vide o dinamismo explícito em músicas como Movies For Guys. Ainda assim, sobrevive nessa propositada lentidão o estímulo para algumas das principais faixas do disco.

É o caso de Always Have Always Will. Inaugurada em meio a camadas de sintetizadores, a canção ganha forma aos poucos, sem pressa, culminando em um fechamento grandioso, efeito direto da sobreposição de elementos proposta por Remover. O mesmo refinamento instrumental e lenta costura de ideias pode ser percebida em Lips, logo nos minutos iniciais do disco. São delicadas paisagens instrumentais que se revelam ao público em pequenas doses. A diferença está na mudança de percurso que culmina em uma turbulenta combinação de batidas e vozes berradas, como um exercício de libertação poética e emocional.

Próximo e ao mesmo tempo distante de tudo aquilo que a artista havia testado no disco anterior, Census Designated abre passagem para uma nova fase na carreira de Remover. Embora parta de uma abordagem talvez arrastada, sobrevive no forte aspecto sentimental e profunda honestidade explícita nos versos um atrativo natural que compensa o andamento moroso dado ao trabalho. Canções que servem de passagem para um universo criativo bastante particular, reforçando o lirismo intimista da cantora, porém, nunca inacessíveis, como um indicativo da capacidade da musicista em dialogar por meio das próprias emoções.



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