
Em 1965, a Colômbia vivia um momento crucial. O país ainda tentava cicatrizar as feridas de La Violencia, a década sangrenta fruto da rivalidade entre liberais e conservadores. A Frente Nacional, fundada em 1958, garantia a alternância pacífica de poder entre os dois partidos, mas sufocava toda a oposição: movimentos de esquerda e trabalhistas eram marginalizados ou monitorados. No campo, a pobreza e a revolta deram origem aos primeiros movimentos guerrilheiros marxistas, inspirados pelos ideais revolucionários que varreram o continente vindos de Cuba.
Em grandes cidades como Bogotá, Medellín e Cali, a modernização avança rapidamente. Uma nova classe média instruída está surgindo, fascinada pela cultura ocidental. Cinemas, cafés e estações de rádio transmitem música da Inglaterra e dos Estados Unidos: Beatles, Rolling Stones, Animals… Uma juventude urbana curiosa abraça essa música como um grito de emancipação.
No entanto, a sociedade permanece limitada pelo conservadorismo e pela influência da Igreja. A censura é onipresente, a moralidade sufoca. É nesse contraste, entre a modernidade urbana e a estagnação social, que surge a primeira onda do rock colombiano: uma juventude em busca de identidade, liberdade e sons inovadores em um país ainda assombrado por seus fantasmas.
Foi nesse ambiente vibrante que Los Speakers surgiu em Bogotá, em meados da década de 1960, sendo frequentemente considerados os pioneiros do rock colombiano. Formado na esteira da Beatlemania, o grupo inicialmente se alinhou com a cena pop britânica. Seus primeiros singles e álbuns eram, em sua maioria, covers de clássicos anglo-saxões traduzidos ou adaptados para o espanhol.
Esse período de imitação, comum em toda a América Latina, surgiu menos da falta de inspiração do que do desejo de tornar um som ainda percebido como estrangeiro acessível à juventude local. Mas por trás dessas versões domesticadas e bem estruturadas, percebe-se uma crescente impaciência: a de músicos ansiosos por encontrar sua própria linguagem, para além da mera imitação.
Em 1967, tudo mudou!
Na formação original, restam apenas Rodrigo García (vocal, guitarra, órgão, violino) e Humberto Monroy (baixo, vocal), que recrutam Óscar Lasprilla (guitarra solo) e Roberto Fiorilli (bateria).
Seguindo os passos de Los Gatos, na Argentina, os novos Speakers finalmente decidiram virar a página das versões cover e aventurar-se em território muito mais ousado. A banda entrou no estúdio com a firme intenção de criar um álbum inteiramente original, em sintonia com o espírito psicodélico e rebelde que então varria o mundo do rock. Chega de adaptações domesticadas: agora era hora de exploração sonora, introspecção e liberdade de expressão.
Longe dos refrões açucarados e das estruturas convencionais do pop, este quarto álbum, autointitulado e lançado pela gravadora Bambuco, revela uma banda em plena metamorfose, impulsionada por uma sede de ruptura. Sons distorcidos, ecos etéreos, letras poéticas ou estranhas… tudo respira a transição entre a inocência do beat e a experimentação psicodélica.
Este é o momento em que Los Speakers param de imitar o mundo e começam a inventar um.
O álbum começa com tudo na urgente faixa de garage rock “Te Olvidare”: guitarra distorcida, órgão frenético, solos psicodélicos, uma seção rítmica imparável e vocais divertidos. Em resumo, uma abertura inesquecível, muito parecida com a mais melódica e crua “Regresaste”. A faixa seguinte, “ 18”, é mais bucólica, com sua gaita nostálgica, enquanto o órgão gótico de “Un Hombre Triste” nos conduz com um toque de melancolia.
A faixa de abertura, “Uno Dos Y Tres”, dá lugar a um interlúdio romântico com “Tu Cancion De Amor”, emoldurado por instrumentos de sopro. Em seguida, o quarteto se aventura pelo bluegrass com “Rancho Barra Cruzada”, com destaque para o violino, antes de “Reflexiones” nos transportar para uma jornada caleidoscópica.
“Mis Sueños” assemelha-se a um desfile hipnótico de acid rock com influências de blues, onde os metais retornam em grande estilo. Com um banjo, “Después de Tanto Amor” flerta mais uma vez com o bluegrass psicodélico, pontuado por uma gaita suave e texturas gélidas de órgão. “El Tren Que Se Va” evoca uma sensação de melancolia antes de concluir com um número de blues impactante, “Mira Que Bailas Bien”.
Com este álbum, Los Speakers abrem novos caminhos. O rock colombiano deixa de imitar e ousa sonhar. O que se segue irá ainda mais longe, para territórios onde a razão falha.
Títulos:
1. Te Olvidare
2. 18
3. Un Hombre sad
4. Regresaste
5. Uno Dos Y Tres
6. Tu Cancion De Amor
7. Rancho Barra Cruzada
8. Reflexiones
9. Mis Sueños
10. Después de Tanto Amor
11. El Tren Que Se Va
12. Mira Que Bailas Bien
Músicos:
Rodrigo García: Voz, Guitarra, Órgão, Violino
Humberto Monroy: Baixo, Voz
Óscar Lasprilla: Guitarra
Roberto Fiorilli: Bateria
Produção: Los Speakers
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