Os King Gizzard descobriram os sintetizadores e fizeram um caleidoscópio sónico, explorando (quase) todas as vertentes do rock progressivo.

Não são todas as bandas que lançam quatro discos bons e quase nenhuma os lança a todos no espaço de um ano. É impossível falar de Polygondwanaland sem mencionar a maneira como foi lançado. Os King Gizzard disponibilizaram gratuitamente os masters do disco de modo a que os fãs pudessem criar as suas próprias versões em CD e vinil. Dezenas de editoras independentes aceitaram o desafio e criaram as suas próprias versões do quarto de cinco discos que a banda australiana se propôs lançar em 2017.

“Crumbling Castle” abre o disco e encaminha-nos para outra dimensão com o seu ritmo sincopado e riffs traiçoeiros. Depois de um refrão que se assemelha a um grito de guerra a canção salta para uma secção jazzística e o sintetizador estreia-se verdadeiramente num disco dos King Gizzard (eles já o tinham usado em discos anteriores mas nunca como instrumento principal) criando um crescendo que culmina num dos já familiares freak-outs a que a banda nos habituou já. Os 10 minutos de “Crumbling Castle” são os mais pesados que os australianos alguma vez gravaram e abrem o apetite para um disco que contém muitas surpresas.

As três canções que se seguem estão tematicamente ligadas, formando uma suite apelidada de “Polygondwanaland”. A faixa-título, em contraste com a violência a que o ouvinte acabou de ser exposto, é lenta e valsante, a sua melodia suportada por uma flauta (a que a banda nos tem habituado nos últimos discos) e, mais uma vez, sintetizadores. “The Castle in the Air” acelera o passo, com complexos ornatos de guitarra acústica e “Deserted Dunes Welcome Weary Feet” amplifica-o ainda mais com um riff de hard rock, levando-nos a paisagens mais familiares. O seu refrão dissonante (reminescente do da faixa-título) relembra-nos o doo-wop dos anos 50 mas com um travo ao psicadelismo clássico dos King Gizzard. Acabada a canção, torna-se claro que este é o disco em que os antípodas finalmente abraçaram o rock progressivo (conceptualmente esta tendência já tinha sido evidenciada no spoken-word de Murder of the Universe ou no ciclo infinito de Nonagon Infinity).

Para quem considera o rock progressivo um género pretensioso e difícil de ouvir, os King Gizzard provam que não tem de ser assim: “Tetrachromacy” (e as referências a quatro cores não acabam aqui) são três minutos e meio da pop mais orelhuda deste disco. O riff pirata na acústica é duplicado por uma guitarra elétrica com efeitos e o breve interlúdio de flauta e harmónica fazem com que estes três minutos pareçam curtos de mais.

O disco acaba com “The Fourth Colour”, uma tour de force que nos lembra os melhores hinos de I’m in Your Mind Fuzz de 2014: riffs orelhudos dão lugar a refrões espaciais desorientadores que se desmoronam num drone, culminando na típica jam final a que os australianos nos foram habituando ao longo dos anos.

Não é ao quarto disco de 2017 que os King Gizzard começam a abrandar. Polygondwanaland contém os melhores aspetos da fórmula da banda e expande a paleta em todas as direções. O resultado é um disco musicalmente rico que promete impressionar até os mais cínicos detratores da locomotiva australiana.