Angel Olsen expande-se a si e à sua música, lançando um disco sumptuoso e intenso.
É inegável que vivemos numa altura de grande fulgor em termos de cantautoras – temos vários nomes em cima da mesa bastante cotados, sempre presentes em listas de melhores do ano, editando vários discos consensuais em termos de público e crítica, e não só no universo rock. Também no hip-hop que foi durante anos feudo masculino se observa a “intromissão” de mulheres a cativarem a atenção e reconhecimento. Angel Olsen renega esse caminho como sendo o dela, mostrando-se despreocupada quer com conotações de gênero, quer de fronteiras sonoras: “Não pretendo ser uma mulher no mundo da música. Sou um ser humano. É-me difícil pensar como é que a minha vida intima se pode transformar em algo político para alguém.” Portanto, metoos de lado, avancemos para a música.
All Mirrors, quarto álbum da norte-americana que usa e abusa de Portugal quer para férias, quer para residências artísticas, é mais uma mostra da amplitude de espectro que Olsen gosta de cativar, procurando sempre fazer algo diferente do anterior, reinventando-se. Neste caso a coisa até nem correu conforme planeado, já que a ideia inicial era voltar ao básico, ela e a sua guitarra acústica, mas a razão tem razões que a própria razão desconhece e meteram-se ao barulho Jherek Bischoff e Ben Babbitt com as suas orquestrações e o produto final acabou por ser totalmente diferente. Às suas letras íntimas e introspectivas adicionou-se uma sonoridade expansiva e arrebatadora e é por aí que All Mirrors conquista – para cada emoção que Olsen nos transmite na letra há uma correspondência sonora que a amplifica. Veja-se a explosão que acontece ao fim de minuto e meio de “Lark”, canção que abre o álbum; o sintetizador que acompanha a frase repetida atá à exaustão “At least at times it knew me” na canção que dá nome ao álbum; um lado mais solarengo ao som de “Summer” ou “What It Is”; o lamento de carpir com arranjos minimalistas mais para o final com “Endgame” (I needed more needed more than love from you/ I needed more, needed you to be with me) e “Chance”, que fecha o álbum. Mesmo sem ter sido a ambição inicial, Angel Olsen atira-nos um disco grandioso, apesar de haver aqui e ali alguns momentos em que a intensidade quebra e facilmente viramos para um sentimento mais amorfo.
Numa excelente entrevista dada ao Público, é possível sentir, ao ler as linhas escritas, a facilidade com que Angel Olsen se expõe a si própria, falando sem receios dos seus sentimentos e dificuldades, quer como cantora quer como pessoa, e este modo de estar transparece também ao ouvir-se as suas canções, os seus discos. O acumular de experiências amorosas, de amizade, familiares tecem uma complexa teia em cada um que nos define, mas poucos são os que conseguem analisar-se e mostrar o que lhe vai na alma. Fazê-lo através de canções é o que define Angel Olsen e nós continuamos, como meros espectadores, a assistir ao filme a decorrer à frente dos nossos olhos (ouvidos).
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