Ao quarto volume, os Sabbath fazem a sua obra-prima. Um improvável casamento entre selvajaria e requinte.
O hard rock nasce em Inglaterra na viragem para os anos 70 e é protagonizado por três grandes bandas: os Led Zeppelin, os Deep Purple e os Black Sabbath. Deste triunvirato, os Sabbath são de longe os mais pesados e sombrios. Foram eles os primeiros a afinar a guitarra em tons mais graves, tornando os riffs mais violentos. E foram também os primeiros a trazer para o rock as harmonias sinistras e imaginário maligno dos filmes de terror. Os alicerces para o vindouro metal estavam construídos.
O álbum de estreia dos Sabbath ainda oscila entre o velho e o novo. Se o blues rock à Cream ainda domina grande parte do disco, a faixa-título é todo um manifesto futurista. Nunca ninguém tinha ouvido algo tão arrastado, tão distorcido e tão demoníaco. Ainda hoje é espantosa a modernidade do seu riff.
Paranoid e Master of Reality já são inteiramente originais, o b-a-ba da estética stoner rock. Mas a obra-prima veio a seguir, num disco que nem sequer teve direito a nome próprio: apenas chamado de Vol. 4, como quem cataloga um dossier numa repartição de finanças.
Foi gravado em Los Angeles e alimentado a papas de cocaína. O eufórico pó branco deu-lhes a auto-confiança para gravarem o seu disco mais elaborado até então. Nos tomos seguintes (Sabbath Bloody Sabbath e Sabotage) limariam demasiado a coisa, perdendo-se em corrosão e em vitalidade. O segredo de Vol. 4 está no equilíbrio perfeito entre sofisticação e brutalidade. O melhor smoking para o pior matadouro.
Épicos como “Wheel of Confusion” e “Under the Sun” podem ter estruturas complexas, com variações quase prog, mas o som continua deliciosamente sujo e lamacento. A balada ao piano “Changes” afugenta os metalheads mais puristas mas o riff corta-cabeças de “Supernaut” trá-los logo de volta. “Laguna Sunrise”, instrumental acústico com quarteto de cordas em fundo, tem um travo inesperadamente pastoral; descansem, porém, os mais urbano-depressivos: o fumo das fábricas de Birmingham é o travo dominante. Há tanta versatilidade e melodia em Vol. 4 que é fácil nos esquecermos o quão pesados e sinistros são os riffs iniciais de “Cornucopia” e “Under the Sun”- doom metal muito antes do termo ter sido sequer inventado.
O tema mais icónico de Vol. 4 é o clássico “Snowblind”, uma declaração de amor à sua nova “drug of choice”. As groupies podiam fazer fila lá fora, mas a forma como a palavra “cocaine” é sussurada sugere que a cocaína era, então, a concubina favorita. Esperar-se-ia, então, um disco frenético e divertido? O lamento blues com que começa o disco responde logo que não; o tom é, quase sempre, arrastado e lúgubre. Vol. 4 não é a euforia das linhas no espelho. É o lobo da depressão no dia seguinte.
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