quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

Melancolia e luz no magnífico novo álbum de Bill Ryder-Jones


 O poder de comunicação de uma capa pode ser determinante para à imagem juntar a vontade de escutar o que ali se guarda. E, mesmo sem um nome grafado, aquela pintura de casario de Crail, uma aldeia piscatória na Escócia, assinada por Dale Bissland, foi estímulo suficiente para o passo seguinte. Que disco era este? E logo aí uma primeira resposta promissora: “Iechyd Da” (que em galês quer dizer “de boa saúde”) não é mais nem menos do que o novo álbum a solo de Bill Ryder-Jones, que foi guitarrista dos The Coral de 1996 a 2008 e que, desde então, tem vindo a criar uma obra em nome próprio, usando ainda frequentemente o seu estúdio, instalado em cenário rural, em West Kirby, como espaço de trabalho também ao serviço de discos dos outros. De resto, é da soma de vivências já ensaiadas em discos anteriores e das experiências com outros que nasce a capacidade de encontrar unidade num mapa feito de diversidade que caracteriza “Iechyd Da”, um álbum melancólico mas nem por isso menos luminoso, no qual Bill Ryder-Jones parece ter fixado o melhor momento até aqui de toda a sua obra fixada em disco.

Ciente tanto das possibilidades cénicas da música com eloquência orquestral que em tempos levou a “If” (disco de estreia a solo, em 2011, inspirado pela escrita de Italo Calvino) como das capacidades de storytelling das descendências da canção folk (que foi ensaiando, com mais ou menos ingredientes elétricos e/ou indie em discos seguintes), Bill Ryder-Jones vence um hiato de quase cinco anos face ao álbum anterior com um disco que lida com ecos de dor (os tempos vividos em pandemia, o recente desfecho infeliz de um relacionamento) e de instabilidade mental, embora procurando caminhos que não os do isolamento ou desespero. Pelo contrário, a luz que brota dos arranjos que, com travo a memórias dos sessentas, convocam violinos, metais, flautas e até mesmo um coro escolar, as citações que e faz a “Baby” (de Caetano Veloso, imortalizada na voz de Gal Costa em “I Know That It’s Like This (Baby)”) ou de James Joyce (com um excerto de “Ulisses” no quase instrumental “…And the Sea…”), fazem do alinhamento de “Iechyd Da” uma experiência capaz de nos levar a caminhos que, mesmo moldados pela dor, podem ser coisa feita de esperança e luz. Isto sem esquecer que podemos estar aqui perante um dos mais belos discos que vamos escutar este ano.

“Iechyd Da”, de Bill Ryder-Jones, está disponível em LP, CD e nas plataformas digitais, numa edição da Domino.

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