Este foi editado em 1964 e representou a estreia da italiana Gigliola Cinquetti, que acabara de vencer a Eurovisão. O disco traduz ecos tanto da modernidade ié ié como de linhas ligeiras mais conservadoras.
Na alvorada da década de 60 uma nova cultura jovem começava a ganhar expressão em diversas geografias, até mesmo em territórios política e socialmente mais conservadores. Se primeiros fenómenos nos anos 50 tinham levantado novas possibilidades, o impacte global dos Beatles, na primeira metade dos anos 60, fixou definitivamente novas formas musicais, gestos e imagens num patamar de grande visibilidade. Se neles encontramos a génese do nome do fenómeno ié ié, na verdade houve em muitos outros seus contemporâneos casos de notoriedade entre um público juvenil que então dominou as atenções do mercado discográfico. Casos de cariz local que, ocasionalmente, galgaram fronteiras e se fizeram escutar mais longe. Um dos nomes a conquistar essas rotas de internacionalização foi a italiana Gigliola Cinquetti, que em 1964 venceu destacadamente o Festival da Eurovisão com Non Ho L’Etá.
Filha de uma família com origens aristocratas, e com um início de percurso na música iniciado no Conservatório de Verona, Gigliola Cinquetti tinha apenas 15 anos quando, em 1963, venceu uma primeira competição local. O “salto” para uma carreira de facto (que a levaria a abdicar de um rumo antes pensado para estudos de arquitetura ou filosofia) começa a ganhar forma quando, em janeiro de 1964, vence o Festival de San Remo, com Non Ho L’Eta. É esta mesma canção que, em março desse mesmo ano, lhe dá a vitória eurovisiva em Copenhaga, fazendo deste triunfo o primeiro caso de sucesso notório de uma presença jovem no concurso (o que seria reforçado no ano seguinte com France Gall), um ano depois de Françoise Hardy (pelo Mónaco) ali ter levado primeiros claros sinais de ventos novos que sopravam numa Europa que começava a mudar os hábitos de consumo discográfico.
Mas se, apesar da juventude da cantora (então com 16 anos), Non Ho L’Etá não deixava de ser uma canção conservadora tanto nas palavras como até mesmo na música. Nesse mesmo ano, ao criar um primeiro LP (em cuja contracapa há uma foto da cantora em pleno palco eurovisivo), Gigliola Cinquetti chamou a Milão, onde o gravou, uma coleção de canções que sugerem uma ideia de juventude ao jeito ié ié (em Itália usava-se sobretudo a expressão “beat italiano”). O álbum, que inclui a canção que dera que falar na Eurovisão, é dominado por baladas ou temas mid tempo, arrumadas e polidas, sem o fulgor de rebeldia de uma Rita Pavone, uma contemporânea e compatriota sua. Os arranjos, de Franco Monaldi, conciliam a presença da orquestra com instrumentação mais frequente em combos de alma pop e jazz, e, pontualmente, não faltam até discretas linhas com um dos primeiros teclados eletrónicos. Numa linha entre ecos do que pela Europa de então ia ganhando forma como manifestações do ié ié e caminhos da canção ligeira (que a carreira da cantora acabaria por tomar), o álbum de estreia de Gigliola Cinquetti é um docinho “bem comportado” que recorda como, antes de gritar um Ipiranga, muitas vezes a cultura jovem desenhou primeiras ousadias num formato mais penteado… No fundo um afloramento europeu de um fenómeno que, para controlo de danos, a indústria do disco nos EUA tinha criado com os teen idols de finais dos anos 50.
“Gigliola Cinquetti”, de Gigliola Cinquetti, teve edição original em LP pela CGO, em 1964, sendo então editado em vários mercados com a mesma capa e alinhamento. Uma edição em CD surgiu em França em 2015 com o título Non Ho L’Età – Grand Prix De L’Eurovision 1964, juntando ao alinhamento original de 12 canções um conjunto de cinco versões cantadas em francês.
Da discografia de Gigliola Cinquetti vale a pena descobrir discos como:
“Rosa Nera” (1967)
“L’Orage” (1969)
“Si” (1974) – single
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