sábado, 3 de setembro de 2022

NO BAIRRO DO VINIL

 

Santinho das Neves - Arriba a leva

São poucos os artistas que conhecemos que conseguiram conciliar a actividade artística com qualquer outro tipo de actividade profissional. Em regra, a primeira era preterida em favor da segunda, face à escassez de espectáculos regulares e, sobretudo, porque do ponto de vista financeiro a vida artística era pouco atraente para a esmagadora maioria dos artistas.
Ainda mais raro era a conciliação das lides do espectáculo com o desporto. Não porque existisse um antagonismo necessário entre estas actividades, ou uma suposta incompatibilidade entre a vertente física e a vertente mais artística do ser humano, mas sim porque também neste domínio não existiam grandes oportunidades de prosseguimento de uma carreira desportiva em regime profissional. Ainda assim, de memória, relembramos, por exemplo, entre outros, o caso da cançonetista Manuela Novaes que se sagrou campeã nacional de lançamento do disco e do ex-futebolista Diamantino (não confundir com Diamantino Miranda, glória do Benfica) que também gravou discos, ou ainda de um caso bem mais conhecido a nível mundial: Júlio Iglésias, guarda-redes (suplente) do Real Madrid, que atingiu sucesso à escala planetária.


O caso que recuperamos hoje do esquecimento é também de um atleta do Sporting Clube de Portugal (entre outros clubes) de nome Manuel Santinho das Neves, que foi nada mais, nada menos do que 10 vezes campeão nacional de lançamento do dardo. Para uma parca biografia da sua carreira, socorremo-nos da contracapa do disco, onde se pode ler que Santinho das Neves começou a cantar e a tocar viola ainda em garoto, tendo começado a cantar em público nas suas deslocações ao estrangeiro, em Copenhaga, Malmo, Amsterdão e nas ex-colónias portuguesas. Contudo, o seu compromisso com o atletismo foi retardando a gravação do seu primeiro disco (e único que dele conhecemos), cuja produção, aliás, foi interrompida por diversas vezes devido a competições no estrangeiro.
Não deixa de ser curioso o facto de aí se escrever também que este era o primeiro disco de um português que, em Portugal era conhecido apenas como atleta mas que no estrangeiro era conhecido sobretudo como um artista. È que na verdade, em Portugal, Santinho destacou-se sobretudo no atletismo, principalmente na disciplina do Lançamento do Dardo, quand“na época de 1959, durante o Torneio Primavera, conseguiu um surpreendente lançamento de 64,03m, que era simultaneamente Recorde Nacional e Recorde Ibérico. Posteriormente melhorou várias vezes esse recorde, até o fixar em 71,38m, durante um Portugal-França disputado em Julho de 1966, uma marca que perdurou mais de 18 anos. A sua carreira teve altos e baixos, em grande parte porque se radicou em França, pelo que só vinha a Portugal na altura das competições principais, mostrando-se sempre disponível para ajudar o Sporting e destacando-se pela positiva com os 5 títulos de Campeão de Portugal do Lançamento do Dardo, obtidos entre 1962 e 1972, quatro dos quais em representação do Sporting (1962, 1967, 1971 e 1972) e um enquanto atleta individual (1965).” 

Foto e texto em itálico, da Wikipedia do Sporting, in http://www.forumscp.com/wiki/index.php?title=Santinho_das_Neves
Em termos de vida artística, desconhecemos se Santinho das Neves tenha gravado discos em França, ou se o disco que hoje apresentamos não terá passado de uma mera aventura isolada. No entanto, apesar de não se tratar de um disco surpreendente, não podemos deixar de salientar os interessantes arranjos de Jorge Machado, que dão aos quatro temas que compõem o disco um salutar equilíbrio entre a vertente orquestral e a vertente popular das canções que o compõem,  “Sapatinho” e “Arriba a leva” (de cariz popular)  e os restantes dois temas “De cabeça à roda“ e “Ver o mar”, curiosamente com música do também atleta e respeitado sportinguista Moniz Pereira, também elas num registo a lembrar o canto popular. 

Fica então um excerto destas quatro canções para os nossos leitores.


Santinho das Neves 
RCA Victor TP 596
A1) De cabeça à roda (Moniz Pereira - Fernando Correia)
A2) Sapatinho (Popular - Arranjos - Jorge Machado)
B1) Ver o mar (Moniz Pereira - Emílio Vasco)
B2) Arriba a leva (Popular - Arranjos Jorge Machado)

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