domingo, 28 de agosto de 2022

POEMAS CANTADOS POR SÉRGIO GODINHO

Assim Como Um Postal Para o Canadá

Sérgio Godinho

 

Foi a sede, foi a neve

e a falta de alguém

que me trouxe no consolo

de quem o tem

já vou, meu amor, já venho

se o despertador tocar

estarei contigo ao jantar


Rapariga mulher fácil

de compreender

teu palácio onde a chuva

não tem dizer

já estou com o cabelo enxuto

e a roupa a secar no forno

e os lábios num caldo morno


O correio hoje à tarde

trouxe um embrulho

agitei-o para ver

se fazia barulho

abri-o e era um par de luvas

e um metro de um bom riscado

estou pronto para o noivado


Passa um carro a guinchar

dentro da cidade

segue a multa por excesso

de velocidade

e eu aqui à janela

esmagando as moscas de Verão

com o corpo a dizer que não


Telefonaste a dizer

que estás atrasada

foi a sede que me fez

voltar para a estrada

mas tudo o que quis dizer

fica aqui no gravador

o medo, a alegria e a dor.


Até Domingo Que Vem

Sérgio Godinho

 

Nunca vivi nada em vão

cada qual sabe do que tem

ninguém pertence a ninguém

seja inimigo ou irmão


Seja inimigo ou irmão

temos a nortada na pele

a discutir do farnel

já se perdeu muito pão


Já se perdeu muito pão

e as bocas ainda a sonhar

a ver esperanças no ar

quando há certezas no chão


E para aqui estamos em salamaleques

a lamber mãos feitas para abanar leques

a pedir bis, a gritar bravo,

a aplaudir, muito bem

e até domingo que vem


Nunca vivi nada em vão

vi muita palavra tornar-se

em tante gente em disfarce

e em muita boca traição


E em muita boca traição

e em cada de nós um olhar

se nos vierem falar

sabemos quem eles são


Sabemos quem eles são

como quem sabe de si mesmo

o medo, a vida desfez-mo

a letra me tomarão


E para aqui estamos em salamaleques

a lamber mãos feitas para abanar leques

a pedir bis, a gritar bravo,

a aplaudir, muito bem

e até domingo que vem


Sabemos já d´antemão

quem nasceu p´ra viver de luto

a flor de Junho dá fruto

o homem sozinho é que não


O homem sozinho é que não

que diga quem quase morreu

a perguntar "quem sou eu"

e a viver da solidão


E a viver da solidão

fomos pouco a pouco fazendo

a nossa cova no vento

abrigados num caixão


E para aqui estamos em salamaleques

a lamber mãos feitas para abanar leques

a pedir bis, a gritar bravo,

a aplaudir, muito bem

e até domingo que vem.


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