Quando se ouve Meddle e, principalmente, a faixa “Echoes” percebemos até onde nos estamos a aproximar do verdadeiro som dos Pink Floyd.

A frase pertence a David Gilmour, inserida DVD comemorativo do trigésimo aniversário de Dark Side of the Moon, explicando a importância que o álbum Meddle teve na transição da alquimia sónica do quarteto. Uma transformação que os transportaria do lado mais underground para os estádios do mundo.

Depois das experiências mais ou menos bem-sucedidas do som sinfónico de Atom Heart Mother ao cacofonismo de Ummagumma, os Pink Floyd estavam preparados para dar “o salto” qualitativo e quantitativo.

O primeiro sinal de que as coisas estavam a mudar era o crescente papel de Roger Waters no grupo. O baixista passava a assinar todas as letras de Meddle e daqui para frente seria ele o impulsionador criativo da máquina dos Pink Floyd. Temas como a alienação, a arrogância, a pressão da sociedade sobre o indivíduo ou o distanciamento crescente nas relações humanas (e que apareceriam anos mais tarde em Dark Side of the Moon ou The Wall) começavam a ganhar força e expressão.

A lógica ainda hoje patente do “Nós vs Eles” (e que ainda atormenta Roger Waters), faz aqui a sua estreia em “Echoes””: “Strangers passing in the street/ By chance two separate glances meet/ And I am you and what I see is me/ And do I take you by the hand/ And lead you through the land/ And help me understand the best I can…”.

“Echoes” é sem dúvida a “obra-prima” da carreira dos Floyd. No saudoso tempo do vinil como único meio de transmissão musical, ocupava por inteiro o lado B, tal era a imponência dos seus 23 minutos. Curiosamente este colosso sónico surgiu de 25 melodias diferentes compostas pelos vários membros da banda que depois de muita pesquisa e experimentação decidiram unir as várias secções do título original da peça “The Return of the Son of Nothing”. Começa vagarosamente com pingos de sons “aquáticos” que depois desembocam numa melodia crescente onde a Fender Stratocaster de Gilmour tem um papel proeminente. Pelo meio há uma espécie de “jam funk-espacial” com a guitarra cósmica a ir ao sétimo dos céus. Genial…

Virando o lado do disco, e voltando ao início escuta-se o vento com “One of These Days” puxado por um baixo hipnótico de Waters. Não é apenas um, mas dois baixos, Gilmour está também lá a dar o seu contributo. E no meio aparecem os teclados de Wright que com uma subtileza muito discreta arrebatam o ouvinte para as profundezas das viagens inter-galácticas. Facto assinalável é também o facto de aparecer pela primeira a voz do baterista Nick Mason.

O resto do álbum é um pouco mais ecléctico e terrestre. “Pillow of the Winds” contem grandes dedilhados de guitarras acústicas sonhadoras. “Fearless” é um hino dedicado aos fãs do futebol (no final até se ouve o tradicional “You’ll Never Walk Alone” cantado por adeptos do Liverpool).

Cantado por Waters, “San Tropez” é uma canção ideal para quem vai de férias para a praia. “Seamus” é um blues dedicado ao cão do agradável Mariott, guitarrista dos Humble Pie e amigo de Gilmour que ocasionalmente ladrava no estúdio quando gostava de uma música.

Ao fim de mais de 30 anos, Meddle ainda soa a fresco e encantador. Foi quase êxito global não fosse o contínuo fracasso de vendas que a banda enfrentava nos Estados Unidos desde 1967. O grupo não contente com a situação, acusava a editora (Capitol Records) de má gestão promocional. A editora por seu turno achava que a banda não fazia música para passar na rádio e consequentemente tinha um produto extremamente difícil de comercializar. Mal eles sabiam que dois anos depois, a vida deles estava prestes a dar uma volta de 180º graus. Mas por enquanto os Floyd ainda se mantinham escondidos “no lado oculto da lua”…