
Em meados da década de 1960, São Francisco tornou-se o epicentro de uma revolução musical e cultural psicodélica. Haight-Ashbury, com seus cafés esfumaçados e clubes improvisados, atraiu jovens em busca de liberdade, novas experiências e experimentação sonora. A contracultura floresceu ali, impulsionada pelo movimento hippie, pelo uso de LSD e pelo idealismo pacifista, mas também por uma insaciável curiosidade musical.
Foi nesse ambiente vibrante que surgiu o acid rock: grupos como Jefferson Airplane, Grateful Dead e Big Brother and the Holding Company exploraram novos sons, misturando rock, blues, folk e improvisação psicodélica. Os shows se tornaram experiências multissensoriais, onde a música se entrelaçava com luz, projeções e improvisação coletiva.
Nas sombras, algumas bandas estão tentando a sorte nesse estilo musical que exala liberdade. Entre elas, Mad River.
Este grupo injustamente esquecido foi formado em 1966 no Antioch College, em Ohio. Era composto por Thomas Manning (vocal), David Robinson (guitarra), Rick Bockner (guitarra), Lawrence Hammond (vocal e baixo) e Greg Dewey (bateria). O nome da banda foi inspirado em um rio próximo: o Rio Louco (Mad River).
Em 1967, eles se estabeleceram em Berkeley, não muito longe de São Francisco. Foi lá que chamaram a atenção do poeta e escritor da contracultura Richard Brautigan, que os impulsionou para o coração do movimento hippie. Pouco depois, o grupo lançou um EP de três faixas pela Wee Records antes de assinar com a Capitol em fevereiro de 1968. A Mad River lançou então seu álbum de estreia homônimo.
Este álbum é uma verdadeira maravilha do acid rock californiano, rivalizando com o Quicksilver Messenger Service, o campeão do gênero. Só que a música do Mad River é mais sombria, mais obscura, mais "dark", oferecendo uma intensidade e profundidade raramente alcançadas na época, perfeitamente ilustradas pela capa do álbum, que reflete esse universo opaco e misterioso.
O álbum homônimo abre com força total com "Merciful Monks", uma investida heroica e urgente. Guitarras se chocam em uma batalha frenética, coros se elevam brilhantemente, enquanto a seção rítmica nos mantém na ponta da cadeira. Os vocais apaixonados e intensos completam essa abertura impactante, anunciando um álbum onde cada faixa respira exploração e exaltação psicodélica.
Entre o folk e a guitarra com toques de acid house, "High All The Time" surge como uma canção dramática e desesperada, onde cada nota parece carregada de discórdia. "Amphetamine Gazelle", por outro lado, não faz nada pela metade: é um despertar galopante após uma noite alucinante, arrastando o ouvinte num turbilhão de riffs frenéticos e ritmos alucinantes.
Em seguida, vêm as faixas mais complexas do álbum, aquelas que brincam habilmente com tempos e atmosferas, alternando momentos de tensão com passagens mais contemplativas, revelando o domínio incomparável de Mad River. Começamos com "Eastern Light", que se estende por quase oito minutos, uma balada inquietante e desencantada, como uma busca perdida que, no entanto, não é desprovida de luz. Os vocais são resignados, mas esperançosos, com a guitarra blues e o piano despretensioso adicionando uma melancolia luminosa.
Uma introdução envolvente para a faixa instrumental "Wind Chimes", com mais de sete minutos de duração. A improvisação é palpável. A guitarra elétrica tece arabescos, a bateria adota ritmos étnicos e a flauta onírica nos conduz a uma jornada que oscila entre o paraíso e o inferno.
Com 12 minutos de duração, "War Goes On" explora um território inquietante e perturbador, onde Grateful Dead e Quicksilver Messenger Service jamais ousariam se aventurar. A bateria torna-se ameaçadora, a guitarra insidiosa apesar de seus arpejos alegres. É uma marcha fúnebre que nos agarra, uma viagem de ácido ruim que nos absorve, um limiar de percepção cruzado onde a morte parece espreitar em cada canto de um universo que gradualmente se torna mais sombrio.
A breve "Hush Julian", que encerra este LP, tocada acusticamente, soa como uma libertação após tanta emoção, oferecendo um momento de calma e contemplação depois da intensidade das faixas anteriores.
Contudo, ao ouvir este álbum, a masterização parece apressada e imperfeita. Longe de prejudicar a experiência, isso na verdade amplifica a intensidade e a densidade da música. As guitarras e o baixo soam mais agressivos, a bateria mais opressiva, e os instrumentos se sobrepõem num caos controlado que reforça a atmosfera sufocante e claustrofóbica do álbum. Essa qualidade crua e imediata contribui para o efeito hipnótico e sombrio, tornando o álbum uma imersão psicodélica quase oculta, mas acima de tudo, essencial.
Títulos:
1. Merciful Monks
2. High All The Time
3. Amphetamine Gazelle
4. Eastern Light
5. Wind Chimes
6. War Goes On
7. Hush Julian
Músicos:
Gregory Leroy Dewey: Bateria;
David Robinson: Guitarra;
Lawrence Hammond: Vocal, Baixo, Guitarra, Piano;
Rick Bochner: Guitarra, Vocal;
Thomas Manning: Vocal
Produzido por: Nikolas Kostantinos Venetoulis
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