Ao quarto capítulo da sua discografia, os Unknown Mortal Orchestra não deixam de fascinar, mas perdem alguma da definição que lhes vinha trazendo progressivamente novos fãs.
O projecto de Ruban Nielson saltou para os ouvidos dos conhecedores com o extraordinário II, de 2013, com o seu psicadelismo a conquistar-nos pelas melodias, arranjos lo-fi e um charme old school que nos levava para outros tempos. No passo seguinte, Multi-Love, de 2015, as guitarras do passado misturaram-se com os sintetizadores e até um inesperado sentido funk, deixando os Unknown Mortal Orchestra mais perto do que nunca de um reconhecimento mainstream. A questão seria sempre o que fariam a seguir, agora que estavam com um pé na porta da divisão maior das bandas rock actuais?
A resposta nunca seria fácil nem sequer poderia agradar a todos. Ou faziam mais do mesmo, ou aprofundavam o som do disco anterior numa espécie de Currents, ou recuavam para caminhos mais experimentais. Entre estas tendências, a última acabou por falar mais alto.
O primeiro avanço para este disco foi “American Guilt”, que insinuava um rumo mais duro, mais sujo, pelo de guitarras distorcidas. E sim, há disso por aqui. Mas há também ecos do funk minimal recém-descoberto, como em “Hunnybee”, a lembrar a construção de um certo pop mascarado de hip-hop, feito de subtileza de estúdio mas apenas elevado a algo mais relevante quando a guitarra de Nielson arranca um solo confiante que, no entanto, acaba por parecer desperdiçado num tema que lhe é estranho.
Sex & Food tem muito disto, pérolas escondidas no meio de coisas banais, às vezes, e de detritos, noutras. Já a lenta – e de soturna letra – “Chronos Feasts on His Children” é uma curta vinheta de doce instrumental como os UMO já nos habituaram.
Segue-se a narcotizada e narcotizante “The Internet of Love (That Way)”, que se arrasta num murmúrio de solidão, com “Everyone Acts Crazy Nowadays” a levar-nos, com a sua bateria electrónica, de volta ao universo de Multi-Love. Depois aparecem coisas como “Not In Love We’re Just High”, que tem no centro uma melodia óptima que podia ser um single de Stevie Wonder, se Stevie Wonder quisesse deliberadamente boicotar a sua própria carreira.
Essa é uma das conclusões de Sex & Food, a desconstrução e até destruição de algumas músicas, enterradas sob uma montanha de efeitos e de soluços de estúdio. Algo que sempre foi típico dos UMO mas que, por vezes, impede de ver, na sua plenitude, a beleza das melodias que estão sabotadas, por baixo.
Sex & Food é, assim, um disco que vai a muitos dos universos já visitados anteriormente mas que se recusa a ser linear e a deixar-se compreender facilmente. Um álbum rarefeito e solitário, que nos mostra um Nielson a fazer a música que quer fazer, sem qualquer cedência a um eventual desejo de subida de divisão. Longe ficam as malhas psicadélicas e algo soalheiras de que tanto gostamos, sacrificadas perante uma recusa de uma linearidade, algo que, a partir de agora, não mais devemos esperar dos Unknown Mortal Orchestra. O que não tem nada de errado.
Os pontos-extra que merece pelo arrojo e pela identidade perde-os, talvez, por algum excesso de estúdio e de efeitos sabotadores, como alguém que quer esconder a sua própria genialidade,sem o conseguir por inteiro.
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