segunda-feira, 5 de fevereiro de 2024

Thom Yorke – Anima (2019)

 

Ao radicalmente expandir os seus horizontes com Kid A quando podia ter muito bem continuado a linha pop rock dos premiados predecessores Thom Yorke descobriu a eternidade.

Parece que apenas escrevo sobre músicos que já passaram a casa dos 50, o que sugere o meu avançado estado de deteriorização, mas ao contrário de gente como Thurston Moore e Anton Newcombe, que, apesar de continuarem a produzir matéria adorável, de uma maneira ou outra não parecem ter a necessidade de dar guinadas violentas nos seus trajectos, Thom Yorke ao explorar o electrónico encontrou o complexo de túneis que o permite expandir sem limites a sua produção. Agradecem aqueles de nós para os quais a surpresa e provocação são partes essenciais da arte.

Estruturalmente parece que o Thom seguiu os processos dos últimos trabalhos a solo, entregando ao produtor (Nigel Godrich, convém celebrá-lo) as improvisações electrónicas saídas da sua man cave (terá aí passado por períodos menos felizes após a morte da ex-mulher um ano depois de se terem separado) para que este delas extraía uma forma ligeiramente menos etérea.

Anima parece ser uma continuação expansiva e menos especializada da banda sonora de “Suspiria” (2018): deambulações de fantasmas agradáveis e trágicos num sonho bizarro tangente de pesadelo mas que no final é uma carícia. Claramente melhor apreciado com uma grande taulada em cima, ou apenas em observando a tragédia distópica silenciosa do dia-a-dia, sentado num assento de carruagem de metropolitano.

A propósito, calhou ouvir este álbum a par com a visualização do excelente “Years and Years” (BBC 2019), e não posso deixar de reparar que Anima pode perfeitamente ser uma selecção de contos passados num futuro distópico não muito distante, fervilhando ora em ansiedade claustrofóbica ora em belíssimos rasgos de luz que passam pelas frinchas de uma janela de sótão, desvendando a dança descompassada das partículas de pó, que nem rave ao nascer do dia.

Bom, talvez exagere. Mas é excelente, o disco. Destacaria a “Runwayaway” (soa a Holocausto Cannibal), “I am a very rude person”, “Not the news”. Batemos o pé, num frenesim que ameaça mas que se dissolve antes do clímax. Às vezes apetecia que o seu flirt com a música dance se concretizasse em absoluto (ouvir a brilhante versão mixada do The King of LimbsTKOL RMX 1234567 de 2011), como se a música cerebral cedesse finalmente à música corporal.. mas não seria a mesma coisa.



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