segunda-feira, 5 de fevereiro de 2024

black midi – Schlagenheim (2019)


 

O dizer “primeiro estranha-se, depois entranha-se” é a melhor forma de catalogar este álbum de nome esquisito dos britânicos black midi.

Convém realçar que o processo de estranhar-se é longo e sinuoso. Será mesmo caso para dizer que foi dos mais sinuosos com que me deparei nos últimos anos, obrigando a várias audições para reter alguma coisa. Assim sendo, aqui fica o primeiro conselho – não desistam à primeira. Nem à segunda e, caso haja, nem à terceira. O universo aqui criado pelos black midi é totalmente experimental, aproximando-se à vez de diferentes sonoridades que compõem o espectro do rock, mas parecendo ser pré tudo o que já se fez. O caos que é gerado é tão primário que a banda parece realmente nunca ter ouvido música na sua vida, tão alheia que está à noção vigente de ritmo e harmonia que domina esta indústria.

A referência que vem mais à cabeça ao escutar estes rapazes será possivelmente a insanidade de Mike Patton nos seus projectos pós Faith No More – Mr.Bungle e Fântomas, mas ainda assim fica aquém de se conseguir criar-lhes um rótulo. Assumimos que a rotulação fácil não cola e voltamos a ouvir esta amálgama com laivos de jazz pelas constantes propostas de mudança de direção que encontramos a cada canção, sendo que neste ponto o pináculo é em “Western”, oito minutos de twists & turns cuja letra versa sobre o caminho para a ficcional cidade de Schlagenheim.

Uma das coisas que salta logo à vista (melhor dizendo, audição) é a capacidade incrível do baterista Morgan Simpson, que equilibra um lado melódico com um lado abrasivo, e que dá, ao que parece ser uma pura jam session dos restantes, a conjugação necessária para elevar as canções a um outro nível, para além da pura experimentação. Isto é bastante notório em “953” música de abertura, onde a bateria é o instrumento que mantém a coesão das várias partes envolvidas.

Mais para o fim do disco (sétima de nove músicas) temos “bmbmbm”, canção que costuma ser a de encerramento dos concertos que os black midi vêm fazendo. E é, quiçá, a mais demonstrativa do que são os black midi no seu âmago – uma força atómica que parece contida, explodindo a espaços e voltando a retrair-se, conduzida por uma voz catártica e incoerente que ora balbucia, ora grita “She moves with a purpose”, fazendo lembrar uma mistura de bruxa má da Branca de Neve com um vocalista de grindcore.

Temos portanto em mãos um objecto verdadeiramente alienígena, que nos deixa sem saber se o conjunto britânico está muito à frente do nosso tempo ou muito atrás, sem saber se toda esta experimentação consegue realmente questionar as estruturas formais de canção ou é só uma tentativa de soar diferente per se. Cada um o dirá, mas só haverá uma forma de decidir – ouvindo e dando-lhe tempo. Vêm ao Festival Paredes de Coura este ano, será a ocasião perfeita para os conhecerem ao vivo.



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