É finalmente primavera e parece que o sol e o calorzinho chegaram e se instalaram. Tempo perfeito, só que não. Nunca nos últimos dias quis tanto céu carregado e ventania, ou um daqueles dias de nevoeiro cerrado que parece que vai levantar, mas depois não acontece nada. Este meu desejo de horário de inverno e meteorologia correspondente é o resultado de escutas sucessivas de Asphalt For Eden que assinala o regresso aos discos dos Dälek ao fim de sete anos desde Gutter Tactics.
Dificilmente o trabalho de outros artistas de hip hop tem este efeito particular. Mas os Dälek sempre se distanciaram do cânone do género, incorporando samples de ambient e apostando na criação de ambientes tão shoegaze como os que criam os Have A Nice Life.
Não é à toa que o álbum é editado pela Profound Lore Records, mais direccionada para géneros mais pesados e experimentais (ainda no ano passado nos deu o incrível A Northern Meadow, dos Pyramids), ao invés de ter o selo de uma editora com um catálogo mais virado para aquilo que achamos que é o público-alvo do hip hop. A própria carreira dos Dälek acabou por afastá-los deste target quando embarcaram em digressões com bandas como The Dillinger Escape Plan, Tool ou Godflesh
A maioria das referências dos Dälek talvez nem se cruze com as dos nomes maiores do hip hop dos últimos quinze anos, e é isso precisamente que faz com o seu som seja distinto em relação a outros artistas, e que os deixe mais próximos de uma onda mais experimental. “Masked Laughter (Nothing’s Left)” ou a instrumental “6db” facilitam a compreensão desta descrição, envoltas numa neblina que resulta desta combinação menos óbvia de géneros.
Mas depois também há o contraste em “Critical” e “Control”, onde o hip hop se coloca numa posição mais dominadora do que nos restantes temas. Os beats mais rápidos e o tom mais inflamado de MC Dälek (Will Brooks) deixam estes temas mais perto da zona mais popular do género, como que a fazer-nos lembrar que no final do dia, em Asphalt For Eden e no cerne dos Dälek há muito, muito hip hop, e do bom.
Na verdade, quanto mais ouço Dälek, mais me parece que eles são uma das melhores bandas de entrada para aqueles que, como eu, um dia disseram que não gostavam de hip hop. O que torna o trabalho dos Dälek tão peculiar, e Asphalt For Eden não é excepção, é esta personalidade um tanto à margem de géneros, que resulta numa combinação daquele groove instantâneo do hip hop à mistura com a cadência lenta e cinzenta do material mais noise incorporado desde o início ao fim do disco.
Sejam mais hip hop e menos experimental ou vice-versa (ou nenhuma das duas) e mesmo sob as nuvens cinzentas que traz consigo, a escuta de Asphalt for Eden é mais que recomendada.

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