Nos EUA, esse grupo tem um certo reconhecimento e é bem respeitado nos meios dos colecionadores. Já aqui no Brasil, seu nome desfila na fileira das obscuridades da virada dos anos 60 para os 70. Tudo começou com Bob Desnoyers (guitarra e vocais).
Esse cara tinha uma ideia fixa para um projeto de banda nos fins de 1968 e estava a procura de um pessoal legal que pudesse materializar sua aspiração. Indo a um show no College Inn de San Diego viu um cara chamado John Fergus tocando baixo e cantando muito bem. Chamou-o para um papo, explicou o lance e Fergus entrou na história. O baixista conhecia Ron Armstrong, que fazia parte de um dos conjuntos mais quentes de San Diego por volta de 1965 - The Misfits, que teve com um de seus maiores méritos abrir o show dos Rolling Stones na cidade, em 65. Essa banda faz parte da árvore genealógica da antológica Moby Grape. Naquela altura, em 68, ele não estava tocando.
Convidado, Ron Armstrong aceitou o convite e estava formado o embrião do conjunto. Inicialmente, o nome de batismo era Jamul City Marching and Funk Band. Depois de algum tempo se transformou em Jamul City Funk Band. O vocalista e gaitista Steve Williams viu a banda tocando e gostou do som da moçada. Steve passou a acompanhá-los e depois de umas poucas semanas foi integrado ao grupo.
Depois de oito meses de atividade conseguiram um contrato com um pequeno selo e partiram para as gravações, mas a coisa não estava fluindo como Bob gostaria. O selo em questão era a Lizard Records, iniciada por Gabriel Mekler, produtor e executivo do Steppenwolf, Three Dog Night e Janis Joplin (Gabriel também era tecladista e chegou a tocar em algumas faixas do disco I Got Dem Ol' Kozmic Blues Again Mama! de Janis). O pessoal da Lizard insistiu para que a banda abreviasse ainda mais o nome, ficando somente como Jamul (a pronúncia correta é "ra-mul", que é o nome de uma cidade californiana dos arredores de San Diego).
Se basearam em San Diego por algumas semanas até conseguirem o som na medida, e aí iniciaram as gravações. Então, depois de dois dias de gravações ao vivo, estava parido o disco de estreia, assinado na produção por Richard Podolor. O pessoal da banda achou que a produção não ficou exatamente como gostariam, mas não tiveram muito como interferir.
O disco foi gravado em 1970 e lançado no mesmo ano. A banda alcançou bom reconhecimento nos EUA. O disco vendeu cerca de 75 mil cópias e chegou na posição #93 da parada da Billboard. Saíram como single as faixas "Sunrise Over Jamul / Tobacco Road" e "Movin' to the Country / Ramblin' Man", todas integrantes do LP. A poderosa versão de "Tobbaco Road" rolou em várias estações de rádio pelo país. O grupo era bastante aclamado nos arredores de Washington, onde costumavam tocar bastante.
Das onze faixas do disco, oito eram de autoria do grupo, que tinha, além do avantajado vocal de Steve Williams, outros dois bons vocalistas, que eram Bob e Ron. A versão para "Long Tall Sally", de Little Richard, chegou aos ouvidos do compositor, que ficou impressionado com o que ouviu e convidou a turma para gravar um vídeo tocando a referida canção (vídeo este que aqui por esses lados acredito ser totalmente desconhecido). O próprio Richard chegou a participar das filmagens (vide foto), que aconteceram em Washington.
O disco chegou também a ser lançado na França em 71 e, neste mesmo ano, a banda rompe com o produtor Gabriel Mekler e acaba por se dissolver. Depois de um tempo, segundo consta uma única fonte, gravaram um segundo álbum por volta de 1972, sem a participação de Ron Armstrong. Este registro permanece engavetado até hoje! Depois disso, cada um foi para seu canto. O único do qual se sabe maiores informações é Ron Armstrong, que seguiu firme na música, tocando também piano e fazendo som com diversos músicos da área de San Diego, estando na ativa como artista até hoje.
Aqui no Brasil, graças a divulgação por alguns blogs e fóruns, o Jamul vem ganhando uma certa notoriedade entre caçadores de raridades.
Todo o LP apresenta um leve balanço desleixado, uma beirada de rhythm n’ blues, cantado com uma proposital má vontade. De resto, um braseiro do mais puro rock n’ roll. Som marginal, com o lado mais poético da vagabundagem à mostra, aquela coisa cancioneira que reúne bufões juntos para entoar hinos boêmios.
Tudo já começa em total ebulição, numa leitura incrivelmente retrabalhada da clássica "Tobbaco Road", de John D. Loudermilk, onde diria que somente a letra original foi aproveitada. O maciço sol de Jamul se estendendo por sobre intrépidos passageiros da viagem hippie, que, empunhando toda a eletricidade, transcedem o blues a um elevado nível de sentimentos, combinando amor, desprezo, força bruta e mentalidade. Desse híbrido emanam sonoridades absurdas de guitarra e gaita que desafiam os ouvidos! Ouvir esta versão é uma experiência.
"Long Tall Sally", a segunda faixa, é outra desconstrução total, edificando numa édige totalmente rhythm n’ blues o clássico de Little Richard. Guitarras saturadas ao ponto, intensidade e um fraseado de gaita que apimenta a marmita, comida com pressa na beira da estrada.
Segue-se mais R&B de estrada com roupagem psicodélica e um constante clima sorridente e malicioso, inspirando poeira e aspirando liberdade. Da linda e tocante faixa-exaltação ao campo "Movin to the Country" ao desleixo sentimental e malandro de "Hold the Line" e "I Can’t Complain", chega a tradução do som dos Rolling Stones do "fog" à poeira. Peso arrastante, guitarra vibrando com toda a sorte de aparato lisérgico e vozes roucas esganiçantes – it’s a gas, gas, gas! O disco todo é destaque, os vocais de Steve Williams são roucos e poderosos, a guitarra de Bob Desnoyers espalha uma deliciosa saturação por todos os lados e a cozinha mantém a brasa acesa.
As faixas mais pesadas do disco, "All You Have Left is Me" e "Valley Thunder", avisam que o apocalipse pode se aproximar depois dos 120 km/h. Pauleira ácida, berrada com entusiasmo suicida e instrumental estrondoso como uma caldeirão fervente.
Ainda tem a bela "Nickel Thimble", ar claramente psicodélico com um perfume country em slides e pedal steel. Assim como as demais canções, uma estrutura simples colocada na engrenagem de uma ótima composição e arquitetada com sonoridade declaradamente suja. É pegar o disco, por na estrada e ver qual é! O LP foi relançado em 1996, nos formatos de vinil e CD, também pela Lizard Records.
Integrantes.
Steve Williams (Vocal, Gaita)
Bob Desnoyers (Guitarra, Vocais)
John Fergus (Baixo, Vocais)
Ron Armstrong (Bateria, Vocais)
Bob Desnoyers (Guitarra, Vocais)
John Fergus (Baixo, Vocais)
Ron Armstrong (Bateria, Vocais)
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